Texto de Percival Puggina:
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“Desde que as peneiras surgiram no repertório das utilidades, os protagonistas da política, em situações de apuro e em última instância, apelam para elas com o intuito de obscurecer o sol dos fatos.
A inutilidade desse tipo de negacionismo não desanima quem dele lança mão porque o último recurso ainda é um recurso, como sabem os advogados. Vá que cole. Mesmo se a cola usada for a saliva dos discursos, sempre é possível contar com a ingenuidade dos ingênuos, com a credulidade dos crentes, com o companheirismo dos companheiros e com o apoio de um jornalismo que faz jornal sem sequer espiar os fatos pela janela das redações.
São reflexões que me ocorrem ante reações que observo às palavras do ministro Luís Roberto Barroso proferidas num lugar onde, em virtude de seu cargo, não poderia estar. Ali, sua simples presença como um dos onze ‘supremos’ (na concepção do ministro Gilmar Mendes) passava a mensagem que agora se diz que não passou.
É o que se percebe em manifestações como a do STF sobre o caso. Por um lado, o Supremo pretendeu isolar a instituição, entendendo que Barroso falava do voto popular… Essa tentativa foi incompatível com a repercussão. E ela foi tanta que até o omisso senador Rodrigo Pacheco que transformou o Senado em parlamento baldio, pôs-se de pé pelo Brasil e cobrou retratação.
Ninguém do outro lado da praça, como era de esperar, levou a sério a cobrança do senador. Para quem tem olhos de ver, porém, o sol não tomou conhecimento da arrombada peneira e não alterou o modo como milhões de brasileiros percebem a conduta da ampla maioria do STF a respeito da atual oposição brasileira. Entenderam essa colegialidade bem representada cada vez que Barroso falou na primeira pessoa do plural. Para tanto, basta uma olhada no conteúdo da sacola dos inquéritos abertos por Alexandre de Moraes.
A propósito, é importante recordar o ambiente em que transcorreu o governo Bolsonaro. Alguém poderá dizer que foi ele quem abriu confronto com o STF? Alguém o viu descumprir ordem judicial, mesmo quando lhe vedava o que era prerrogativa sua, como, por exemplo, nomear o Diretor Geral da Polícia Federal? Em 26 de agosto de 2021 o Correio do Manhã publicou uma lista com as 123 ocasiões em que, até então, o STF havia alvejado o governo Bolsonaro…
Um ano e meio mais tarde, já havia 123 “cartuchos” no chão. E não foi diferente no ano de 2022. Em compensação, alguém teve notícias de interpelações, suspensões de decretos, invasões de competência, durante o atual governo? A horas tantas, é claro, Bolsonaro perdeu a paciência, subiu o tom e partiu para a grosseria que nada resolve, aumenta o atrito e permite ampla exploração política.
Minha leitura, como cidadão, ao longo desses anos, mostra que o governo Bolsonaro foi, desde o início, antagonizado pelo STF. Essa impressão, consolidada ao longo de quatro anos, persiste. Não são apenas as palavras proferidas que expressam o que as pessoas sentem, pensam ou fazem.”
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