Revista Crescer
Por pouco mais de um mês, a empresária Manuela Rosa Nicolau, 28, de Itajaí (SC), precisou dormiu com os pés da cama apoiados em tijolos. A medida, recomendada pela obstetra, fazia parte de um protocolo rígido para evitar ao máximo o parto prematuro das gêmeas univitelinas — uma gestação naturalmente mais delicada. Além da elevação da cama com os tijolos, as medidas incluíam repouso absoluto. Até as refeições eram feitas com a mãe deitada. Ir ao banheiro? Só com ajuda!
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Não foi nada fácil passar por tudo isso, mas, para Manuela a chegada de Antônia e Catarina valeu cada minuto de esforço. Em um relato emocionante e exclusivo para a CRESCER, ela relembra os desafios da gestação gemelar.
Dose dupla
A primeira gravidez de Manuela foi planejada. Quando aconteceu, foi motivo de muita comemoração! Ela e o marido já sabiam que havia gêmeos na família, mas, mesmo assim, foram surpreendidos ao descobrir que esperavam dois bebês, porque, no caso dela, era uma gestação univitelina, ou seja, sem origem genética. Podia acontecer com qualquer pessoa. “Na hora me deu uma crise de riso”, lembra a mãe.
O resultado do exame laboratorial já havia levantado suspeitas, porque acusou um nível do hormônio Beta HCG muito maior do que o esperado. Logo, a notícia de que eram mesmo dois bebês foi confirmada pela obstetra e compartilhada com toda a família por chamadas de vídeo. A felicidade era geral!
Sinal de alerta
A gestação seguia bem até que Manuela teve uma crise de pedra no rim, o que nunca havia acontecido antes. Ela precisou ficar uma semana em repouso, mas, felizmente, conseguiu expelir.
Na semana seguinte, foi à consulta de rotina com a obstetra, que fez um ultrassom transvaginal. Ali, apareceu um sinal de alerta: foi identificado um encurtamento do colo de útero, um sinal de risco para parto prematuro. Manuela estava com 28 semanas e a médica recomendou um repouso leve. Por precaução, ela parou de trabalhar, tomou corticoide para amadurecer os pulmões das bebês e ficou em casa.
Mesmo assim, o cenário se agravou. “Com 31 semanas, o colo abriu e eu já estava com 2 cm de dilatação. Nesse momento, veio a orientação para repouso absoluto”, lembra a mãe, que seguiu a recomendação ao pé da letra. Afinal, não queria correr riscos. Manuela não ia nem ao banheiro sozinha. As refeições, ela fazia enquanto estava deitada na cama. Foi neste momento também que entrou a tática dos tijolos.
A cama precisava ficar inclinada, para que a gravidade fizesse com que as meninas se “afastassem” do colo, em vez de pressioná-lo com o peso. Por isso, os tijolos foram colocados nos pés da cama, na parte da frente.
“Das 24 horas do dia, eu ficava, em média, só uma hora em pé, somando os minutos do banho e as vezes que tinha de ir ao banheiro para fazer minhas necessidades”, conta Manuela. “Foi bem difícil, pois sempre tive refluxo. Ficar com as pernas para cima o tempo todo e até dormir assim fazia com que a comida ficasse voltando. O sono era bem difícil, mesmo para o meu marido, que estava dormindo comigo, mas pensávamos que logo tudo iria passar. Era só uma fase e sabíamos que era por algo maior. Cada dia era uma vitória!”, afirma.
O medo maior era não alcançar as 34 semanas, marco importante para a maturidade pulmonar e redução do risco de internação neonatal. “Eu estava muito confiante”, relata Manuela, que marcou até um evento de despedida da barriga, com pizza e tudo, quando estava com 36 semanas e 1 dia.
E foi a despedida mesmo. As meninas nasceram dois dias depois, em uma segunda-feira, dia 8 de setembro. A cesárea estava agendada para sexta-feira, 12 de setembro. Mas no dia 8, a mãe tinha consulta com a obstetra. “Quando a médica fez o exame de toque, viu que eu estava com 5 cm de dilatação. Eu não estava com dor, só sentia uma pressão na pelve”, lembra. “Ela falou que se a bolsa não rompesse naquele dia, aconteceria no máximo na madrugada e teria grandes chances de as meninas nascerem em casa. Para evitar, com a nossa autorização, ela fez o descolamento da membrana e combinamos de ir para o hospital às 19h, naquele mesmo dia”, acrescenta.
Parto a jato
O parto foi normal e aconteceu de forma rápida. Antônia, a primeira bebê, nasceu às 23h21, e Catarina veio em seguida, às 23h34. As duas nasceram bem, embora a caçula tenha precisado de ajuda para respirar. “Nasceu ‘dormindo’”, diz a mãe. Felizmente, nenhuma delas precisou de UTI. “Ficaram com a gente o tempo todo no quarto!”, comemora. Antônia nasceu com 3 kg e Catarina com 2.370 g.
No pós-parto, porém, Manuela enfrentou um susto: uma hemorragia causada por hipotonia uterina. “Perdi muito sangue e a equipe tinha de fazer uma manobra, que era como uma massagem, que doía muito. Foi mais dolorido que o parto em si”, relata. Fraca, a mãe demorou cerca de dez dias para se recuperar totalmente e só conseguiu se sentir melhor depois de receber ferro na veia.
Hoje, com 2 meses e 23 dias de vida, as meninas se desenvolvem bem, embora ambas tenham sido diagnosticadas com APLV (alergia à proteína do leite de vaca) — condição que a própria mãe teve na infância. Manuela fala da experiência com gratidão e alívio, orgulhosa de ter vencido cada etapa. “Eu sabia que, logo, tudo ia passar, que era só uma fase”, lembra.
E passou! Agora, a casa da família é animada, com o som de duas bebês que chegaram ao mundo depois de uma longa espera — e muitos tijolos segurando esse sonho no lugar.
Funciona mesmo?
O pediatra e neonatologista Nelson Douglas Ejzenbaum, membro da Academia Americana de Pediatria explica que elevar as pernas da gestante é uma das maneiras de diminuir a pressão no útero. Então, sim, ajuda a prevenir o parto prematuro. No entanto, ele esclarece que, em casos de risco, essa não deve ser a única técnica utilizada.
"Existem outras técnicas para inibir o parto prematuro além do posicionamento, como medicações para diminuir ou impedir que as contrações ocorram, medicações para melhorar a maturação do bebê e para inibir o trabalho de parto. Essas medidas costumam ser muito mais efetivas. Juntamente com o repouso, para diminuir a movimentação e, assim, a possibilidade de parto", afirma.
Assista ao vídeo abaixo:
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