Crianças separadas dos pais nos EUA guardam trauma de estada em abrigos

Publicado em 21/07/2018, às 09h09

Por Redação

Depois de quase dois meses em um abrigo nos EUA, o brasileiro Davi (nome fictício), 5, inventou uma brincadeira: chama um amigo, empurra-o contra a parede e coloca suas mãos para cima, como um policial.
"Ele pediu uma arma de brinquedo para a mãe", conta a assistente jurídica Luana Mazon, do escritório de advocacia Jeff Goldman, que assessora a família. Desde que foi reunido à mãe, na semana passada, ele quase não conversa, não come e quis voltar a mamar, no peito. "Está completamente traumatizado."

O relato é um entre vários que advogados e famílias têm ouvido desde que dezenas de crianças imigrantes reencontraram os pais, após serem separadas por agentes ao cruzar a fronteira ilegalmente.

Mudanças de comportamento, como a recusa a seguir regras, a apatia ou a completa ausência de demonstrações de carinho, também foram relatadas.

A Academia Americana de Pediatria, que se opôs à tolerância zero, já alertou que a prática pode causar traumas irreparáveis às crianças.

"A verdade é que o problema não acaba aí [na reunificação das famílias]: está só começando", comenta Liliane Costa, diretora-executiva do Brace (Brazilian-American Center), que atende imigrantes nos arredores de Boston.

A região reúne uma das maiores comunidades brasileiras nos EUA. É para lá que foram algumas das famílias reunidas nas últimas semanas.

Uma delas é a da mineira Sirley Silveira, que voltou a ver o filho de dez anos no início de julho, depois de 42 dias. "A mãe disse que ele está muito estranho: está agressivo, não tem paciência, não quer obedecer, fica perguntando a toda hora o que vai fazer", conta Mazon, que também assessora a família.
Ao mesmo tempo, o menino não quer distância da mãe. Fica com medo de vê-la sair de vista. E não gosta de lembrar o que aconteceu no abrigo onde ficou, em Chicago.

Apesar de as condições materiais do lugar serem boas, segundo o relato de equipes que visitaram as crianças brasileiras, a rotina era espartana. Havia hora para levantar, para dormir e tarefas como limpar o quarto e o banheiro.

Para os brasileiros, a socialização era mais difícil, já que a maioria dos residentes falava espanhol. Irmãos foram separados em quartos diferentes. O contato com os pais se limitava a dez minutos por semana, por telefone. E, em alguns abrigos, contatos físicos com outras crianças, incluindo abraços, eram proibidos. Mesmo diante de choro.

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