Automação avança, mas corretor continua indispensável para o mercado de seguros

Por Gilson Monteiro | 22/04/24 - 09h40

Dados da ABComm Forecast apontam que o comércio eletrônico no Brasil faturou em 2023, R$ 185,7 bilhões de um total de R$ 395 milhões de pedidos feitos pelos internautas. Os números mostram a consolidação do hábito do brasileiro de comprar com o mouse. Porém, um outro estudo mostra que, em alguns produtos e serviços, ainda preferimos ouvir, pessoalmente, um profissional especializado. Um desses serviços é o seguro. Informações do estudo “A Intermediação do Seguro no Brasil e os novos canais de venda”, elaborado pelo Centro de Pesquisa e Economia do Seguro (CPES), mostram que os seguros são o produto com maior índice de rejeição para compra online, com apenas 6% de aceitação. No mesmo estudo do centro de pesquisa da  Escola de Negócios e Seguros (ENS), 25% dos internautas disseram que jamais comprariam um seguro pela internet. O segundo colocado foram os produtos para PETs. O receio desses consumidores, segundo o estudo, é de que o serviço seja diferente do contratado ou até mesmo falso, por estarem em um ambiente virtual.

Uma verificação, na prática, é fácil entender os números do estudo da ENS. A reportagem entrou em três sites de seguradoras para fazer cotação de diferentes seguros. Diferente da expectativa, na realidade é que, os recursos como inteligência artificial e aplicativos para cotação são úteis, mas não dispensam a consultoria de um corretor. Até mesmo os sites mais modernos não conseguem informar, com clareza e segurança, as nuances na hora de contratar um seguro de vida, por exemplo. 

“O estudo mostra que os consumidores continuam preferindo a consultoria de um corretor na hora de efetivar a contratação de seguros. Portanto, por mais que a tecnologia ajude na busca por informações e em cotações, está comprovado que somente o profissional especializado é capaz de entender detalhadamente as necessidades de cada cliente e sugerir o melhor produto para cada caso. Isso nenhuma máquina é capaz de substituir”, explica Maria Helena Monteiro, diretora de ensino da ENS.

“A complexidade dos produtos ofertados pelo setor e a necessidade de orientação personalizada fortalecem o papel que o corretor desempenha de elo entre as seguradoras e os consumidores e, mais do que isso, de um verdadeiro consultor do segurado, ao avaliar os riscos aos quais ele, sua família e seus bens estão expostos e, por consequência, recomendar as coberturas mais adequadas”, reforça a diretora.

O estudo da ENS endossa a visão de quem põe a mão na massa, como o corretor Jammys Henrique, que atua há mais de uma década no mercado de Alagoas.

Atento às novas tendências, Henrique, formado em administração de empresas, usou a automação a seu favor. Para ele, o papel do corretor é prestar um atendimento mais personalizado e as ferramentas automáticas servem mais para prospecção de clientes.

“No começo, essas ferramentas, como cotação online, por exemplo, trouxeram um pouco de preocupação, pois o cliente enxergava isso como uma oportunidade de baixar o custo de seu seguro. Mas com o passar do tempo começamos a perceber que isso virou um aliado. A gente teve que se adaptar em muitas situações. Mas essas novas ferramentas são formas de prospecção de clientes. Essas novas ferramentas viraram até um argumento de venda para o corretor. O cliente começou a enxergar como o corretor é importante para esclarecer essas coberturas, como o corretor é importante no pós-venda”, avalia.

“O corretor, como presta um serviço personalizado, ele conhece a necessidade do cliente, e quando eu solicito ao cliente esses orçamentos feitos pela internet, por exemplo, para fazer um comparativo, sempre observo que o custo mais baixo está atrelado a coberturas menores, incompletas, que não tem itens essenciais ao perfil daquele cliente”, explica.

COM A PALAVRA, O CLIENTE . . .

Do outro lado desse negócio, estão os clientes. Adabel Costa, de 37 anos, nove deles adquirindo produtos com Jammys Henrique, não abre mão do serviço de um corretor. Mesmo sendo consultor de tecnologia da informação, ele insiste na necessidade do atendimento presencial na hora de contratar uma apólice.

“Eu acredito que mesmo com o avanço da tecnologia a gente também tem que ter um pouco de cautela para poder estar adquirindo serviços assim, porque existem aquelas letrinhas miúdas no final do contrato, e a gente não consegue conversar com uma máquina para entender o que elas significam. Já com um consultor, um corretor, ele está ali lhe assessorando, você consegue tirar todas as dúvidas de uma forma bem mais tranquila. Particularmente a minha experiência com ele é sempre muito boa”, garante Costa.

”Para mim, continuar com o serviço de um corretor de seguro é muito mais viável porque, eu sinto segurança de ter alguém que a hora que eu precisar, independente da hora, vai estar ali para me ajudar. Não sinto essa segurança em uma plataforma. Eu acredito que, com relação a seguros, realmente ainda é muito melhor o olho no olho” reforça.

