Forca do século 16 usada para execuções é descoberta durante escavações

Publicado em 15/12/2025, às 21h51
Foto: Anne-Gaëlle Corbara/Inrap
Foto: Anne-Gaëlle Corbara/Inrap

Por Revista Galileu

Uma escavação em Grenoble revelou os restos de uma forca do século 16, utilizada para a execução de condenados, destacando práticas de repressão durante as guerras religiosas na França. A descoberta, feita pelo Instituto Nacional de Pesquisa Arqueológica Preventiva, oferece um importante testemunho histórico sobre a justiça da época.

Os arqueólogos encontraram vestígios de sepultamentos desordenados, com pelo menos 32 ossadas, que indicam um tratamento degradante dos executados, sem rituais funerários. A análise de documentos históricos permitiu identificar a estrutura como o 'gibet do Port de la Roche', construído entre 1544 e 1547.

As execuções ocorriam em espaço urbano, e os corpos eram expostos na forca, refletindo a repressão religiosa da época. A pesquisa sugere que o sepultamento infamante prolongava a punição, simbolizando a 'má morte' e evidenciando a intensidade da repressão à Reforma até o início do século 17.

Resumo gerado por IA

Uma escavação arqueológica realizada na entrada norte de Grenoble, no sudeste da França, trouxe à tona os vestígios de uma antiga forca do século 16, utilizada para a exposição e a execução de condenados à morte. A descoberta, anunciada na sexta-feira (12) em comunicado pelo Instituto Nacional de Pesquisa Arqueológica Preventiva da França (Inrap), oferece um testemunho material das práticas de repressão em vigor no período das guerras religiosas no país.


O achado ocorreu na região de Esplanade, às margens dos rios Isère e Drac. Até o início do século 17, o local era essencialmente pantanoso, sujeito a inundações frequentes. Ao longo do tempo, porém, o espaço foi sendo progressivamente drenado e ocupado, assumindo funções diversas: zona de extração de areia e madeira, local de jogos aristocráticos, área de exercícios e acampamento militar, espaço de festas republicanas e, mais recentemente, parque de diversões.

De acordo com o Inrap, a alternância de depósitos aluviais e aterros identificada na escavação permite reconstituir esse lento processo de ocupação e adaptação de um terreno instável. Foi nesse contexto que os arqueólogos identificaram, no limite da área escavada, uma estrutura quadrangular em alvenaria até então sem paralelos claros na historiografia local.


No interior e nas imediações do muro norte do edifício, foram encontradas dez fossas contendo múltiplos sepultamentos, algumas datadas do século 16. No total, os pesquisadores contabilizaram pelo menos 32 ossadas, que representam sobretudo homens, dispostos de forma desordenada, em contato direto, sem orientação dominante e sem qualquer indício de ritual funerário. Isso sugere uma falta de trato pós-morte com os executados ali.

Gibet do Port de la Roche

Diante desse conjunto incomum, diversas hipóteses foram inicialmente consideradas a respeito da natureza e da função do espaço. Dentre as possibilidades pensadas, estavam um abrigo para eremitas, uma capela religiosa ou mesmo uma vala comum de soldados.

No entanto, a identificação definitiva só foi possível após o cruzamento dos dados arqueológicos com arquivos históricos. De acordo com o Inrap, o estudo de registros contábeis de obras, associados a um projeto de carpintaria cujas dimensões coincidiam exatamente com as fundações escavadas, permitiu reconhecer a estrutura como a antiga forca de Grenoble, conhecido como o "gibet do Port de la Roche".


Os documentos revelam que a forca foi construída entre 1544 e 1547. Sobre uma base quadrada de 8,2 metros de lado, erguiam-se oito pilares de pedra, coroados por capitéis que sustentavam uma complexa estrutura de madeira instalada a cerca de cinco metros de altura.

Esse edifício foi implantado sobre uma leve elevação da planície aluvial, como forma de protegê-lo das cheias. Ele contava ainda com um fosso de drenagem no lado oriental, que também pode ter servido para delimitar simbolicamente o espaço da justiça.


A presença de oito pilares confere à forca um caráter singular. Conforme explica o Inrap, o número de colunas estava diretamente relacionado à hierarquia judicial no Antigo Regime: justiças senhoriais dispunham de dois a seis pilares, enquanto o célebre gibet real de Montfaucon, em Paris, contava com até 16. O monumento de Grenoble, portanto, refletia a importância da jurisdição local.

Morte infamante e repressão religiosa

As execuções propriamente ditas ocorriam em espaço urbano, na Place aux Herbes, no centro de Grenoble. Os corpos dos condenados eram posteriormente expostos na forca, fora dos muros da cidade.

Arquivos judiciais citados pelo Inrap permitem identificar alguns desses indivíduos, em um período em que a pena de morte era relativamente rara. Entre os executados estavam sobretudo rebeldes à autoridade real, em especial protestantes, como Benoît Croyet, acusado em 1573 de participar de um ataque contra Grenoble, e Charles Du Puy Montbrun, líder decapitado e exibido no local em 1575.


Nem todos os corpos expostos eram enterrados ali, mas os que estão no local sofreram um tratamento degradante. As escavações revelam que os indivíduos foram privados de sepultura cristã e lançados em fossas simples, às vezes em pedaços, superpostos ou remanejados, sem qualquer cuidado funerário.

Em uma grande fossa central, por exemplo, depósitos sucessivos de corpos inteiros antecederam a deposição de restos ósseos desconectados. Em outros pontos, vários condenados parecem ter sido retirados da forca e enterrados simultaneamente.


Para os pesquisadores do Inrap, esse sepultamento infamante prolongava simbolicamente a punição para além da morte, inscrevendo no corpo e no espaço a noção de “má morte”. Vale lembrar que o gibet do Port de la Roche foi erguido em um momento de intensificação da repressão à Reforma e pode ter permanecido em uso até o início do século 17, quando políticas de pacificação ganharam força.

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