Desafios e dificuldades: motoristas de ônibus de Maceió compartilham esperança de um trânsito seguro para todos

Ana Carla Vieira e João Victor Souza | 15/11/21 - 08h00

Os graves acidentes de trânsito ocorridos na capital alagoana em 2021 trouxeram à tona debates sobre a segurança para condutores, passageiros e pedestres em meio à circulação de veículos nas vias públicas. Os incidentes com grande comoção, entre o fim do primeiro semestre e o início do segundo, resultaram em mortes e pessoas feridas. Mas, afinal, qual o transporte mais seguro no trânsito para a população?

De acordo com dados da Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito de Maceió (SMTT), de janeiro até agosto foram registrados 815 acidentes atendidos pelas equipes de trânsito. Destes, a maioria - ou 413 acidentes – foi com carros; 229 acidentes aconteceram com motocicletas e apenas 40 envolveram ônibus. O restante foi com caminhonetes, camionetas, caminhões, ciclomotores, motonetas e utilitários. Como as estatísticas já mostram, o transporte coletivo aparece como opção para quem busca segurança sobre rodas.

No mesmo período de 2020, foram contabilizados 115 acidentes com ônibus e micro-ônibus. Número reduzido em mais de 65% este ano. Para se ter ideia de como o índice de acidentes envolvendo esses veículos de grande porte tem baixado com o passar dos anos, durante 2019 foram registradas 379 ocorrências com ônibus. Grande parte dos acidentes se concentra, rotineiramente, nos principais corredores de transportes de Maceió, a exemplo das Avenidas Durval de Góes Monteiro, Fernandes Lima e Menino Marcelo.

Andar de ônibus, para a maioria dos passageiros, não é opção, mas necessidade. E, por um lado ou outro, as pessoas querem se sentir seguras e se deslocar com tranquilidade.

"Precisamos manter o equilíbrio" - Zilma Batista, é motorista e tem o desejo de inspirar outras mulheres a exercerem a profissão. Com 39 anos de idade e dez anos de enfrentamento do trânsito à frente dos ônibus, ela diz que levar centenas de pessoas ao seu destino diariamente é o maior combustível para seguir firme na carreira. “É saber que é um serviço essencial à população. Vejo-me como uma profissional que aprende todos dias, servindo de referência para muitas outras que gostariam de exercer essa profissão”, afirma a motorista em entrevista ao TNH1.

Zilma Batista  tem 10 anos de profissão e quer ser referência para outras mulheres (Foto: Reprodução/Youtube)

Apesar do tempo que acumula dirigindo ônibus e de se considerar uma profissional experiente e cuidadosa, Zilma destaca que ainda convive frequentemente com o preconceito por ser mulher e minoria no cargo. Mas ela não se deixa abalar. Com o compromisso de oferecer segurança aos usuários no decorrer dos itinerários, a motorista esclarece quais hábitos coloca na rotina.

“A primeira atitude, e a mais importante para manter a segurança, é fazer o checklist do veículo, certificando-se de que está tudo certo antes de sair da empresa. Já estando no trânsito, as piores situações e mais recorrentes são discussão no trânsito e o preconceito por ser motorista feminina. Nesses casos, precisamos manter o equilíbrio emocional e psicológico para que atos não venham prejudicar a segurança de todos”, destaca Zilma.

"Temos que evitar o dano à vida" - O jovem motorista Wagner Calheiros, de 26 anos, diz que apesar da idade já se considera experiente, com seis anos de transporte coletivo. Ele afirma que os condutores são orientados a preservar, em primeiro lugar, os passageiros, e que cumprem a função com grande habilidade técnica.

Apesar de jovem, Wagner Calheiros já adquiriu experiência à frente dos coletivos (Foto: Itawi Albuquerque/TNH1)

“Os motoristas têm a função de levar as pessoas aos seus locais, seja em casa ou no trabalho, com proteção”. A afirmação do motorista apaixonado pelo ofício reforça a dedicação de toda a categoria para que haja um transporte seguro, sem imprevistos desagradáveis. Ao volante, o rodoviário assume a liderança para cumprir os caminhos definidos a cada viagem a que é submetido, seja à noite ou de dia.

“Não é só dirigir, levar o ônibus para a frente, tem que ter a atitude [defensiva]. E, primeiramente, temos que evitar o dano à vida pois danos materiais se reconquistam. Mas a rotina é essa, transportar os passageiros com segurança e levá-los na maior da tranquilidade, evitando problemas”, destaca Wagner.

Transporte coletivo pode ser considerado seguro (Foto: Itawi Albuquerque/TNH1)

Cursos qualificam rodoviários e ajudam a prevenir acidentes – Uma das justificativas para que haja a diminuição de colisões com ônibus é a capacitação dos motoristas. Em Maceió, as empresas de transporte coletivo em parceria com o Sest/Senat oferecem aos profissionais cursos de direção. Segundo o Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros do Município de Maceió (Sinturb), todos os rodoviários passam por qualificações periódicas sobre direção defensiva, percepção de riscos e cuidados no trânsito, além de cursos sobre qualidade no atendimento. “Tornar o trânsito mais seguro para todos é uma prioridade para as empresas de ônibus”, garante Guilherme Borges, presidente do Sinturb.

O Sindicato destacou também que são abordados vários eixos em diferentes períodos do ano. “O objetivo é sempre oferecer treinamentos que aprimorem conceitos e métodos de direção defensiva, com o objetivo de proteger e prevenir riscos e danos à vida e à saúde dos trabalhadores, dentro e fora do ambiente de trabalho. Alguns dos enfoques são direção defensiva, direção preventiva, percepção de riscos, educação no trânsito e gestão de pneus, por exemplo. Todas essas temáticas deságuam na prevenção de acidentes e em um comportamento seguro no trânsito. São mais de 120 cursos específicos para o setor de transporte”, diz Borges.

