Brasil

Água some de rio que corta Minas e Bahia

Folhapress | 11/11/21 - 08h11
Janis Morais / Divulgação / SGB / CPRM

As águas do rio Verde Grande, que corta o semiárido de Minas Gerais e da Bahia, estão desaparecendo por causa de um fenômeno que pode estar ligado ao esvaziamento de um aquífero da região.
O SGB (Serviço Geológico do Brasil) investiga a redução do volume do curso d'água, que há cerca de 10 anos deixou de ser perene, ou seja, já não corre em toda a sua extensão original em períodos de seca.

O Verde Grande nasce em Bocaiúva, norte de Minas, e vai até Malhada, sul da Bahia, onde deságua no rio São Francisco, um trajeto de 557 quilômetros que cruza 27 municípios mineiros e 8 baianos. O último levantamento do SGB, feito em 2018, indica que o rio perde 560 mil litros de água por hora. O dado leva em consideração somente o volume desaparecido, e não o usado, por exemplo, para a agropecuária. Os 560 mil litros perdidos por hora equivalem, para efeito de comparação, a 7 piscinas olímpicas por dia.

O resultado preocupa produtores da região. "Sem água não há agropecuária. E sem agropecuária não há comida", afirma o pecuarista Flávio Oliveira, do município de São João da Ponte, que também é presidente do comitê da bacia do rio. A região depende da água do Verde Grande e de poços, ligados ao aquífero da região, para a agricultura e pecuária. De tudo o que sai do rio para movimentar atividades econômicas, 90% vão para atividades no campo, segundo o SGB. Os 10% restantes são para abastecimento humano.

Além da retirada da água do rio para atividades econômicas e da mudança no regime de chuvas, que impactam no volume do rio, o SGB passou a desconfiar também de mais um fator para a redução no fluxo do Verde Grande. A suspeita é que o aquífero esteja "roubando" as águas do rio. A região em que o Verde Grande corre é formada por rochas carbonáticas, que são suscetíveis à ação das águas. Com isso, dutos são formados entre o leito do rio e o aquífero –uma espécie de grande reservatório subterrâneo de água.

Com esses dutos, estabelece-se uma relação de troca entre rio e aquífero, com um fornecendo água para o outro. Quando ela vai do rio para o aquífero, a troca se dá via dutos chamados de sumidouros. No caminho inverso, eles são conhecidos como surgências. O sinal amarelo para o que pode estar acontecendo com o rio foi dado ainda antes da crise hídrica de 2013. "Há cerca de dez anos o Verde Grande não secava, era perene", aponta a hidrogeóloga do SGB, Maria Antonieta Mourão.

Na investigação sobre o sumiço das águas do rio, conduzida pelo SGB em parceria com a ANA (Agência Nacional das Águas), o temor é que o aquífero já não esteja contribuindo com o rio, passando somente a ficar com a água do Verde Grande.

Uma explicação para isso seria o uso intenso, também para a agropecuária, de poços que captam a água diretamente no aquífero que, com menos volume, deixa de ter condições de contribuir com o rio. Para tentar confirmar isso, a investigação do SGB e da ANA lançou no Verde Grande um líquido traçante, que não causa impacto ambiental. Ao mesmo tempo, colocou em poços da região uma substância que reage quando em contato com o líquido lançado no rio.

"A intenção é conhecer como é a relação do rio com a seca. Em que momento o rio perde água para o aquífero e em que momento o aquífero está fornecendo água para o rio. Existem várias captações de água subterrânea e essas captações podem estar afetando o rio", diz a hidrogeóloga do SGB, que é vinculado à CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais), do Ministério das Minas e Energia.

O lançamento do traçador ocorreu na sexta-feira (5). A primeira coleta do material colocado nos poços da região acontecerá na próxima sexta (12). Outros dois recolhimentos ocorrerão. Um 35 dias e outro 75 dias depois do lançamento.

O lançamento do traçante ocorreu em trecho do rio que fica entre os municípios de Montes Claros, São João da Ponte, Verdelândia e Jaíba, todos em Minas Gerais O presidente da bacia do Verde Grande afirma que o resultado da investigação feita pelo SGB será decisivo na tomada de decisões futuras sobre políticas para uso das águas do curso d'água. "Estamos trabalhando também na preservação de nascentes na bacia. É obrigatório manter 20% das matas nessas áreas. Muitos produtores deixam mais que isso", diz.