Redação
O presidente da França, François Hollande, anunciou na noite desta quinta-feira que não será candidato à reeleição pelo Partido Socialista (PS) nas eleições presidenciais de abril e maio de 2017. Pressionado por uma impopularidade recorde e por medidas econômicas impopulares que tardam a produzir efeitos positivos, o chefe de Estado afirmou em um discurso emocionado que renuncia a sua candidatura em nome "do interesse superior da nação".
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Em meio a uma guerra fratricida na maior legenda de esquerda do país, o socialista se torna o primeiro presidente a não se apresentar à reeleição desde 1958.
A retirada de Hollande encerra um ciclo político na história da França, 15 dias depois do fim melancólico da carreira de seu arquirrival político, o conservador Nicolas Sarkozy, que perdeu as prévias do partido Republicanos (direita) para seu ex-primeiro-ministro, François Fillon. Ex-líder do PS, Hollande chegou à presidência em maio de 2012, com 51% dos votos.
Seu capital político se esfacelou nos primeiros meses de governo, com uma alta de impostos e medidas de austeridade fiscal que contrariaram a ala mais à esquerda do Partido Socialista. Dividida em termos ideológicos entre uma fatia majoritária de linha social-liberal, e outra, minoritária, de esquerda radical, a legenda rachou, levando o governo a ter dificuldades na relação com o Parlamento.
Herdeiro dos efeitos da crise econômica de 2007, que atingiu em cheio a União Europeia e a zona do euro, Hollande assumiu um país com dívida pública na casa de 90%, déficit fiscal fora dos parâmetros do Tratado de Maastricht – superior a 3% do PIB – e desemprego em alta.
Durante dois anos, seu então primeiro-ministro, Jean-Marc Ayrault, tentou controlar os gastos públicos com uma carga de impostos elevada. A receita causou impopularidade imediata na classe média, e Ayrault acabou demitido. Seu substituto, Manuel Valls, tornou-se um dos nomes emergentes do partido, que deve confirmar sua pré-candidatura ao Palácio do Eliseu nas próximas horas.
A partir janeiro de 2015, Hollande enfrentou ainda a crise securitária causada pelos ataques terroristas cometidos em nome do grupo jihadista Estado Islâmico. Para combatê-la, o presidente decretou o mais longo período de estado de emergência da história do país – ainda em vigor – e a tomou a iniciativa de propor o confisco de nacionalidade de binacionais condenados por terrorismo, uma medida que acabou por implodir o que restava da unidade do PS.
Nesta quinta-feira, em 10 minutos de pronunciamento em rede nacional, Hollande defendeu as reformas realizadas no seu governo, entre os quais a flexibilização do mercado de trabalho, mas reconheceu a demora na retomada do crescimento econômico e na redução do desemprego – na casa de 9,8%. "Eu carrego um balanço do qual assumo todas as responsabilidades", disse o chefe de Estado.
Hollande reconheceu então ser incapaz de "resolver a dispersão da esquerda e sua fragmentação". "Eu fui animado pelo interesse superior do meu país. Nos últimos quatro anos e meio, eu o servi com honestidade", disse, preparando sua declaração oficial: "Eu decidi não ser candidato à eleição presidencial".
A renúncia de Hollande à reeleição também representa um forte movimento de renovação na vida política da França, e não só entre socialistas e republicanos. Além dele e de Sarkozy, o ex-primeiro-ministro Alain Juppé foi excluído nas primárias da direita, enquanto o líder centrista François Bayrou hesita em seu candidatar.
Da eleição de 2012, apenas dois candidatos de partidos expressivos devem se reapresentar: os populistas de direita Marine Le Pen, da Frente Nacional, e de esquerda, Jean-Luc Mélenchon, do movimento França Insubmissa.
Além de François Fillon do lado republicano, o ex-ministro da Economia Emmanuel Macron, do movimento social-liberal En Marche, já anunciou sua candidatura. Já as prévias do Partido Socialista ocorrerão entre 22 e 29 de janeiro de 2017.
Fillon afirmou nesta quinta-feira que a desistência do presidente de concorrer à reeleição mostra que ele é "lúcido em seu fracasso".
"O presidente admite, com lucidez, que seu fracasso patente lhe impede de seguir adiante", escreveu Fillon em sua conta no Twitter.
Posteriormente, o conservador emitiu um comunicado no qual afirmou que o mandato de Hollande acaba "com a revolta política e a decadência do poder".
"Mais do que nunca, a mudança política e a recuperação da França vão ser construídas sobre bases sólidas: a verdade, sem a qual não se pode ter a confiança dos franceses, e a ação valente, a única que pode obter resultados", acrescentou Fillon, que desponta como favorito das pesquisas para vencer as eleições presidenciais.
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