Tecnologia

TEO e Hugo: iniciativas alagoanas investem em tecnologia assistiva

30/05/17 - 20h54
Arquivo pessoal Thiago Sales

O desenvolvimento de softwares para dispositivos móveis impulsionou a criação de milhares de aplicativos mundo afora.

Os “apps”, na abreviação em inglês, se espalharam com uma infinidade de usos: de serviços de alimentação a dicas de moda, da paquera ao trânsito, cabe de tudo na tecnologia mobile.

Mas alguns alagoanos foram mais longe e não se contentaram em usar esse conhecimento apenas para tornar a vida moderna mais confortável.

E é aí que aparecem o "Hugo" e o "TEO". Talvez você não os conheça. Mas milhares de brasileiros - e estrangeiros - sabem bem quem são esses dois mascotes de aplicativos usados por surdos e autistas, respectivamente. Outra iniciativa local é o "ABC Austismo", que ajuda na alfabetização de crianças com a síndrome.

Colocando um olhar mais sensível nas possibilidades da ciência e da tecnologia, iniciativas locais criaram aplicativos que investem na inclusão social, mais precisamente na chamada "tecnologia assistiva", termo novo, mas que você vai aprender rapidinho nesta reportagem.

Seja possibilitando a leitura do noticiário em libras ou ajudando portadores de autismo, esses projetos locais universalizam ideias solidárias e inclusivas, ajudando a milhares de pessoas e trazendo reconhecimento local e internacional para a tecnologia produzida em solo alagoano.


A desordem neurobiológica que compromete o desenvolvimento humano, o autismo, atinge hoje cerca de 2 milhões de brasileiros. Considerando a dificuldade de comunicação e outras limitações das pessoas diagnosticadas, o autismo tornou-se um campo fértil para o uso da tecnologia, auxiliando efetivamente no desenvolvimento das capacidades para quem tem a síndrome.  

De Alagoas saíram dois importantes projetos focados no autismo. O  "TEO", e o "ABC Autismo". O primeiro traz uma série de jogos educativos e o segundo, como aponta o nome, ajuda na alfabetização de crianças autistas.

TEO Autismo

E foi após uma visita à Clínica Trate Autismo, em Arapiraca, agreste de Alagoas, que professor de Ciência da Computação, Thiago Sales, resolveu elaborar um projeto para auxiliar o atendimento de profissionais que cuidam de crianças autistas. 

Após observar a rotina da clínica, o professor concluiu que o melhor método seria introduzir brincadeiras por meio da tecnologia.

Thiago percebeu que alguns mecanismos poderiam ser utilizados com a ajuda de um tablet. Com este acompanhamento e algumas pesquisas surgiu o TEO Autismo, um aplicativo com diversas categorias de jogos pensados para atender os diferentes níveis de autismo e proporcionar divertimento, aprimorar o raciocínio, assim como estimular a comunicação e socialização das crianças.

O repórter Bruno Protasio mostra, no vídeo abaixo, as funcionalidades do TEO Autismo. Assista: 

TEO é na verdade uma sigla que explica a funcionalidade e benefícios da ferramenta: Tratar, Estimular e Orientar. 

“O TEO é focado no auxílio ao tratamento da criança com autismo, ou seja, é um aplicativo para ser usado junto com o profissional, que vai saber escolher o jogo mais adequado de acordo com o nível de autismo daquela criança”, explicou o desenvolvedor do aplicativo.

Ao ser desenvolvido, em 2013, o aplicativo passou a fazer parte da rotina de atendimentos da Clínica Trate Autismo, que cuida atualmente de mais de 70 crianças. Em plena era digital, TEO foi recebido de braços abertos.

Especialista: aplicativo ajuda na concentração, associação e memória

A Terapeuta ocupacional, Graziela Valeriano, que atende pacientes na clínica, garante a eficiência do aplicativo.

“As crianças adoram. Elas possuem muita dificuldade para se expressar, de se comunicar e com o TEO a gente busca aumentar a concentração, a associação, a memória”, afirma a terapeuta.

Com o passar dos anos, o “app” passou por atualizações de acordo com as análises dos profissionais e também do retorno das pessoas que baixam o aplicativo pelo mundo, atualmente utilizado em países como Espanha, Itália e Argentina. A principal preocupação, segundo a terapeuta, era com o vício das crianças.

“Acredito que tudo tem o seu tempo. A tecnologia pode abrir um caminho enorme para o auxílio do tratamento de crianças com deficiência. Acho que estamos apenas no início da caminhada nessa área”, diz, otimista, a terapeuta.

Para aprimorar o atendimento, o criador do TEO anuncia que o serviço também será ampliado para a versão web.

“Estamos querendo criar um serviço web que seria público para as clínicas, em que os profissionais podem acompanhar o desempenho das crianças nos jogos e cada um vai abordar a dificuldade que ela tenha em cada tipo de atividade. Os dados ficariam gravados em nuvem, disponibilizando a quantidade de acertos e erros de cada criança naquele determinado jogo, o tempo que ela jogou, que assim o terapeuta pode acompanhar e indicar melhor o tipo de jogo que aquela criança poderá fazer”, diz Thiago Sales.

Em 2015, os desenvolvedores do aplicativo estiveram em um evento na Bahia e receberam o prêmio de melhor artigo, durante a apresentação do “TEO”.

