Mania fofa leva mãe ao diagnóstico de autismo da filha: 'Não fazíamos ideia'

Publicado em 04/12/2025, às 19h20
Foto: Reprodução/Redes Sociais
Foto: Reprodução/Redes Sociais

Por Revista Crescer

A mãe de Iara, uma menina de 4 anos diagnosticada com autismo, percebeu sinais de desenvolvimento atípico desde os 6 meses, como o gesto repetitivo de 'biquinho', que inicialmente foi interpretado como uma imitação, mas que se revelou uma estereotipia.

Após a avó, enfermeira, sugerir que Iara poderia ter autismo, a família buscou uma nova pediatra que aplicou a escala M-CHAT, resultando em um encaminhamento para uma avaliação mais completa, onde foram observados comportamentos que confirmaram o diagnóstico.

Com a confirmação do autismo, a rotina da família mudou drasticamente, com a indicação de mais de 25 horas semanais de terapias, levando a progressos significativos na comunicação e socialização da criança, embora ainda necessite de supervisão constante.

Resumo gerado por IA

Nathalia Costa Rodrigues, 26, de São Carlos (SP), jamais imaginou que um gesto específico que sua filha fazia com frequência era, na verdade, uma pista que anteciparia um diagnóstico de autismo. Atualmente com 4 anos, Iara começou a fazer 'biquinho' com apenas 6 meses e, segundo sua mãe, foi o primeiro sinal que chamou atenção da família para algo diferente em seu desenvolvimento.

No início, Nathalia acreditava que a pequena estava apenas imitando os adultos mandando beijo. Porém, o gesto foi ficando cada vez frequente, se tornando algo muito característico dela. “Achamos que era uma mania. Não fazíamos ideia de que poderia ser uma estereotipia.”
Nathalia conta que sempre foi uma mãe muito atenta e pesquisava tudo sobre desenvolvimento infantil.

Aos oito meses da filha, notou algo que realmente a preocupou: Iara não atendia quando era chamada pelo nome. “Eu podia chamar mais de dez vezes e ela não respondia nem com o olhar.” Ela chegou a suspeitar de um problema auditivo, mas descartou rapidamente: “Quando colocava músicas ou desenhos que ela gostava, ela reagia ao som.”

Mesmo com o pediatra dizendo que era normal, o comportamento não parecia comum para a mãe. No mesmo período, a avó de Iara, enfermeira, havia concluído um curso sobre os sinais de TEA e deu opinião decisiva: ela afirmou que a menina tinha autismo. Nathalia passou, então, a investigar especificamente o TEA e encontrou semelhanças em relação ao comportamento da filha. “Ela era uma criança diferente e eu sabia.”

Quando Iara completou 1 ano e 8 meses, Nathalia levou suas suspeitas a uma nova pediatra, que aplicou a escala M-CHAT. Com uma pontuação alta, a família foi encaminhada para uma avaliação mais completa. Sem neuropediatra disponível pelo plano, entraram na fila do SUS e, paralelamente, procuraram outros profissionais em uma clínica, que refizeram as avaliações e ampliaram a investigação. Nesse período, Iara ainda não falava nada.


Os meses seguintes foram de intensificação dos sinais. A menina começou a ter distúrbios de sono, episódios de agitação e várias estereotipias. “Ela ficava correndo e gritando pela casa e dava voltas na mesa sem parar.”


Além do biquinho, surgiram flapping das mãos (movimentos repetitivos de bater ou balançar as mãos), piscar forte dos olhos e andar constante na ponta dos pés. Atividades diárias também se tornaram desafiadoras, como cortar as unhas, escovar os dentes e até a alimentação.

A seletividade alimentar era outra característica muito marcante na bebê. “Ela preferia alimentos secos, crocantes e amarelos, e comia o arroz grão a grão, sem deixar a colher se aproximar”, conta Nathalia. A lista de alimentos aceitos incluía arroz, batata frita, banana, cream cracker, cereal matinal, ovo mexido e nuggets.

