Mundo

Satélite New Horizons sobrevoa objeto mais distante já visitado no Sistema Solar

'Visita' a pedregulho, remanescente da formação do Sol e dos planetas, ocorrerá na virada do ano

Folhapress | 31/12/18 - 12h28
New Horizons | Reprodução

Nas primeiras horas do dia 1º de janeiro, a sonda New Horizons fará o sobrevoo do objeto mais distante a ser visitado por uma espaçonave. Seu nome oficial é obtuso: 2014 MU69. Seu apelido é provisório: Ultima Thule. Mas seu segredos são antigos e remontam à própria formação do Sistema Solar.
Trata-se de um pedregulho remanescente do processo que deu origem aos planetas da família solar, há 4,5 bilhões de anos. Mantido afastado do Sol por todo esse tempo, é quase uma amostra congelada do material que originou nosso sistema planetário.

O sobrevoo vem três anos e meio depois da passagem da mesma New Horizons por Plutão, planeta anão que até o momento detinha o recorde de objeto mais distante a ser explorado de perto. Ultima Thule, contudo, é bem menor.
A aproximação máxima se dará às 3h33 (de Brasília), momento em que a emissária robótica estará furiosamente ocupada tirando tantas fotos e medidas quantas forem possíveis, numa passagem furiosa pelo pequeno objeto a 14,4 km/s. Convertendo para medidas mais familiares do dia a dia, são quase 52.000 km/h, 170 vezes mais rápido que um carro de Fórmula 1.
A velocidade faz forte contraste com o tamanho do objeto, de cerca de 20 km.

Espera-se que a sonda se volte para a Terra e inicie uma transmissão às 7h20, apenas com dados de telemetria, indicando os "sinais vitais" da espaçonave. Os sinais de rádio, viajando à velocidade da luz, vão levar pouco menos de seis horas para chegar às antenas da Deep Space Network, da Nasa, por volta das 13h.
A equipe responsável espera, se tudo correr bem, apresentar as primeiras análises científicas do objeto no dia 2. Imagine: a sonda cruzará de uma ponta a outra do MU69 em meros 2 segundos. Claro, como o sobrevoo vai se dar a cerca de 3.500 km da superfície do objeto, seu deslocamento nas câmeras da New Horizons parecerá mais maneiro, da mesma forma que temos a sensação, num avião em cruzeiro, de que o chão está se deslocando devagar abaixo de nós, embora estejamos voando a 1.000 km/h.

Descoberto em 2014 com a ajuda do Telescópio Espacial Hubble, o 2014 MU69 é definido mais propriamente como um KBO, sigla inglesa para Objeto do Cinturão de Kuiper. Acredita-se que esse agregado de astros compostos majoritariamente de gelo, localizados além da órbita de Netuno, sejam parte do que sobrou do processo de formação planetária (assim como o cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter, esse predominantemente rochoso).
Como todos os seus colegas da região (salvo Plutão), o MU69 até hoje não passou de um ponto de luz indistinto ao telescópio (por sinal, até mesmo a quatro dias do encontro o objeto continuava sendo um único pixel na câmera telescópica da New Horizons, a Lorri).

Observações em solo ajudaram a determinar sua órbita aproximada (296 anos) e campanhas de monitoramento de ocultações estelares (quando o MU69 passava à frente de uma estrela distante) ajudaram a dar uma ideia de seu formato irregular.
Cronometrando a duração da ocultação em diversos pontos da Terra, foi possível revelar que o objeto deve ser alongado –talvez até um binário de contato, ou seja, resultado da união de dois precursores, como o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, explorado pela sonda Rosetta.

Estranhamente, durante sua aproximação, a New Horizons não viu oscilações no brilho do astro, que seriam esperadas no caso de uma forma irregular (e ajudariam a determinar sua taxa de rotação). É possível que a sonda esteja se aproximando de MU69 na direção de seu eixo de rotação, mas isso não será sabido até o sobrevoo.
O mesmo se pode dizer da composição do objeto. Sabe-se que é avermelhado (como Plutão), mas não mais que isso. Só observações detalhadas, que farão o pedregulho passar de 1 pixel a cerca de 1.000 pixels (nas melhores imagens da Lorri), ajudarão a revelar de que é feito.

Para enviar tudo que colherá do encontro com o MU69, a New Horizons precisará de 20 meses. Mas mesmo o último bit transmitido pode não significar o fim da missão.
"A espaçonave está muito saudável, todos os sistemas vão estar funcionando, e seus reservas estão disponíveis", diz Alan Stern, cientista-chefe da missão. "Nós estaremos no cinturão de Kuiper até o final da década de 2020 e podemos, se a Nasa aprovar, tentar fazer mais um sobrevoo."
Esse objeto precisa estar mais ou menos no caminho já traçado pela New Horizons em sua saída do Sistema Solar.

"Vamos usar os equipamentos maiores e mais capazes disponíveis. Podemos usar o Hubble, o Telescópio Espacial James Webb, se ele estiver disponível, e a nossa própria câmera, a Lorri. Talvez a espaçonave encontre seu próprio alvo. Ninguém fez isso antes. É quase ficção científica."
Quem sabe ainda há mais um recorde a ser batido pela New Horizons?