Jornalista Thaís Oyama:
“Como força econômica, o poder do agronegócio, responsável por quase um quarto do PIB brasileiro, é notório. Como força eleitoral, o setor representa, por baixo, 15 milhões de votos.
O número é a soma dos eleitores que foram às urnas nas últimas eleições presidenciais e que, segundo a agência de pesquisa Quaest, têm alguma relação com o agronegócio ou declararam ter uma ‘identidade com o campo’. Foi para esse segmento que o presidente Lula deu uma banana no fim de semana passado.
Ao se fazer ausente na Agrishow, tida como uma das maiores feiras de tecnologia agrícola do mundo, e deixar o território livre para Jair Bolsonaro fazer a festa, o governo petista reafirmou sua opção pela divisão: há o Brasil que está ‘com ele’ e o que está ‘contra ele’ — o agronegócio, que votou majoritariamente em Bolsonaro, encontra-se, claro, na segunda categoria.
‘Não me preocupo quando dizem que o agro não gosta do Lula. Não quero que gostem, mas que me respeitem’, disse o presidente, ainda na campanha, quando também afirmou que que, embora haja ‘empresários sérios’, parte do agronegócio é ‘fascista e direitista’. E já fora do palanque, no dia 8 de janeiro, com os destroços do ataque bolsonarista ainda fumegantes, soltou, sem que ninguém lhe perguntasse, que ‘possivelmente também estava lá’ (nos ataques) o ‘agronegócio maldoso’, que ‘usa agrotóxicos, sem nenhum respeito para a saúde humana’.
As falas de Lula não são fruto apenas do ressentimento que ele jura não guardar daqueles que não lhe devotam o justo reconhecimento e nunca o
olharam com boa vontade. Como estratégia eleitoral, o comportamento do presidente é defendido, inclusive, por especialistas em marketing político.
Felipe Nunes, da Quaest, por exemplo, considera que a polarização ideológica no Brasil atingiu um grau tal que é inútil o governo Lula tentar atrair o eleitorado que votou em Bolsonaro em 2022 (e que melhor fará ele se focar nos eleitores sem convicções políticas, como os mais de 20% dos brasileiros que não foram às urnas).
Lula, ao direcionar as falas para a sua base e desdenhar do eleitorado afinado com o adversário, sinaliza compartilhar da tese da polarização inevitável.
E se ela é uma realidade do ponto de vista eleitoral, prenuncia turbulências num horizonte próximo — será na base do ‘nós contra eles’ que as principais questões do país, como a anunciada reforma agrária, tenderão a ser tratadas.”