Equipe do "TEO Autismo" recebeu prêmio na Bahia

Atualmente, o aplicativo conta com mais de dez mil downloads. E por falar em downloads, abaixo vai o link para baixar o TEO no Google Play: 


ABC Autismo

Depois de muito muita pesquisa, Wellison Souza  e Ezequiel Batista, pesquisadores do curso superior de Sistemas de Informação do Instituto Federal de Alagoas (IFAL) criaram o aplicativo "ABC Autismo", um jogo educativo para tablets e smartphones.  O projeto concretizou-se graças a uma pareceria entre o IFAL e a Associação dos Amigos do Autista, a AMA-AL.

Até o fechamento desta reportagem o app já contabilizava mais de 50 mil downloads.

Após quase dois anos de pesquisas na área, estudos de campo e contato com profissionais, pais e crianças envolvidas no universo autista, nasceu o aplicativo alagoano ABC Autismo. O projeto foi uma parceria do grupo de pesquisa liderado pela Prof. Dr. Mônica Ximenes, do Instituto Federal de Alagoas, e da AMA-AL.

O aplicativo alagoano tomou como base o programa TEACCH (Treatment and Education of Autistic and related Communication-handicapped Children), criação da Universidade da Carolina do Norte, utilizado na alfabetização e desenvolvimento de capacidades de pessoas com autismo.

Disponível gratuitamente na Google Play Store (clique aqui para fazer o download), o aplicativo tem 4 níveis de dificuldade: até o terceiro, foca na coordenação motora e características como transposição de objetos e discriminação de elementos. O quarto nível traz tarefas alfabetizadoras, voltadas ao letramento. 

O vídeo abaixo mostra o funcionamento do aplicativo. 


Quando uma jovem surda de 13 anos chegou a um hospital do interior de Alagoas muito agitada, o médico Davi Freitas Tenório enquanto tentava acalmar a paciente, e sua mães, ambas muito agitadas, lembrou de um aplicativo que traduz textos digitais  para a Linguagem Brasileira de Sinais, a Libras. E foi com o Hand Talk que o médico conseguiu descobrir que sua jovem paciente estava com fortes dores de cabeça, diagnosticando em seguida, por meio de exames, que a adolescente estava com um sangramento intracraniano, que foi tratado e resolvido.

“Naquele dia o aplicativo foi uma ‘mão na roda’. A mãe demorou a chegar, não era fluente na língua de sinais e um detalhe na história dela em que fiz a pergunta pelo aplicativo foi quem me levou ao diagnóstico”, relembrou o médico em conversa com o TNH1.

“Serei eternamente grato ao Hugo”, disse. Hugo é um personagem em 3D que faz as traduções para Libras.

Dr. Davi: Serei eternamente grato ao Hugo (Foto: Arquivo Pessoal)


O aplicativo que fez a diferença para Davi e sua jovem paciente é uma criação dos alagoanos Ronaldo Tenório, Carlos Wanderlan e Thadeu Luz. Em 2012 uma competição de startups levou os jovens estudantes a criar o Hand Talk, primeira ferramenta do tipo para os surdos, hoje mundialmente conhecida.

Até o momento já são mais de 1 milhão de downloads, e mais de 55 mil traduções de textos digitais por mês, disponibilizando assim um universo de informações antes negado aos surdos.

"A ideia surgiu na universidade, em um trabalho acadêmico. Sempre tive duas paixões: comunicação e tecnologia. Tentei unir isso para criar algo relevante para pessoas com algum tipo de deficiência. Percebi que existia uma grande barreira de comunicação entre surdos e ouvintes e comecei a pesquisar sobre isso. A ideia ficou guardada por quatro anos, até que em 2012 inscrevi em um desafio de startups e fomos campeões. Em seguida transformamos aquela ideia em um negócio social, e fundamos a Hand Talk”, conta Ronaldo Tenório, sócio fundador.


Conheça o Hugo

Se você prestar atenção na lateral direta deste portal, em que você está lendo essa matéria, no TNH1, vai perceber um símbolo azul indicando que a leitura é acessível em libras. O TNH1, aliás, foi o primeiro portal de notícias do país a disponibilizar o Hand Talk. Hoje o app se espalhou mundo à fora e grandes empresas e instituições como Senac.

Melhor do Mundo – Em 2013 o Hand Talk foi eleito o melhor aplicativo do mundo na categoria Inclusão Social no prêmio WSA-Mobile, o “Oscar” da tecnologia mobile, promovido pela Organizações das Nações Unidas, em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes.

A equipe da Hand Talk recebe o prêmio da ONU em Abu Dhabi e levanta a bandeira de Alagoas (Foto: Arquivo pessoal/Ronaldo Tenório)

Colecionando sucesso por onde passa, Ronaldo Tenório alerta que há ainda muito espaço para novas tecnologias semelhantes ao Hugo. “Eu já vi muita tecnologia assistiva interessante e de alto impacto aqui pelo Brasil e nos países que já visitei. Tem muita coisa boa por aí, mas ainda há muito espaço para novas tecnologias. Eu acredito que é um processo de evolução e cada vez mais as pessoas com deficiência estão se acostumando a usar a tecnologia para realizar as atividades diárias, e com isso vem chegando uma demanda cada vez maior”.

A animação abaixo ilustra o trabalho tão importante do Hand Talk.

Agora aproveita que você já conhece o Hugo e baixe nos links a seguir ou indique para alguém que precise.