Dia Internacional da Mulher: o 8 de Março é dia de celebração ou protesto?

Publicado em 07/03/2025, às 09h55
Imagem Dia Internacional da Mulher: o 8 de Março é dia de celebração ou protesto?

Por Por Gabriel Galhós especial para o TNH1

Em 8 de março de 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) oficializou o Dia Internacional da Mulher, reconhecendo uma luta que vinha de décadas anteriores. No entanto, ao longo dos anos, a data vem sendo esvaziada de seu caráter combativo e transformada, muitas vezes, em uma oportunidade comercial. Entre flores e descontos em salões de beleza, onde está a essência da luta feminina?

Para Ana Pereira, ativista do Instituto Jarede Viana e da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, o problema não é apenas a apropriação comercial da data, mas também a fragilização do movimento pelas estruturas de poder. “As trincheiras de luta são substituídas por flores. As pautas de reivindicação são esvaziadas por falsas promessas de gestão”, afirma. Ela destaca que em Alagoas, apesar da criação do Fundo de Políticas e Enfrentamento à Violência contra as Mulheres em 2018, o investimento permanece irrisório: R$ 50 mil até 2024. “Isso também é uma tática de fragilização do movimento”, alerta.

A situação em Alagoas reflete um contexto histórico mais amplo. O movimento no nordeste carrega marcas próprias, frequentemente invisibilizadas pelo debate nacional. Em um estado onde 55% das famílias vivem na linha da pobreza, mulheres enfrentam dificuldades para acessar educação, saúde e emprego. Para Ana, a solução está na educação e na comunicação como ferramentas de sensibilização e informação. “Uma sociedade construída junto com as mulheres certamente será mais inclusiva, respeitosa e menos violenta”, reforça.

Novos desafios, velhas ameaças

A luta por direitos femininos é histórica, mas também enfrenta novos desafios. O crescimento de discursos que tentam descredibilizar o movimento coloca em risco conquistas obtidas com muito esforço. “O mercado se apropria das datas de resistência como estratégia comercial. Sem consciência de classe, sem teoria e prática, o movimento perde força”, alerta Ana.

Se o 8 de março é um marco de luta, por que tantas mulheres ainda não têm o que celebrar? Ribeirinhas, quilombolas, indígenas, ciganas, marisqueiras, trabalhadoras rurais, mulheres LGBTQIA+ — todas vivem uma realidade onde os direitos ainda são negados. “A democracia não chegou para nós”, enfatiza a ativista. A ausência de moradia digna, acesso a água potável e segurança evidencia que a violência contra a mulher vai além da esfera doméstica; é também uma violência estrutural e estatal.

Os desafios no mercado de trabalho

A advogada Júlia Nunes, especialista em direito da mulher, reforça que a desigualdade não se limita a questões econômicas, mas também permeia o ambiente de trabalho. Enquanto muitas empresas distribuem brindes e flores no Dia Internacional da Mulher, as mesmas funcionárias seguem enfrentando assédio, desigualdade salarial e desvalorização. “Mais do que homenagear, é necessário que as empresas promovam campanhas de conscientização e penalizem os agressores”, afirma Júlia. A realidade, segundo ela, é que de acordo com pesquisas, a capacidade laboral de mulheres vítimas de violência pode ser reduzida em até 70%, um reflexo do impacto brutal da violência de gênero na sociedade.

Alagoas e a escalada da violência

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 colocou Alagoas na terceira posição entre os estados com maior índice de violência contra a mulher. Diante desse cenário, a delegada Ana Luiza, atuante na Delegacia da Mulher, enfatiza que ainda há muito a ser feito em termos de políticas públicas. “O Plano Nacional de Prevenção aos Feminicídios, com 73 medidas, é um passo importante. Estudos mostram que cidades com delegacias especializadas têm uma redução de até 17% nos casos de morte de mulheres. Precisamos investir em prevenção”, explica.

Apesar da existência de delegacias especializadas, o atendimento às vítimas ainda encontra entraves. A dificuldade de denunciar é um obstáculo para muitas mulheres, seja pela burocracia ou pelo medo de retaliação. A delegada destaca a importância do acolhimento humanizado: “Treinamos nossos policiais continuamente para evitar estereótipos e preconceitos de gênero. Pela primeira vez, incluímos uma disciplina sobre investigação de crimes contra mulheres no curso de formação de novos delegados”.

O 8 de março, portanto, deve ser um chamado à luta e à reflexão. A celebração das conquistas femininas não pode apagar as desigualdades que ainda persistem. Como alerta Ana Pereira, “A coragem e a luta organizada das mulheres podem moldar o curso da história e construir um mundo mais justo e igualitário. É necessário continuar a resistir, mesmo em meio às adversidades”.

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