A confirmação do diagnóstico

Aos 2 anos e 5 meses, Iara finalmente foi atendida pela neuropediatra do SUS. A especialista observou o modo como ela brincava e percebeu que, mesmo após intervenções precoces, a menina ainda não usava os brinquedos de forma funcional, não atendia pelo nome, evitava contato visual, não falava e não apontava para se expressar. A escala M-CHAT foi aplicada novamente e o resultado foi conclusivo. “Ela nos disse que a Iara havia gabaritado o teste”, lembra Nathalia.

A confirmação trouxe alívio e medo ao mesmo tempo. “Não choramos por negação, mas por saber que seria difícil o que iríamos enfrentar.” Depois do diagnóstico, a rotina da família mudou por completo. A neuropediatra indicou mais de 25 horas semanais de terapias que incluíam psicologia, ABA, terapia ocupacional com integração sensorial, musicoterapia, fonoaudiologia e acompanhamento nutricional. “Passei a viver exclusivamente para cuidar da Iara e cumprir as demandas terapêuticas dela, enquanto meu esposo trabalhava”, conta a mãe.


A dedicação da família, no entanto, fez efeito e, com o tempo, os avanços começaram a aparecer. Hoje, Iara já consegue sentar e permanecer parada por alguns minutos, faz contato visual imediato (ainda que por pouco tempo), brinca de maneira funcional e imita algumas ações. Ela também está aprendendo a repetir palavras, embora siga não verbal, e o sono melhorou com medicação indicada pelos médicos.

Na socialização, ela ainda prefere ficar sozinha na creche, mas isso já é considerado um grande avanço pela mãe: antes, ela não suportava a presença de outras crianças. Por ser nível de suporte 3, continua precisando de supervisão constante.


A família segue firme no objetivo de garantir acesso às terapias que proporcionaram tanta evolução. “Esperamos continuar vendo progressos, para que ela se torne uma adulta funcional e o mais independente possível, mesmo com as dificuldades dela.”

O que são estereotipias?

Segundo o médico geneticista Rodrigo Ambrosio Fock, estereotipias – como o biquinho feito por Iara – são comportamentos repetitivos que acontecem sem um gatilho específico e podem se manifestar de diferentes formas: motoras, verbais ou sensoriais.


As mais comuns, segundo ele, são as motoras, como balançar o corpo, agitar ou bater as mãos (flapping), pular repetidamente ou até manipular objetos de maneiras específicas. Há também estereotipias verbais, quando a pessoa repete sons, palavras ou frases fora de um contexto comunicativo, e sensoriais, ligadas à busca de estímulos, como o contato com água ou ações que proporcionam determinada sensação na pele.

É importante ressaltar que a estereotipia não é algo exclusivo do autismo, embora faça parte dos critérios diagnósticos. “Ela pode surgir tanto na infância quanto na vida adulta, dependendo do nível de suporte necessário. Em quadros mais leves, é comum que a pessoa aprenda a mascarar esses comportamentos em situações sociais, prática conhecida como masking”, ele explica.


Ainda de acordo com o médico geneticista, o foco das terapias não precisa ser eliminar totalmente a estereotipia, mas ajudar na regulação, garantindo que o comportamento não atrapalhe a funcionalidade social. “Não é sobre não fazer nenhum movimento, mas sim sobre ser socialmente funcional”, explica. Em alguns casos, inclusive, esses movimentos ajudam na autorregulação e na organização do pensamento.


A preocupação maior surge quando a estereotipia pode oferecer risco, como arrancar cabelo, roer unhas de forma intensa ou praticar skin picking – ato de puxar pelinhas ou beliscar a própria pele até causar feridas. Isso ocorre principalmente em pessoas com hipo ou hipersensibilidade sensorial, que podem se machucar sem perceber.


Fora esses casos, Fock afirma que as estereotipias não costumam representar perigo, mas fazem parte de algo que precisa ser acompanhado para favorecer o desenvolvimento e o bem-estar da criança ou adulto.

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