Brasil

Veterinária frauda fila e toma terceira dose de vacina contra covid em SP

Uol | 01/07/21 - 17h09

Vacinada com as duas doses da CoronaVac em março deste ano, a veterinária Jussara Sonner, moradora de Arujá, na Grande São Paulo, afirmou ter furado a fila da vacina para se imunizar de novo — desta vez, com a dose única da Janssen.

A dupla imunização foi documentada pela própria veterinária em suas redes sociais. Em uma postagem no Facebook, ela disse aos amigos que não estava se sentindo protegida com a CoronaVac, foi a outro posto de vacinação e se imunizou novamente. Procurada pelo UOL nas redes sociais desde as 13h de hoje, Jussara Sonner não respondeu até a publicação desta reportagem.

Fotos dos comprovantes da vacina publicadas por Jussara nas redes sociais mostram que ela foi vacinada com as duas doses da CoronaVac em 9 de fevereiro e 2 de março deste ano, na UBS Vila Fátima, em Guarulhos, na Grande São Paulo.

No dia 30 de junho, ela se vacinou novamente com a dose única da Janssen, em outra unidade do mesmo município, a UBS Uirapuru. Nas postagens, Jussara ainda zombou do sistema de saúde, afirmando que não havia computador na UBS.

"Fui em um bairro meio que de favela em Guarulhos, onde não havia computadores para verificação online. Uma sorte! Anotaram meus dados numa folha timbrada. Quando cair no sistema será tarde demais".

"Nem o comprovante de endereço olharam", prosseguiu a veterinária.

Em outra postagem, desta vez em seu perfil no Instagram, ela se justificou dizendo que não se sentia protegida com as duas doses da CoronaVac.

"Sei que nenhuma vacina é totalmente segura, pois não houve tempo para a realização dos testes. Mas como no início do ano tomei a 'vachina' [sic] estava bastante incomodada com isso. Esperei o tempo necessário, três meses, e hoje consegui tomar a da Janssen. Agora me sinto mais protegida, é dose única e estou liberada para viajar para onde eu quiser. Agora sim que viro jacaré", escreveu. 

O caso foi denunciado no Ministério Público de São Paulo por meio do portal "Fura-fila da vacina". O MPSP afirmou que a denúncia foi recebida e encaminhada para a Promotoria de Justiça.

Todas as vacinas usadas no Brasil foram aprovadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e tiveram a eficácia comprovada em testes. A escolha de imunizantes vem sendo criticada por especialistas e autoridades em Saúde, pois atrapalha a logística e a estratégia de atingir um público cada vez maior.

Até ontem, menos de 13% dos brasileiros haviam completado o ciclo vacinal contra o coronavírus.

Prefeitura vai investigar internamente

Procurada pelo UOL, a Prefeitura de Guarulhos afirmou por meio de nota que o prefeito Guti (PSD) tomou conhecimento nesta manhã das postagens e imediatamente determinou que o caso fosse enviado ao Ministério Público Estadual para que o caso seja investigado.

"A prefeitura não mede esforços para promover uma vacinação célere e eficiente, criando critérios objetivos para a contemplação de sua população. Mas não se pode fechar os olhos para abusos e fraudes que visem burlar esse sistema, ainda mais baseadas em motivações desprovidas de amparo científico que possam prejudicar grupos prioritários para a vacinação, como neste caso", afirmou a prefeitura em nota.

A Secretaria Municipal de Saúde de Guarulhos também abriu um procedimento interno para apurar que tipo de falha pode ter ocorrido neste caso em que a mesma pessoa foi vacinada duplamente com dois imunizantes diferentes.

A lei estadual nº 17.320, em vigor desde 12 de fevereiro deste ano, prevê multa de R$ 1.700 para quem furar a fila da vacina, ou seja, "descumprir a ordem cronológica de vacinação de grupos prioritários definidos no plano de imunização contra a covid-19". A lei não deixa claro, no entanto, se pode ser aplicada no caso de quem se imunizou mais de uma vez.

Revacinação não traz benefício

Segundo o médico Alexandre Naime Barbosa, chefe do Departamento de Infectologia da Unesp, não existe efeito benéfico da revacinação dentro de um período de tempo tão curto.

"No momento em que ainda não vacinamos nem 40% da população com a primeira dose, uma pessoa fazer esse tipo de falcatrua é o cúmulo do egoísmo e da falta de empatia. Ela está tirando dose de gente que precisa e não está se beneficiando, não está mais protegida", afirma Barbosa.
Segundo o médico, que é do Comitê de Covid-19 da Associação Médica Brasileira e da Sociedade Brasileira de Infectologia, a possibilidade da revacinação com a terceira dose está em discussão, mas sob a condição única de que só deve acontecer depois que toda a população acima de 18 anos esteja imunizada.