Uma veterinária em Itanhaém (SP) reverteu a perda de visão de um Shih Tzu utilizando uma lente de contato humana, uma prática que, embora inusitada para leigos, é comum na oftalmologia veterinária devido à adaptação de técnicas humanas.
O cão apresentava uma lesão grave causada por cílios ectópicos, e a opção pela lente foi motivada pela inviabilidade financeira do tratamento cirúrgico, que poderia comprometer ainda mais a visão do animal.
Após o uso da lente, o cão recuperou os reflexos rapidamente e passou por um tratamento com colírio, evidenciando a eficácia da técnica, que representa uma abordagem ética e adaptativa em um contexto de limitações financeiras na medicina veterinária.
Uma veterinária especialista em oftalmologia conseguiu reverter a perda da visão de um cão da raça Shih Tzu ao colocar uma lente de contato humana no olho do animal. Lais Belli, moradora de Itanhaém (SP), contou ao Terra que, apesar de poder parecer estranho para leigos, o procedimento não é tão incomum em sua rotina profissional e que técnicas e materiais usados em humanos também são frequentemente utilizados na oftalmologia veterinária.
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O cachorro foi levado pelo tutor ao hospital sem enxergar devido a uma lesão grave no olho, causada por um cílio ectópico --pelos que crescem anormalmente através da conjuntiva (a parte rosa do olho) e entram em contato com a superfície do olho (córnea).
A veterinária optou pelo uso de uma lente de contato humana porque o procedimento cirúrgico, apesar de mais indicado, era inviável financeiramente para o tutor.
"Essa lesão estava extremamente extensa. Então, qualquer manipulação desse paciente gera um risco. Até o fato do animal piscar gera um risco desse olho perder 100% de chance. Alguma coisa que eu precisava fazer, porque se eu não tenho recursos cirúrgicos para agir, eu vou ter que dar algum conforto para tentar garantir, pelo menos, o conforto desse paciente", relatou.
O resultado foi bastante positivo. O cão voltou a ter reflexos logo após alguns dias de uso da lente. Na sequência, passou por um tratamento com o uso de colírio, o que fez com que a cicatrização ocorresse de forma ágil e sem sequelas. A lente funcionou como uma espécie de curativo que protegeu o olho da própria pálpebra, já que o movimento de piscar poderia comprometer o processo de cicatrização.
"A maior dificuldade técnica, muitas vezes, é quando a gente tem um paciente com um olhinho muito pequeno. E a lente de contato humana é um pouquinho maior. Porém, esse paciente em específico tem um olho grande", explica.
Ao contrário do que se pode pensar, o uso de lentes de contato humanas em animais não é tão incomum. A profissional diz que aplica "lente de contato com uma frequência absurda, porque a lente de contato traz conforto imediato para o paciente e também reduz alguns atritos".
Segundo Belli, a oftalmologia veterinária depende fortemente de adaptações de materiais e técnicas da medicina humana, tanto por limitações financeiras dos tutores quanto pela escassez de equipamentos específicos no Brasil --cerca de 95% dos instrumentos, medicamentos e procedimentos utilizados são originalmente humanos, adaptados conforme a espécie e as condições clínicas de cada animal. Essa prática é comum e aceita, desde que o profissional tenha embasamento técnico e ético para garantir a segurança do paciente.
"Algumas espécies não respondem bem a algumas medicações. Nós temos, sim, uma lente de contato de uso veterinário. Essa lente de contato é mais fácil, porque tem uns pontinhos que a gente consegue olhar para o paciente e ver que a lente ainda está lá, já que ela não é 100% transparente como a lente humana", explicou.
Laís afirma que o caso representa um marco pessoal e ético em sua trajetória profissional, mostrando que nem sempre o melhor tratamento é o mais caro ou o mais complexo.
"Eu tenho uma visão de que nem todo mundo pode fazer tudo que a medicina pede. A gente precisa aprender a trabalhar, lidar com os recursos que a gente tem disponíveis. Não falo que a gente precisa ser criativo, acho que a gente precisa ser ético, profissional, e deixar muito bem claro para o tutor tudo que a gente pode fazer que seja mais seguro pro paciente. Mas na nossa sociedade nem todo mundo tem a possibilidade de estar investindo R$ 6 mil num procedimento cirúrgico, de uma forma emergencial, e o olho não espera", completa a especialista.
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