Comportamento

Experiências traumáticas na infância podem alterar estrutura do cérebro

Alterações na parte do cérebro responsável por regular as emoções podem aumentar os riscos de depressão grave e dificultar o tratamento do transtorno

VEJA.com | 22/03/19 - 22h34
Abusos físicos, emocionais e sexuais de uma criança precisam ser tratados tão logo sejam descobertos | Pixabay

Passar por experiências traumáticas na infância pode alterar a estrutura do cérebro e aumentar o risco de desenvolver depressão grave na vida adulta, afirma estudo publicado recentemente no The Lancet Psychiatry. Segundo os pesquisadores, crianças que sofrem abusos físicos e/ou emocionais na primeira fase da vida podem apresentar um córtex insular menor. A ínsula, como também é conhecida essa parte do cérebro, é responsável por regular as emoções.

“Os resultados apontam que traumas de infância levam a alterações na estrutura cerebral e isso gera recorrência da depressão e piores resultados [de tratamento]”, comentou Nils Opel, principal autor do estudo, ao New Scientist. Para a equipe, essa descoberta pode ajudar a definir novas formas de tratamento para este grupo de pacientes. 

O estudo
Os cientistas da Universidade de Münster, na Alemanha, chegaram a esta conclusão depois de analisar o cérebro de 110 pacientes que foram internados e passavam por tratamento hospitalar devido ao diagnóstico de depressão. Os participantes – com idades entre 18 e 60 anos – responderam a um questionário detalhado sobre a vivência de traumas na infância. Eles também foram submetidos a ressonância magnética para investigar alterações na estrutura cerebral. A equipe ainda verificou o histórico de abuso físico e/ou emocional, negligência física e/ou emocional e violência sexual durante a infância.

Ao longo de dois anos de acompanhamento, os pesquisadores notaram que 75 pacientes tiveram uma recaída, apesar do tratamento constante. Eles perceberam também que traumas na infância e relapso depressivo estão associados à redução na área superficial do córtex. Isso levou à conclusão de que indivíduos com histórico de abuso na infância que apresentam um córtex insular menor estão mais propensos a uma recaída.

“Os resultados sugerem que pessoas com depressão que sofreram abuso quando crianças podem precisar de tratamento especializado”, explicou. Por causa disso, ele sugere que pesquisas psiquiátricas futuras devem explorar essas descobertas e verificar como elas podem ser traduzidas em melhores cuidados e tratamentos para favorecer os resultados dos pacientes a terapia. 

Depressão
A depressão é um transtorno psiquiátrico que pode ser desencadeado por diversos fatores, como carga genética e ambiente onde o indivíduo está inserido. No entanto, os especialistas ainda não chegaram a um consenso sobre qual deles é predominante. No Brasil, estima-se que sejam diagnosticados aproximadamente 2 milhões de casos por ano e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo menos 30% da população mundial vai enfrentar algum episódio de depressão ao longo da vida.

Apesar de a doença ser comumente identificada durante a vida adulta, pesquisas indicam que cerca de 50% dos pacientes nessa faixa etária apontaram a aparição dos sintomas antes dos 18 anos.

Tratamento
Para casos leves, o tratamento para a depressão é psicoterapia – que muitas vezes incluem as famílias. Em casos moderados e graves, medicação associada à psicoterapia. O que define a gravidade da doença é a intensidade dos sintomas, o grau de prejuízo na vida do paciente e a presença de pensamentos ou tentativas suicidas. “A avaliação por psiquiatras pode ajudar muito a definir qual a melhor conduta em cada caso. E, é claro, a identificação precoce dos sintomas e o adequado encaminhamento para atendimento por um profissional especializado”, disse Arthur Danila, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, à BBC.

É importante ressaltar que abusos físicos, emocionais e sexuais de uma criança precisam ser tratados tão logo sejam descobertos. Além disso, adultos que passaram por experiências traumáticas na infância devem procurar ajuda de um profissional de saúde mental para tratar as consequências do problema, que podem refletir na vida adulta, prejudicando relacionamentos e a carreira profissional, além de aumentar riscos de saúde.