Sensacionalistas do YouTube ‘roubam’ notícias reais

Publicado em 29/11/2017, às 23h48

Por Redação

Quando a esposa de Elmer T. William contou ao marido que havia ocorrido um assassinato em massa em uma igreja no Texas, ele entrou imediatamente em ação. Primeiramente, olhou um punhado de novas notícias sobre o massacre em que morreram 26 pessoas. Depois, foi para seu estúdio de vídeo, em casa, e começou a gravar.

Uma hora mais tarde, William, 51, personalidade de direita do YouTube que se define “The Doctor of Common Sense” (doutor de senso comum), tinha filmado, editado e carregado para a sua página do YouTube um comentário de três minutos sobre o acontecimento. As autoridades ainda não tinham identificado um suspeito, mas isso não impediu que William, que é negro, especulasse que o atirador era provavelmente “muçulmano ou negro”. O assassino não era nem um nem outro.

Vi os vídeos de Williams horas depois do crime, quando um deles começou a se destacar nos resultados de busca do YouTube sobre o massacre na igreja, juntamente com outros vídeos que faziam declarações não verificadas, postadas por páginas com nomes como TruthNews Network e The Patriotic Beast.

O YouTube há muito tempo é um depositório de comentários políticos feitos sem o menor cuidado, mas, nos últimos meses, nele tem predominado certo tipo superprolífico de amantes da teoria da conspiração. Com reações rápidas e abundantes às notícias de última hora, estes comentaristas que se destacam pela resposta rápida — o equivalente do YouTube aos humoristas do rádio — conseguiram encabeçar com sucesso os resultados das buscas com suas opiniões mirabolantes.

Em uma entrevista por telefone de sua casa em Houston, Williams contou que havia criado mais de 10 mil vídeos para o YouTube em um período de oito anos, postando nada menos que 20 comentários por dia, com cerca de 200 milhões de visualizações.

Ele foi admitido em um programa de parceria do YouTube, que permite que mensagens populares ganhem dinheiro exibindo anúncios em certos tipos de vídeos, e afirmou ter ganhado nada menos que US$ 10 mil por mês com seu canal. “Gosto de me definir um repórter que transmite suas notícias para as pessoas comuns”, disse Williams.

Seja sua motivação o lucro ou a microcelebridade, o sucesso dos que exploram o sensacionalismo, como Williams, tornou-se um problema incômodo para companhias como Facebook, Twitter, e Google, dona do YouTube. Estas empresas editam e priorizam as informações para seus usuários, e a maioria delas criou um sistema de classificação que dá maior realce a notícias veiculadas por veículos tradicionais em vez de casos divulgados por fontes menos confiáveis. Acontece que esses algoritmos podem ser manipulados e transformados em notícias de última hora por usuários que trabalham rapidamente, nos valiosos minutos entre o aparecimento da notícia e a primeira leva de artigos ou vídeos legítimos.

“Antes que fontes confiáveis preparem artigos, há uma espécie de intervalo em que ‘vale tudo’”, disse Karen North, professora que estuda mídia social na Universidade Southern California. “As pessoas que postam opiniões sensacionalistas sobre as notícias aprenderam que quanto mais cedo lançam o seu material, maior é a probabilidade de seu conteúdo encontrar um público”.

As empresas de tecnologia, que já estão na mira das autoridades pela facilidade com que permitiram que a Rússia interferisse nas eleições do ano passado, também se comprometeram a adotar uma postura mais rigorosa com a desinformação.

As normas do YouTube proíbem o conteúdo de ódio e ameaça. No dia 7 de novembro, pouco depois de eu fazer algumas perguntas ao YouTube sobre a conta de Williams, todos os seus vídeos e o seu perfil foram retirados.

Horas depois de ter sido banido do YouTube, Williams postou um vídeo na Vimeo, outra plataforma que hospeda vídeos. Ele prometeu que continuará insultando seus alvos preferidos — os democratas, Hillary Clinton, Barack Obama — e que não se furtará absolutamente à polêmica, sem se importar com as medidas adotadas.

“Eu não quero mais nada com o YouTube”, declarou. “É muito comunista”.

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