Opinião: “Arcabouço é crucial para Lula, mas depende de milagre no aumento da receita”

Publicado em 22/04/2023, às 14h39

Redação

Texto de José Paulo Kupfer, no portal UOL:

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“O arcabouço fiscal, divulgado na terça-feira (18), não é a bala de prata capaz de impulsionar uma nova etapa de crescimento consistente e sustentável da economia brasileira. A bala de prata consiste no eventual êxito da negociação do arcabouço fiscal com o Congresso. Essa negociação é crucial para o governo Lula.

Não há outro caminho para tentar reverter as tendências de retração ou de baixo crescimento da economia além da abertura de espaços para aumentar os gastos públicos, empurrando a atividade econômica. Mas não há como abrir esse espaço, mantendo sob controle a dívida pública, sem expandir as receitas públicas.
O volume de isenções fiscais e privilégios, ainda mais quando somado às manobras fraudulentas para driblar a tributação, é imenso, podendo chegar a mais de um quarto do que é efetivamente arrecadado. Por isso, expandir a arrecadação, sem aumentar a carga de quem já paga muito imposto é, em teoria, uma estratégia acertada e viável. O problema é que, para ser efetiva, precisa do apoio do Congresso.
Com um Congresso conservador e coalhado de representantes de grupos de interesse, em que o governo está longe de contar com maioria permanente, pode-se prever uma guerra legislativa para fazer a âncora fiscal desenhada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ser efetiva. Nem tanto para aprovar seus parâmetros, mas, certamente, para a necessária ampliação da arrecadação exigida pela engenharia fiscal proposta.
O esforço para expandir a arrecadação terá de ser grande — alguns, mais céticos, acham que nem um milagre permitirá alcançar os parâmetros necessários. Só para 2024, estima-se que as receitas terão de aumentar entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões, para que o ajuste pretendido seja efetivado.
O economista Sergio Gobetti, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), referência brasileira em questões fiscais, imagina que é possível, ainda que difícil. Gobetti calcula que a soma do crescimento da economia e do tamanho do ajuste pelo lado de receita pública terá de alcançar pelo menos uma expansão de 4% a cada ano, para manter a dívida no nível atual de 76% do PIB até 2026…
O grosso do ajuste exigido pela nova âncora fiscal, sem esmagar as despesas públicas, principalmente as sociais e os investimentos públicos, contudo, teria de vir de aumentos na arrecadação. O foco, resumindo, terá de ser o ataque aos privilégios contidos no conjunto dos chamados gastos tributários e aos vazamentos, por fraude ou outras manobras, no recolhimento de tributos.
No conjunto, as isenções e os subsídios a setores e grupos de interesse chegam, chegariam, em 2024, a R$ 486 bilhões, de acordo com as estimativas da Receita Federal, contidas no PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias), enviado pelo Executivo ao Congresso . Mexer nesse verdadeiro vespeiro, do qual não se deve excluir a reforma tributária, será a prova de fogo do arcabouço fiscal. Os gastos tributários, no ano que vem, representam mais de 4% do PIB e quase 20% do total previsto para a arrecadação de tributos…”
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