Antes uma mascote era só uma mascote. Acenavam para a torcida, tiravam fotos, faziam algumas peripécias, agradeciam o carinho... e mais nada. Inspirados em modelos norte-americanos de outros esportes, como o basquete da NBA, a função de representar as equipes tem deixado de ser apenas simbólica, cuja maior responsabilidade era só vestir uma pesada fantasia.
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A brincadeira evoluiu e cada vez mais vem se transformando em importante forma de comunicação com os seguidores do clube. Mais: a mascote se profissionalizou e atualmente trabalha com carteira assinada. Há menos amadores e mais profissionais dentro da fantasia.
Um exemplo dessa nova geração de mascotes no futebol brasileiro é o Toro Loko, nome dado a mascote do Red Bull Brasil, da primeira divisão do Paulistão. William Santos Pereira, o responsável por dar vida ao personagem desde 2008, nunca tinha entrado em um estádio antes de ser procurado para realizar o teste. Sua profissão? Dançarino de street dance.
William conta que quando o selecionaram, logo apresentaram um vídeo do Benny, a mascote do Chicago Bulls, da NBA, para ele se inspirar. Além da necessidade de se aprimorar com movimentos do funk, pagode, samba e outros ritmos da música nacional, ele sentiu também a necessidade de criar uma personalidade para o Toro. “Ele é tipo o Menino Maluquinho, gosta de divertir as pessoas, é aquele cara maneiro, que gosta de festa, de carnaval, que está sempre alegre”, explica orgulhoso.
Pedro Lima, sócio da empresa de comunicação esportiva CSM Golden Goal, acredita que essa construção deve ser feita em quatro passos: determinar as características da mascote, confeccionar a fantasia de acordo com essa personalidade, montar uma estratégia de treinamento e, por fim, treinar os profissionais envolvidos. “Os especialistas, por exemplo, montam as coreografias para fazer com que as premissas e os valores da marca virem movimento”, revela.
Como toda e qualquer profissão, a de ser mascote é também um aprendizado. Cleiton Majolo era da bateria de uma torcida organizada quando foi chamado para se transformar no Índio Guerreiro, o símbolo da Chapecoense. Precisou treinar desde pose de “mau” até “carão de modelo” na frente das câmeras.
Aprender a dançar e a imitar o arco e flecha, então, foram fichinhas perto do que ele teve de fazer depois do acidente aéreo do time, que vitimou 71 pessoas. “Eu sinceramente pensei que não ia mais ter coragem de vestir o Índio, perdi parte da “família” naquela tragédia, mas como a maior característica dele é ser guerreiro, peguei emprestado um pouco dessa força e fiquei quase 24 horas fantasiado no velório em Chapecó”, diz.
Severino Bianchi, de 51 anos, é o homem por trás do Santo Paulo. Antes de receber o convite, ele já prestava serviço ao São Paulo como motoboy. Viu na oferta uma forma de melhorar sua condição e de se divertir. “É para eu bagunçar e ninguém me ver? Aceito!” Mas logo percebeu que sua função era muito mais que apenas vestir a fantasia do velhinho doce, brincalhão e cheio de energia do Morumbi, como ele mesmo o descreve. “Não é só encarnar o personagem, pensar nos movimentos, animar a torcida... o São Paulo me deu a oportunidade de voltar a estudar e, por isso, hoje faço parte da equipe de marketing do clube”, diz.
Esses dois exemplos de mascotes, no entanto, ainda são minoria no Brasil em relação à condição de trabalho, com carteira assinada. Esse, inclusive, é um assunto bastante debatido no grupo do WhatsApp que reúne todos as mascotes dos maiores clubes do Brasil. Como muitos só recebem por jogo, para ganharem mais pensam em participar de alguns eventos particulares.
“Eles pagam ajuda de custos, dão gasolina e transporte. Então o pessoal que ia casar me contratava. Eu aparecia em festas de aniversário. Só assim conseguia sobreviver”, contou Vovô, símbolo do Ceará – clube pediu para a mascote não ter o nome revelado. Hoje ele tem outro emprego, mas continua dando vida à mascote porque é o que ama fazer. “Você é o 12.º jogador, vive tudo ali no campo. Representar seu time e fazer sua torcida feliz é o sonho de qualquer torcedor”, conta. Com o tempo, o Vovô quer ter os mesmos direitos dos outros trabalhadores do clube.
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