Revista Marie Claire
A cena é quase sempre a mesma: dor súbita, falta de ar, palpitações. No pronto-socorro, o diagnóstico inicial sugere infarto. Mas nem sempre o coração está com as artérias obstruídas. Em alguns casos, trata-se da síndrome do coração partido, também conhecida como cardiomiopatia de takotsubo, uma disfunção cardíaca temporária que afeta sobretudo mulheres depois da menopausa.
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Descrita pela primeira vez no Japão em 1990, a síndrome recebeu o nome de takotsubo porque o coração adquire, nos exames de imagem, o formato semelhante ao de uma armadilha usada para capturar polvos — a palavra japonesa descreve esse objeto. Segundo um estudo publicado no Journal of the American College of Cardiology, 88% dos casos acometem mulheres, com idade média de 69 anos.
“Ela acontece primordialmente depois da menopausa e pode se repetir mais de uma vez ao longo da vida”, explica Gláucia Maria Moraes de Oliveira, presidente do Departamento de Cardiologia da Mulher da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “A síndrome é disparada por estresse físico ou emocional, como a morte de alguém, uma perda amorosa, uma cirurgia, um assalto ou um AVC, por exemplo.”
Sintomas que confundem com infarto
As manifestações clínicas são quase idênticas às do infarto, o que dificulta o diagnóstico. “A mulher pode ter dor súbita no peito, mas também dor nas costas, no braço ou na mandíbula. Pode sentir fadiga intensa, falta de ar, palpitações e até desmaios”, detalha Oliveira. “Nos exames, aparecem alterações no eletrocardiograma e nas enzimas cardíacas, como a troponina, que simulam o infarto.”
Em muitos casos, só a angiografia coronariana, seja invasiva ou por tomografia, permite confirmar se há obstrução das artérias ou se é síndrome de takotsubo. O formato do coração com a ponta abaulada sugere o quadro.
Na maioria das vezes, o órgão volta a funcionar normalmente após algumas semanas ou meses. Mas isso não significa que seja uma condição inofensiva.
“Embora a síndrome regrida na maioria das vezes, ela pode evoluir para choque cardiogênico, uma falência cardiovascular grave, e levar à morte”, alerta a cardiologista. A recuperação pode levar de quatro a oito semanas, mas em alguns casos se estende por até um ano, podendo deixar sequelas como insuficiência cardíaca.
O papel do estresse e da menopausa
As pesquisas ainda não explicaram totalmente por que as mulheres são as principais vítimas, mas a queda de estrogênio após a menopausa pode ter algum papel. O hormônio tem efeito protetor sobre o sistema cardiovascular, e sua redução pode tornar o coração mais vulnerável.
Para Oliveira, no entanto, essa não é a única explicação. O quadro é multifatorial e está associado a fatores como a sobrecarga culturamente imposta às mulheres. “É uma cardiopatia catecolaminérgica, ligada à liberação maciça de hormônios do estresse. O estrogênio não é a causa direta, mas cria um ambiente propício, especialmente em mulheres que já têm ansiedade ou depressão”, explica.
Quando procurar ajuda
A mensagem principal, segundo a cardiologista da SBC, é não ignorar os sinais. “Toda mulher que sentir dor no peito, fadiga ou falta de ar deve procurar imediatamente o pronto-socorro. Pode ser infarto, pode ser takotsubo. Em todo caso, o diagnóstico rápido é fundamental”, alerta.
Além da síndrome do coração partido, Oliveira lembra que mulheres podem sofrer de outras condições cardíacas sem obstrução das artérias, como a doença microvascular. “Elas também provocam infarto e disfunção cardíaca. Por isso, não dá para esperar. Procure atendimento sempre que sentir algo diferente do habitual”, recomenda.
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