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Aviões militares dos EUA se aproximam da China em meio a tensão diplomática

Igor Gielow / Folhapress | 27/07/20 - 13h25
Brazil Photo Press / Folhapress

Em meio à crise diplomática entre Washington e Pequim, dois aviões militares americanos foram avistados no domingo (26) a menos de 100 km de Xangai, a menor distância registrada nos últimos anos.

Um avião de vigilância eletrônica e guerra antissubmarino P-8A e uma aeronave de reconhecimento EP-3E voaram pelo estreito de Taiwan no domingo, próximo de Zhejiang e Fujian. Foi o 12º dia em sequência em que aviões espiões americanos se aproximam da costa chinesa.

O voo ocorreu na véspera do fechamento do consulado americano em Chengdu, medida retaliatória determinada pelo governo chinês depois de ação igual feita pela administração Donald Trump contra a representação do país em Houston.

Os americanos dizem que o consulado chinês era um centro de espionagem, provavelmente voltado a roubar segredos sobre o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19. A China chamou a acusação de absurda.

A atividade militar na região tem crescido. Segundo o centro Iniciativa de Investigação de Situação Estratégica do Mar do Sul da China, da Universidade de Pequim, o P-8A chegou a 76,5 km da costa chinesa e o EP-3E, a 106 km.

Os aparelhos voaram em coordenação aparente com o USS Rafael Peralta, um destróier na região. Segundo o centro, as operações aeronavais americanas no mar do Sul da China e no estreito de Taiwan estão nos maiores níveis da história recente.

Só neste ano, foram seis operações de liberdade de navegação, nas quais navios de guerra circulam em águas internacionais que a China afirma serem suas -Pequim clama controle de 85% do mar do Sul da China e instalou bases em recifes e ilhas artificiais em toda a região, que tem o tamanho da Índia.

Em todo o ano passado, foram 8 operações, ante 6 em 2018 e 4 em 2017 -quando Trump assumiu e lançou as bases de sua Guerra Fria 2.0 com a China, na forma de disputas comerciais e tecnológicas, mas que agora avançaram para o campo político.

Só neste ano, os países se estranharam sobre a repressão chinesa contra a autonomia de Hong Kong, o manejo da pandemia do novo coronavírus, a presença da chinesa Huawei em redes de 5G no Ocidente e o domínio do mar do Sul da China.

A China considera Taiwan uma ilha rebelde, mas a proteção militar americana tem evitado uma invasão e a anexação da pequena república. Já o mar do Sul da China é a rota por onde passa a maior parte de suas exportações e importações, vitais para a sobrevivência da economia chinesa.

Segundo o centro, só nas três primeiras semanas de julho houve 50 missões de reconhecimento aéreo semelhantes a essa de domingo. Num ano, chega a haver 2.000 operações, com aviões americanos baseados no Japão ou, no caso de missões com bombardeiros, oriundos da base de Guam, no Pacífico.

Em nenhum dos casos houve interceptação por parte de caças chineses, mas, ao menos na quinta (23), um navio chinês transmitiu uma advertência para que o aparelho americano se afastasse, segundo áudio que circulou na mídia do país asiático.

Naquele mesmo dia, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, fez um discurso agressivo conclamando os países do "mundo livre" a escolherem entre "liberdade e tirania" -uma retórica ao estilo da Guerra Fria entre soviéticos e americanos.

Boa parte do barulho promovido por Washington pode ser debitada das dificuldades eleitorais de Trump, que está atrás na corrida com Joe Biden para a eleição de novembro. Mas as divergências estratégicas entre as duas potências seguirão, mesmo que o democrata seja o eleito.

Em entrevista publicada pelo centro nesta segunda (27), o especialista Wu Shicun avalia que nem EUA nem China querem um conflito, mas que o risco de incidentes está aumentando. "As duas partes estão testando as linhas vermelhas do outro lado", afirmou ele, que preside o Instituto Nacional de Estudos do Mar do Sul da China.

"Os navios de guerra americanos estão entrando cada vez mais para descobrir onde é a linha vermelha da China. Temo que as chances de um acidente estejam crescendo", afirmou.

Em 2001, um caça chinês colidiu com um avião espião americano e o piloto morreu. Em 2018, um destróier chinês passou a 41 metros de outro, americano, o que em termos navais é praticamente uma colisão.