Com o objetivo de garantir a execução de políticas públicas e o cumprimento de legislações que versam sobre o acesso ao serviço e a proteção da saúde da população negra, os Ministérios Públicos do Estado de Alagoas (MPAL) e Federal (MPF) e a Defensoria Pública Estadual (DPE) expediram, nesta quinta-feira (18), uma recomendação à Secretaria de Estado da Saúde (Sesau).
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O documento, que é direcionado ao secretário da pasta, Emanuel Victor Duarte Barbosa, elenca várias medidas que devem ser cumpridas pela Sesau em até 60 dias. Uma delas é a apresentação das rubricas orçamentárias da LOA 2026 vinculadas à Política de Saúde da População Negra, acompanhadas do planejamento de execução físico-financeira e identificação das ações estruturantes prioritárias.
Os órgãos também solicitam que, no mesmo prazo, a Sesau: apresente cronograma anual de formação antirracista dirigido a todas e todos os profissionais do SUS vinculados à pasta, a ser executado ao longo de 2026, contemplando conteúdos sobre diversidade religiosa, práticas de povos e comunidades tradicionais e conhecimento dos territórios assistidos; assegure o registro sistemático e obrigatório da variável raça/cor/etnia em 100% dos atendimentos realizados no âmbito do SUS, adotando mecanismos de supervisão e correção de inconsistências; indique ao menos um(a) profissional negro(a) como referência técnica para as ações de saúde da população negra em cada unidade de saúde da rede Sesau, assegurando atribuições definidas e articulação com a coordenação estadual.
Conforme os promotores, procuradores e defensores que assinam a recomendação, o Brasil, em setembro de 2023, anunciou na 78ª Assembleia Geral da ONU a adoção voluntária de um 18º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS 18), voltado à Promoção da Igualdade Étnico-Racial, reconhecendo que não há desenvolvimento sustentável sem o combate ao racismo e às desigualdades históricas.
“O ODS 18 tem como metas, dentre outras: eliminar o racismo e a discriminação étnico-racial; assegurar acesso à atenção de saúde de qualidade para a população negra e indígena; proteger o patrimônio cultural, artístico e religioso dos povos indígenas e afrodescendentes; e promover a representação equitativa da população negra e indígena nos espaços de poder e tomada de decisão. Esse compromisso, coordenado pelo Ministério da Igualdade Racial e pela Comissão Nacional para os ODS (CNODS), reforça o dever dos entes federativos de implementar políticas públicas que garantam a equidade étnico-racial em todas as áreas, especialmente na saúde”, salientam os órgãos que expediram a recomendação.
“O racismo é considerado um determinante social da saúde, uma vez que sua existência atrapalha ou mesmo impede o acesso a cuidados e serviços de saúde, gera maior prevalência de doenças crônicas e infecciosas entre a população negra, altos índices de violência e piores indicadores relativos às condições de vida. O racismo afeta também populações indígenas, ciganos, quilombolas e demais grupos étnico-raciais”, enfatizam os promotores, procuradores e defensores.
O documento ainda detalha que a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) foi instituída em 2009, por meio da Portaria nº 992, de 13 de maio de 2009, como resposta às desigualdades em saúde de que é vítima essa população, facilmente verificadas pela precocidade dos óbitos, altas taxas de mortalidade materna e infantil, maior prevalência de doenças crônicas e infecciosas, entre outros indicadores que permitem perceber a discriminação racial na garantia do direito à saúde da população negra.
A Política apresenta, como diretrizes gerais, dentre outras: a inclusão dos temas Racismo e Saúde da População Negra nos processos de formação e educação permanente dos trabalhadores da saúde e no exercício do controle social na saúde; e a promoção do reconhecimento dos saberes e práticas populares de saúde, incluindo aqueles preservados pelas religiões de matrizes africanas.
Os membros do MPAL, MPF e DPE também salientam, na recomendação, que em audiência pública realizada pelas entidades signatárias, em 22 de outubro de 2025, foram feitas diversas propostas no sentido de assegurar a implementação da Política Integral de Saúde da População Negra, Quilombola e de Religiões de Matrizes Africanas.
Outras ações solicitadas pela recomendação incluem que a Sesau: apresente cronograma para mapeamento de doenças cardiovasculares e síndrome metabólica nas comunidades negras e quilombolas, prevendo metodologia, áreas prioritárias, etapas de campo e estratégias de vigilância em saúde para execução em 2026; apresente cronograma para mapeamento da gravidez infantojuvenil na população negra alagoana, com definição de fontes de dados, territórios prioritários e procedimentos de coleta e análise, a ser realizado em 2026; apresente planejamento de campanha educativa de prevenção à autolesão e ao suicídio voltada à população negra, contemplando comunicação acessível, ações territoriais e articulação com a Rede de Atenção Psicossocial, além de outras medidas.
Com prazo até novembro de 2026, os órgãos pedem que a Sesau apresente planejamento para a incorporação, a partir de 2027, dos tratamentos tradicionais, detalhando formas de integração ao SUS, fluxos assistenciais, responsabilidades e etapas de implementação, em consonância com o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010), que reconhece e valoriza os saberes, práticas e manifestações culturais de matriz africana, assegurando sua promoção, proteção e participação nos serviços públicos, inclusive na política de saúde.
O documento é assinado pelas promotoras de Justiça Alexandra Beurlen e Micheline Tenório, pelo procurador da República Bruno Lamenha e pelos defensores Públicos Isaac Souto e Ricardo Melro.
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