Além dos treinamentos realizados em parceria com o Sest/Senat, as empresas têm compromisso com os trabalhadores para fornecer apoio com instrutores e capacitá-los para uma melhor direção em trânsito. “Cada empresa possui seus próprios instrutores, em várias áreas do conhecimento, que fazem um acompanhamento diário com os motoristas, em especial os que passarem por situações adversas. Complementarmente, os departamentos de Recursos Humanos também são orientados a trabalhar em conjunto com os rodoviários, para fornecer o suporte necessário aos colaboradores”, explica Guilherme Borges.

Com profissionais qualificados, usuários do transporte coletivo se sentem mais seguros (Foto: Itawi Albuquerque/TNH1)

O motorista Wagner Calheiros destaca que os cursos ajudam na construção do profissional e devem ser aproveitados para a prestação do serviço de excelência ao usuário do transporte. “Eles são importantes desde o momento em que a gente senta na nossa cadeira até o fim da jornada”, afirma.

Já Zilma salienta que todos os condutores devem passar por uma “reciclagem”, tanto com conteúdo teórico quanto prático. “É muito importante sim, porque neles são abordados vários temas, dentre eles direção defensiva, onde você recicla o seu conhecimento evitando acidente de trânsito, e o atendimento aos usuários, principalmente com os deficientes físicos e especiais. Até mesmo sobre o preconceito também é sempre abordado nos cursos”.

Mais veículos, mais imprudências - Apesar dos cursos de qualificação, os contratempos no trânsito só aumentam com o passar dos anos. Mesmo capacitados, os responsáveis por governar os coletivos têm que enfrentar a má condução recorrente de motoristas guiando carros, motos e outros veículos. “Houve o aumento de veículos no trânsito e consequentemente muitos condutores despreparados, tanto na prática como na parte psicológica. Isso tornou o trânsito mais perigoso. Graças a Deus, nunca sofri um acidente! Por incrível que pareça, em 10 anos de profissão não tenho nenhum acidente de trânsito”, destacou Zilma.

Wagner também comemora não ter registro de envolvimento com acidentes no currículo. O condutor também chamou atenção para o modo de pilotagem de motociclistas de hoje em dia, que segundo ele, se arriscam mais entre os ônibus e colocam os rodoviários em alerta. “Uma coisa que reparei no trânsito foi que, anos atrás, os motociclistas, não todos, usavam a mão entre um carro e outro, a terceira faixa e a segunda. Já hoje, não. Eles andam entre o ônibus e outro carro e é muito perigoso. No ônibus há um ponto cego e há a dificuldade de sair de um local ou fazer uma ultrapassagem de algo que está parado na frente. Assim são alguns motoristas dos carros também, que jogam o veículo na nossa frente e obrigam a gente a fazer uma frenagem brusca. O freio do ônibus não é igual ao de um carro. Existe um equipamento que se usa que daqui que tenha consistência para frear, ele anda alguns centímetros à frente. E é nesse tempo, nessa distância, que pode ocorrer uma colisão. Tem gente que acha que freia de uma vez e o ônibus já para, e não é bem assim”, ressalta.

“Graças a Deus nunca me envolvi em acidente, até porque ando com segurança e atenção. Acredito que todos são assim, trabalham para poder evitar os acidentes. Quando acontece um fato desse num dia de trabalho é a pior coisa que tem. Mas já evitei muitos acidentes. Teve uma situação em que eu estava na Rua Durval Guimarães, na Ponta Verde, e ia em baixa rotação, acho que 50 km/h no máximo. E aí um motociclista atravessava a via distraído com o telefone e não percebeu o ônibus se aproximando. Eu tive que frear e buzinar para chamar a atenção. Ele só percebeu quando eu estava muito perto”, prossegue o motorista.

Desafios diários, atenção a cada jornada - Orgulhoso do empenho nas ruas, Wagner assegura que os motoristas de ônibus estão preparados para encarar quaisquer adversidades, mas também expôs que a displicência e a direção perigosa de condutores, em sua maioria de veículos de pequeno porte, exigem uma atenção em dobro dos profissionais.

“Uma vez, uma van estava quebrada na faixa azul e eu tive que ultrapassar, passar pela faixa do meio para depois voltar para a faixa azul. Quando ia passando, um outro carro queimou o sinal e avançou. Quase houve a batida. Eu brequei o ônibus porque percebi que ele ousou sair antes do sinal ficar verde. Mas graças a Deus, ninguém ficou ferido nessas situações”, relembra.

“Dá para você evitar, dá para prever a conduta dos motoristas e motociclistas, mas há situações que não dá, porque tudo é em questão de segundos”, diz. “Eu posso afirmar que a maioria das colisões é causada por uso de telefone, falta de atenção. Às vezes estou dirigindo, olho para o lado e vejo os condutores no celular. Eles atrapalham o trânsito, não deixam fluir. Aí às vezes o sinal abre e eles ficam parados, os outros motoristas buzinando, e quando vejo estão no telefone. Vejo bastante isso e algumas vezes tenho que alertá-los, para ter ciência do que está fazendo”, continua.

“O veículo é uma arma, a pessoa tem que ter maturidade, entender que aquilo ali pode causar danos. Não é cabível para um motorista que tirou a carteira de habilitação, que passou por todos os processos, chegar a um ponto de dirigir de forma imprudente no trânsito”, finaliza.