Advogada especialista em golpes é acusada de lesar clientes em mais de R$ 3 milhões

Publicado em 27/05/2025, às 09h02
A advogada e influenciadora Tábata Miqueletti - Reprodução/Instagram

F5/Folha de São Paulo

Com 139 mil seguidores no Instagram, Tábata Miqueletti ostenta uma vida luxuosa. Viagens internacionais, joias, bolsas e roupas de grife fazem parte do dia a dia da advogada, que se diz especializada em recuperar valores perdidos em golpes digitais e pirâmides financeiras. "Venha comigo e nunca mais caia em golpes na internet", diz ela nas redes.

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No entanto, pelo menos doze ex-clientes de Tábata a acusam justamente de aplicar esse tipo de golpe. O F5 conversou com sete das supostas vítimas, que afirmam ter transferido dinheiro para o fundo de investimentos Designo, orientados pela advogada.

A Designo pertence a ela e ao ex-marido, Rafael Lins, que está preso desde janeiro e é investigado por estelionato. Procurados pela reportagem, ambos negam as acusações.

CONTA NA SUÍÇA

Uma das supostas vítimas é Kátia Brito, de 56 anos, que era cliente de Tábata em um processo de divórcio. Instruída pela advogada, Kátia diz que transferiu R$ 2,7 milhões para uma conta do marido da influenciadora, Rafael.

O valor seria aplicado em um banco da Suíça para ficar supostamente protegido contra a partilha de bens. Mais tarde, Kátia diz ter descoberto que o expediente foi desnecessário.

"Essa conta era anterior ao meu casamento, não corria risco nenhum na partilha. Mas ela insistiu que eu mandasse para a Suíça e eu confiei cegamente nela. Perdi a economia da minha vida inteira", disse Kátia à reportagem. Ela relatou estar com depressão e dificuldades financeiras.

Kátia afirma que recebia mensalmente extratos falsos da suposta conta na Suíça. Em dezembro de 2024, diz que tentou movimentar a conta e descobriu a fraude.

Ela relata que, quando confrontou a advogada, veio uma nova bomba: Rafael e Tábata estavam separados. Tábata havia acusado Rafael de violência doméstica e obtido uma medida protetiva contra ele. Dias depois, Rafael descumpriu a medida e foi preso.

"Quando procurei a Tábata, ela me disse: 'Ele deu golpe em todo mundo e você foi mais uma'", afirma Kátia. O irmão dela, Ricardo Brito, diz que investiu outros R$ 300 mil com o ex-casal, valor que também nunca foi recuperado.

Na última sexta-feira (23), o Ministério Público de São Paulo pediu a quebra de sigilo bancário de Rafael Lins por suspeita de estelionato. O MP segue investigando o caso. Enquanto isso, Tábata se mudou para Brasília e está casada com outro homem, também influenciador.

DESIGNO INVESTIMENTOS

Aberta em 2023 nos nomes de Rafael e Tábata, então marido e mulher, a Designo é descrita como "uma plataforma de investimento em criptoativos". A reportagem conversou com seis pessoas que investiram na empresa e afirmam ter perdido acesso às contas da noite para o dia.

Segundo os relatos, Tábata fazia busca ativa de vítimas de golpes. Ela abordava essas vítimas via Whatsapp, oferecendo seus serviços como advogada e prometendo reaver os valores perdidos. Com o cliente captado, empurrava o investimento da Designo.

Felipe Elias, de Niterói (RJ), disse que havia acabado de perder R$ 200 mil em um esquema de pirâmide que ficou famoso em 2022. Tábata teria surgido em seu Whatsapp se oferecendo para processar a empresa. Ele conta que a contratou por R$ 20 mil.

Segundo Felipe, meses depois, ele foi coagido pela própria advogada a investir na Designo. "Coloquei R$ 1.000 de tanto que ela encheu meu saco, com o perdão da palavra. Não imaginava que a advogada que eu tinha contratado para me defender de um golpe ia me dar outro golpe", disse o ex-cliente.

Com Welton Cunha, do Rio de Janeiro, e Emanuela Miná, de João Pessoa (PB), a história foi parecida. Ambos tinham investimentos na Designo e, quando tentaram resgatar, o aplicativo estava fora do ar. Ao procurarem a advogada, eles dizem ter sido bloqueados.

Outras duas vítimas, uma do Rio Grande do Sul e outra de São Paulo, afirmam ter perdido quantias menores, de até R$ 1.500.

FAMÍLIA PERDEU R$ 28 MIL

Em 2022, Gustavo Lopes foi contratado por Tábata para o cargo de assistente administrativo no escritório dela, com sede em Telêmaco Borba (PR). Ele diz que sua função era levantar golpes e fraudes digitais e captar clientes. Uma vez que se assinavam contrato, as pessoas eram pressionadas a investir na Designo.

O próprio funcionário foi coagido a investir, segundo conta. Ele chegou a contrair um empréstimo de R$ 3 mil para colocar na empresa da chefe e convenceu seus pais a aplicarem R$ 10 mil cada um. Uma cunhada e uma amiga da família também investiram quantias menores. A perda da família totaliza quase R$ 28 mil.

Quando se deu conta do rombo nas aplicações, Gustavo diz que confrontou a chefe, mas acabou demitido e bloqueado. Ele tem ações contra ela nas esferas cível e trabalhista.

OUTRO LADO

Rafael Lins está preso há seis meses por descumprir a medida protetiva —ele citou o nome de Tábata em um vídeo nas redes sociais. O advogado de Rafael afirma que ele foi "surpreendido com o fim abrupto do relacionamento" e que nega as acusações de ameaça, violência doméstica e violência patrimonial, que deram origem à medida. Rafael ainda não constituiu defesa para a acusação de estelionato.

Tábata foi contatada por meio de sua assessoria de imprensa e pediu que as perguntas fossem enviadas por email. No entanto, quando a reportagem tentou fazer isso, o endereço fornecido se mostrou inexistente.

A reportagem insistiu com a assessoria de imprensa, que parou de retornar. O advogado de Tábata, David Garcia, afirmou "não ter conhecimento" das acusações contra ela.

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