►►CORRETORES RESPONDEM POR 80% DAS VENDAS

Somente no primeiro bimestre deste ano, o mercado de seguros arrecadou R$ 68,29 bilhões, um crescimento de 17,3%. Cifras que levam o setor a representar hoje 3,6% do PIB brasileiro. E para chegar a esses números, na linha de frente está o corretor. Afinal, são eles os responsáveis por 80% das vendas no setor.

Atualmente são 131 mil corretores com registros ativos na Susep, a Superintendência de Seguros Privados. Mas quem são esses profissionais, lastro desse mercado que emprega  185 mil pessoas no Brasil.

 A maioria dessa massa trabalhadora do mercado de seguros se concentra no sudeste. Somente em São Paulo e Rio de Janeiro possuem 68.614 registros ativos. Os estados com menor presença ficam no norte do país: Acre com 71 profissionais registrados; Amapá, 52 e em último, Roraima, com apenas 35 registros ativos.

Com relação à escolaridade, a maior parte dos corretores, 62%, têm curso superior completo. Outros 18,8% têm ensino médio completo. Os demais se dividem entre superior incompleto e ensino fundamental.

“O desafio da automação é real, mas os corretores têm a oportunidade de transformá-lo em uma vantagem, uma ferramenta para melhorar a sua atuação. Por isso, reforço que é preciso se manter atento e atualizado. Para não perder espaço, os profissionais precisam abraçar a tecnologia como uma aliada, incorporando os recursos em seus processos e estratégias de negócios”, analisa diretora de ensino da ENS, Maria Helena Monteiro.

Mulheres avançam - A maioria ainda é de homens, mas num cenário equilibrado, onde a mulher já representa 45% dos profissionais do ramo. Já a faixa etária, o menor público se concentra entre os mais jovens, com apenas 507 registros ativos com menos de 25 anos. Em um ramo tradicional, 1880 profissionais com mais de 74 anos ainda constam com registros ativos. 

Dados coletados em 20 de abril/2024
►► A TECNOLOGIA COMO ALIADA

Como qualquer setor da economia, o mercado de seguros vem sendo impactado pela tecnologia. E isso é uma boa noticia. A preferência da intermediação de um corretor de seguros diz mais da força desse profissional do que sobre alguma aversão do brasileiro às novas ferramentas.

 “Essa automação muitas vezes resulta em um aumento da eficiência e da qualidade dos serviços prestados, o que pode levar a um crescimento do setor e, consequentemente, à criação de novas oportunidades de emprego”, observa Djaildo Almeida, professor da ENS e presidente de uma corretora de seguro em Alagoas.

"Como proprietário de uma corretora de seguros, acompanhei o surgimento de novas ferramentas e tecnologias que transformaram a maneira como os corretores realizam seu trabalho. Em alguns casos, profissionais mais antigos se assustaram com essas mudanças e tiveram dificuldade em se adaptar.  Por outro lado, tive experiências positivas com profissionais mais experientes que rapidamente se adaptaram às novas tecnologias e conseguiram melhorar significativamente a produtividade e eficiência. Esses profissionais viram as novas ferramentas como oportunidades de otimizar o seu trabalho e ampliar o seu alcance no mercado", explica Almeida.

Trocando a velha papelada na maleta pelo laptop, o corretor começa a introduzir as novas ferramentas da tecnologia em seu cotidiano.

Carlos Alberto Valle, vice-presidente da Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor), resume bem esse novo cenário. “Acredito que foi uma mudança apenas de meio, os personagens não mudaram. O cliente continua sendo cliente e o corretor continua sendo necessário. Os meios estão sendo modificados através de inteligência artificial, de meio novos meios de comunicação, novas plataformas, mas a prática de falar com uma pessoa de confiança, permanece. Referência é o que move as relações”, teoriza Valle, que é também presidente do Sindicato dos Corretores de Seguro de Pernambuco.

Das entrevistas com os especialistas, a reportagem lista os principais impactos da tecnologia, até o momento, nas operações do mercado de seguros. Confira:

►Mais eficiência, menos burocracia

Papéis, planilhas, e muita informação. A tecnologia veio para minimizar os processos burocráticos. Revisando esses processos, é possível otimizar o trabalho do corretor.

“A automação no setor de seguros geralmente está relacionada a processos mais burocráticos e repetitivos, permitindo que os profissionais se concentrem em atividades que requerem mais análise e tomada de decisão”, analisa o professor da ENS, Djaildo Almeida.

►Automatização de processos

A redução da burocracia, a otimização do tempo passa pela automatização dos processos. Usando as ferramentas corretas, sejam aplicativos, ferramentas de cotação de seguros, dados do mercado que podem ser verificados na web, fornecem resultados mais rápidos e mais precisos.

►Aperfeiçoamento da experiência do cliente

Como em qualquer tarefa humana, os aplicativos de mensagens, as redes sociais encurtam distâncias. Essas facilidades também aproximam cliente e corretor. A soma disso tudo é uma melhor experiência para o cliente.