Polícia

Dezesseis pessoas foram mortas em Alagoas por linchamento em 2020

João Victor Souza | 21/08/20 - 10h04

O linchamento de Rafael dos Santos Pereira, 24 anos, suspeito de estuprar e matar uma adolescente em Maceió, trouxe novamente a discussão sobre o crime de justiçamento, quando a população agride um infrator como forma de fazer justiça com as próprias mãos. Em Alagoas, o número de mortos por linchamento, quando a agressão acaba em morte, em 2020, em apenas oito meses, já superou as estatísticas dos anos anteriores. 

A presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/AL, Anne Caroline Fidelis de Lima, revelou ao TNH1 que, de janeiro deste ano até hoje, 68 casos de justiçamento foram registrados pela entidade, e desses, 16 pessoas terminaram em morte.

O registro de vítimas mortas esse ano já é maior em relação aos números anuais de desde 2014, já que em 2017 e 2019 eram os anos com mais óbitos, 15 cada. A comissão destaca que os dados foram obtidos através de acompanhamento baseado nos casos divulgados pela imprensa. (Veja detalhes abaixo)

"É dever do Estado investigar e punir sempre na medida e na proporção do crime praticado, e conforme previsão legal. Ao passo em que cenários como esse, de justiça com as próprias mãos, além de não possibilitar efetivamente o cumprimento da lei e principalmente o exercício da defesa, muitas vezes são circunstâncias onde são praticadas verdadeiramente situações de injustiça", destacou Anne Caroline.

Em um vídeo gravado para a reportagem, a presidente da CDH também afirmou que a atitude da população nesses casos acontece por "descrédito" na Justiça. Para ela, a busca é por um cenário de pacificação e de atuação efetiva dos estados.

"Considero que, em regra, as pessoas acabam praticando este tipo de conduta justamente por sensação de descrédito em relação à Justiça que deve ser promovida pelo Estado. É importante pensarmos tanto na conscientização da população como também que o Estado adote políticas públicas para essas situações não aconteçam".

Assista:

Dados

De 2014 a 2019, o número de casos de justiçamento havia triplicado no Estado. De 38 registros, com oito óbitos, os crimes saltaram para 123 em cinco anos, com um número maior de mortes também.

Detalhadamente, as estatísticas mostram que houve 38 casos de justiçamentos com oito óbitos em 2014, 36 casos com três mortes em 2015, 35 justiçamentos com seis óbitos em 2016, 81 casos com 15 mortes em 2017, 116 registros com 13 óbitos em 2018, e 123 justiçamentos com 15 óbitos em 2019.

Neste ano, com 68 casos e 16 óbitos, o cenário é de maior número de mortos e os casos já correspondem a mais da metade em relação ao ano anterior, sendo que ainda faltam quatro meses para o fim de 2020.

O caso

Rafael dos Santos Pereira é suspeito de assassinar, depois de ter violentado sexualmente, uma jovem de 13 anos nas proximidades do Parque dos Caetés, no Benedito Bentes. O corpo da menina foi encontrado na manhã do último dia 20, com sinais de estupro, marcas de esganadura no pescoço e ferimento no olho esquerdo.

Logo após o achado do cadáver, a população teria se juntado e, acreditando que Rafael foi o responsável pelos crimes, dado início a uma sessão de apedrejamento contra o suspeito. Os primeiros levantamentos da perícia mostraram que ele sofreu múltiplos traumatismos na cabeça em decorrência das pedradas que levou. 

Um exame realizado pelo Instituto Médico Legal (IML) com o material genético das vítimas pode confirmar se a adolescente foi estuprada ou não por Rafael. O órgão informou à reportagem que não vai dar detalhes sobre o procedimento para não atrapalhar as investigações da Polícia Civil.

Até o momento, a polícia não confirmou nenhuma prisão de envolvido na morte de Rafael. Os dois crimes serão investigados pela Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).