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No porão da Igreja Nossa Senhora da Glória, em Juiz de Fora (MG), funciona uma cervejaria artesanal mantida por religiosos: a Hofbauer. A pequena fábrica fica em um dos raros conventos produtores de cerveja ainda em funcionamento no Brasil, e que mantém viva uma tradição europeia de fé e fermentação.
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A história começou em 1894, quando os missionários holandeses Padre Mathias Tulkens e Padre Francisco Lohmeyer fundaram a cervejaria. A ideia era unir a devoção religiosa à tradição cervejeira europeia. No início, tudo era feito em caldeirões simples. Em 1907, chegaram máquinas importadas da Holanda que ainda estão em uso.
“Aqui, cada detalhe importa. Não é só cerveja, é história que se bebe”, diz o irmão religioso Taylor Bertoli, mestre cervejeiro e atual responsável pela produção.
🔎 Na Igreja Católica, “irmão” é o nome dado aos religiosos que não são padres. Eles vivem em comunidade e seguem votos de pobreza, castidade e obediência.
Eles podem beber? A resposta é: sim. O consumo de álcool nunca foi proibido pela Igreja. No passado, a cerveja era considerada alimento e servida nas refeições. Produzir e compartilhar a bebida também era uma forma de gratidão e sustento espiritual.
Homenagem a São Clemente Hofbauer
A cervejaria recebeu o nome Hofbauer em homenagem a São Clemente Maria Hofbauer, sacerdote austríaco do século XVIII. Antes disso, era chamada apenas de “Cerveja do convento da Glória”.
O santo ficou conhecido por renovar a vida religiosa em Viena, na Áustria. Ele defendia que os conventos fossem autossuficientes, com a produção de alimentos e bebidas para manter as obras e ajudar a população.
Canonizado em 1909, São Clemente é patrono de Viena e um dos principais nomes da Congregação do Santíssimo Redentor. “Oferecemos cervejas que encantam não somente pelo sabor, mas pela herança cultural. É motivo de orgulho manter viva essa tradição europeia artesanal”, afirma Taylor.
Produção que atravessa gerações
A produção da cerveja foi mantida por diferentes gerações de religiosos. Em alguns períodos, no entanto, precisou ser interrompida por falta de pessoas com conhecimento técnico, segundo Taylor Bertoli.
Em 2009, o padre Flávio Leonardo Santos Campos restaurou as máquinas e retomou a produção artesanal. Depois, o trabalho foi continuado pelo padre Jonas Pacheco Machado e a equipe dele.
Desde 2024, o irmão Taylor Bertoli lidera a produção da cervejaria, com apoio de uma equipe de quatro pessoas e consultoria técnica.
A Hofbauer produz cerca de 350 litros por lote, quatro vezes ao ano. Cada remessa leva cerca de 40 dias para ficar pronta, em respeito ao tempo de fermentação e maturação. São sete tipos de cerveja.
“As vendas começaram aos poucos. Nos últimos dois anos, ganhamos espaço e, neste ano, participamos pela primeira vez de festivais e concursos em Juiz de Fora”, contou Taylor.
Cada garrafa custa a partir de R$ 25. Toda a renda é destinada a projetos sociais da Igreja na cidade.
A Hofbauer oferece sete estilos de cerveja artesanal:
🍺 Pilsen: clara, levemente turva, com aroma maltado e toque cítrico.
🍺 Belgian Blond Ale: dourada e brilhante, com aroma de banana e sabor adocicado.
🍺 Belgian Pale Ale: cobre escuro, notas de caramelo e leve teor alcoólico.
🍺 Belgian Dubbel: âmbar escuro, sabor caramelizado e aroma de frutas como passas e ameixas.
🍺 Wassbier: turva, com aroma de cravo e frutas maduras, feita com maltes de cevada e trigo.
🍺 Session IPA: leve e refrescante, com aroma cítrico e final seco.
🍺 Russian Imperial Stout (RIS): escura e encorpada, com sabor intenso de maltes torrados.
De mistério a atração turística
Desde o ano passado, o público pode visitar o porão da Igreja da Glória, onde a cerveja é produzida. “Sempre foi um lugar cercado de mistério. Abrimos para mostrar a importância dessa tradição para Juiz de Fora”, afirma Taylor.
A Secretaria de Turismo de Juiz de Fora considera a Hofbauer um patrimônio cultural e turístico. A cervejaria faz parte do programa “Caminhando pela História”, que oferece passeios gratuitos por pontos históricos da cidade. A visita ao porão da Igreja da Glória é uma das mais procuradas.
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