Texto de Fabíola Perez:
“O PCC tem recrutado a mão de obra de pessoas de origem venezuelana para atuar no tráfico de drogas em Roraima e aumentar o número de membros batizados na Venezuela. Autoridades e pesquisadores consultados pelo UOL afirmam que o estado tem uma importância estratégica por fazer fronteira com a Venezuela e estar próximo da Colômbia.
O recrutamento de venezuelanos para fazer parte do PCC ocorre dentro e fora dos presídios de Roraima. O promotor de Justiça do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo, Lincoln Gakiya, afirma que o batismo de venezuelanos faz com que a facção amplie a presença também na Venezuela.
A droga que o PCC exporta para a Europa vem da Colômbia e do Peru.
‘O olhar sobre Roraima é pela proximidade da fronteira com a Colômbia sem tomar o Amazonas, cuja presença maior é da FDN (Família do Norte) e CV (Comando Vermelho)’, diz o promotor.
É dentro dos presídios que acontece uma parte dos batismos, os rituais da facção para oficializar o vínculo e tornar os membros ‘irmãos’.
‘Na medida que essas pessoas vão para a prisão, elas criam relações e são batizadas’, diz o sociólogo Rodrigo Chagas, pesquisador do Programa de Pós-Graduação Sociedade e Fronteiras da UFRR e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Mas hoje a formalização dos vínculos com a facção ocorre também nas ruas. O procurador de Justiça Criminal Márcio Sérgio Christino afirma que, na maioria dos casos, os venezuelanos chegam às prisões já envolvidos com o PCC:
‘A relação [com venezuelanos] se dá muito mais por causa do tráfico. A maior parte deles são ligadas ao PCC antes de chegar à prisão. A formalização do vínculo ocorre no sistema prisional porque ali há o domínio físico da facção.’
A localização geográfica de Roraima é dos fatores que coloca o estado como um dos mais importantes para o crime organizado.
Dados do Ministério Público de São Paulo, de novembro de 2021, mostram que Roraima é o 6º estado com maior presença da facção, com 1.601 integrantes batizados. A mão de obra venezuelana para o tráfico de drogas é mais barata do que a nacional, segundo o procurador Christino.
‘Por isso, o PCC cria uma relação de oportunidade com a região. Há interesse do PCC em manter e ampliar a presença em Roraima, mais do que em outros estados da região norte.’
Segundo Gakiya, Roraima é uma rota ‘interessante’ para o tráfico
internacional de cocaína. Apesar da hegemonia do PCC no estado, há registros de grupos venezuelanos também presentes no território.
Chagas, que pesquisa o narcogarimpo na região, afirma que há indicadores da presença de membros do grupo venezuelano Tren de Aragua em Roraima, mas não há uma disputa de poder.
‘O crime fortalece o crime’. O lema do PCC, lembra Gakiya, indica que o PCC só ‘entra em rota de colisão’ se algum líder declarar guerra contra a facção paulista. Segundo Christino, as organizações locais acabam suprimidas pelas ações do PCC.
Outras organizações se expandem até que seja conveniente para o PCC, segundo o procurador.
‘O PCC não permite que cresçam além do que seja conveniente para eles’, diz Christino. Uma das formas de controlar a influência de outros grupos é vazar informações para a polícia.
Venezuelanos batizados
Em agosto de 2020, o Ministério Público de Roraima denunciou 19 pessoas de origem venezuelana batizadas pelo PCC. As fichas de batismo foram obtidas a partir de anotações encontradas na PAMC (Penitenciária Agrícola de Monte Cristo). A operação foi a primeira a vincular o PCC a venezuelanos no estado, de acordo com o promotor de Justiça Carlos Alberto Melotto.
‘Essa denúncia foi o marco inicial. Foi feita uma apreensão de fichas de batismo, com informações sobre quem eram os padrinhos, quando foram batizados e se passaram pelo sistema prisional da Venezuela’, afirma.
Entre os denunciados, cinco foram presos por tráfico de drogas em pontos dominados pelo PCC. Segundo o documento, ao menos 13 cumpriam pena na Venezuela, cinco foram presos por homicídio e latrocínio e os demais, acusados de roubos, tráfico de drogas e furtos.
A investigação e a denúncia reuniram anotações com dados de batismo dos denunciados com nome, o vulgo, a referência (pessoa que se responsabiliza pelo batizado), data do batismo e local de origem (país, estado e município)…”