Futebol Nacional

Flamengo diz que ofereceu indenizações que seriam o dobro de casos parecidos

24/02/19 - 21h29
FramePhoto/Folhapress

Dezessete dias após a tragédia que vitimou 10 jogadores da base do Flamengo e deixou outros três feridos em um incêndio no Ninho do Urubu, centro de treinamento em Vargem Grande, zona oeste o Rio, o presidente do clube, Rodolfo Landim, concedeu sua primeira entrevista coletiva sobre o assunto. Até então ele não tinha se colocado à disposição para questionamentos públicos sobre o caso.

O dirigente disse que o clube está negociando individualmente com as famílias o valor das indenizações. Na semana passada, rejeitou proposta de acordo coletivo sugerida pela Defensoria Pública, Ministério Público e Ministério Público do Trabalho.

O Flamengo diz calcular o valor com base em "jurisprudência do STJ (Superior Tribunal de Justiça)", apesar de reconhecer que a tragédia seria sem precedentes na história. O clube não explicou que jurisprudência seria essa.

Também na semana passada, as famílias divulgaram que o clube ofereceu uma indenização entre R$ 300 e R$ 400 mil por vítima, mais um salário mínimo mensal pelo período de 10 anos.

Já a Defensoria Pública e o Ministério Público sugeriram indenização de R$ 2 milhões por vítima, além de um salário de R$ 10 mil por mês por 30 anos.

O clube alegou ter negado a proposta da Justiça porque tem o desejo de negociar as indenizações individualmente com as famílias das vítimas, embora as próprias famílias tenham manifestado o interesse de que os pagamentos fossem negociados coletivamente.

Existe o temor de que uma negociação individualizada possa levar a valores muito discrepantes para cada vítima. O resultado que as famílias tentam evitar é que parentes de jogadores que tinham possibilidades maiores na carreira recebam mais do que outros de potencial inferior.

"Tudo está sendo feito com enorme respeito e consideração com as famílias. Somos uma instituição de 123 anos que precisa ser respeitada. O Flamengo entende que deve conversar com cada família individualmente e não abrimos mão disso", disse Landim.

Landim insistiu nas negociações individualizadas e chegou a criticar que ao menos duas famílias estejam neste momento sendo orientadas por advogados privados e não pela Defensoria Pública.

Landim precisou ser lembrado por jornalistas que esse é um direito das famílias que perderam seus filhos no incêndio para reconhecer a legitimidade da opção.

Na última sexta-feira, uma tentativa de mediação judicial entre famílias e Flamengo terminou sem acordo no Tribunal de Justiça do Rio. Segundo parentes das vítimas, o Flamengo se negou a pagar o pedido e seus representantes com poder de decisão deixaram a reunião no meio.

"Durante essa reunião, houve a participação muito forte de duas advogadas, que conseguiram criar um clima dentro desse grupo", justificou Landim.

O presidente rebateu também críticas sobre a maneira como o Flamengo esta conduzindo a questão. Nas redes, torcedores já questionam a demora para o pagamento das indenizações. Um jornalista de um veículo especializado no clube perguntou o que faltaria para "essa página ser virada".

"A nação rubro-negra não tem com que se preocupar. O Flamengo está fazendo um trabalho exemplar", disse Landim.

Sem revelar valores ou confirmar informações publicadas na imprensa, o advogado contratado pelo Flamengo para o caso, Álvaro Piquet, insistiu que o valor oferecido pelo clube é o dobro da "jurisprudência conhecida" para casos desse tipo no STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Sem dar detalhes ele disse que estudou diversos casos semelhantes para se chegar aos valores oferecidos, mas reconheceu "que não existe fórmula matemática" para o cálculo das indenizações.

"Eu posso ter uma família que vai me pedir para pagar a educação do filho mais novo da vítima ou outra que vai pedir que a gente compre uma casa. As informações que têm sido veiculadas sobre os valores oferecidos pelo clube não são a exata realidade do que aconteceu. O que oferecemos foi substancialmente mais alto do que a jurisprudência", disse.

Jornalistas insistiram para o advogado dar exemplos de jurisprudência, ao que ele se negou. Ele disse, também sem dar detalhes, que um dos casos avaliados como exemplo seria a morte de uma criança em uma escolinha de futebol em um clube brasileiro.

O advogado não mencionou, contudo, o fato de que o plano inicial do clube para os jovens era negociar suas vendas no mercado milionário do futebol. Em 2017, por exemplo, o atacante Vinícius Júnior, à época com 17 anos, foi negociado com o Real Madrid por R$ 164 milhões.

Piquet também não explicou qual era o vínculo empregatício dos menores vítimas do incêndio com o Flamengo. Inicialmente o Flamengo chegou a comparar o incêndio no Ninho do Urubu ao da Boate Kiss, como forma de mostrar que o caso no Rio seria de menores proporções que os da boate.

Essa linha foi afastada depois que a reação à comparação foi muito dura, já que no caso da boate não havia menores de idade em situação laboral, sem escolha sobre sua condição de moradia. As pessoas que estavam por vontade própria na boate, com o propósito de diversão, caso que difere em muito do incêndio no centro de treinamento.

Em novembro de 2015, por exemplo, por ocasião da morte de dois operários nas obras da Arena Corinthians, o clube paulista aceitou pagar, em acordo extrajudicial, R$ 3 milhões para cada família a título de indenização.

Durante a coletiva, em mais de uma ocasião os dirigentes frisaram que o caso do Flamengo foi um acidente, uma fatalidade.

"A indicação que me foi passada é que a gente busque as necessidades de cada família para o cálculo dessa indenização", disse o advogado.

Questionado sobre a informação prestada pelo Ministério Público do Trabalho de que os valores de R$ 2 milhões por jogador sugeridos seriam uma espécie de piso para futuras negociações individuais, ele tergiversou.

Disse apenas que se surpreendeu com a divulgação dos valores porque seu interesse seria proteger o "sigilo, o respeito e a segurança das famílias".