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Grupos antiditadura pulverizam protestos para driblar repressão na Belarus

Ana Estela Sousa Pinto/Folhapress | 13/09/20 - 18h23
Unsplash/Divulgação

Apesar do grande número de tropas que cercam o centro de Minsk neste domingo, bielorrussos que protestam contra a ditadura desafiam as proibições e tentam se juntar para uma marcha, no 36º seguido de manifestações na Belarus.

Com o aumento da repressão aos atos (que, na ditadura bielorrussa, precisam ser autorizados pelo regime), os manifestantes pulverizaram protestos pela cidade, segundo relatos feitos à Folha por telefone e rede social.

Na capital e em cidades grandes, em que são comuns grandes quadras de prédios de apartamentos em volta de jardim e pátio interno, vizinhos passaram a se encontrar nos finais de semana e à noite desde que a repressão dificultou os protestos na rua.

Nas janelas internas há campanhas inusitadas, como pendurar de forma alternada peças de roupa vermelha e branca –uma foto com três calcinhas formando a bandeira antiditadura viralizou nas redes sociais.

Brinquedos dos parquinhos, cercas e bancos de jardim são pintados de branco e vermelho (cores da bandeira histórica, que virou símbolo da oposição à ditadura.

No bloco de Sônia (que preferiu não dizer o sobrenome), em um bairro de Minsk, fitas brancas e vermelhas foram amarradas por toda a extensão do jardim interno.

Cartazes com críticas ao ditador Aleksandr Lukachenko e frases de apoio aos manifestantes também são comuns. "Nosso movimento não tem líderes. Nós somos a rua", e "Três cabeças surgirão a cada cabeça cortada" são algumas delas.

Carros antigos são decorados com as cores do protesto e se transformam em "animais ambulantes", representando dragões, dinossauros e outros bichos.

Em várias partes da cidade, mulheres se reuniram para varrer em conjunto o pátio interno antes de saírem para a marcha feminina, que ocorre todos os sábados desde a eleição de 9 de agosto.

Como a repressão cercou vários pontos de acesso ao centro da cidade, elas trocaram informações por redes sociais sobre onde estavam as tropas de choque e quais os percursos alternativos. O mesmo recurso está sendo usado neste domingo.

A violência crescente do governo contra as mulheres começou a provocar reações femininas. Em alguns pontos, elas arrancaram máscaras dos policiais e investiram contra eles para tentar impedir que manifestantes fossem arrastadas para dentro dos camburões.

Uma das figuras mais ativas nessa luta contra as detenções é a ativista Nina Bahinskaia, 73, que ficou conhecida como a "bisavó dos protestos".

Apesar das reações, foram detidas 114 pessoas (99 na capital), segundo o governo.

Algumas manifestantes trocaram flores e fitas por panelas e frigideiras. "Quanto mais eles tentarem nos calar, mais barulho faremos", disse Sônia.

As manifestantes também pediam a libertação de Maria Kalesnikava, líder da oposição detida desde 8 de setembro, quando frustrou uma tentativa da ditadura de tirá-la à força do país.

Ao menos dois jornalistas, da TV Belsat, foram detidos no sábado. Desde o começo dos protestos, policiais têm levado repórteres mesmo que eles estejam credenciados e identificados.

À noite, um grupo de hackers soltou um comunicado ameaçando invadir o sistema da Receita da Belarus se houvesse repressão no domingo.

"Se pelo menos um manifestante for detido em 13 de setembro de 2020, a Belarus vai esquecer o que são os impostos até que as prisões parem e Lukashenka deixe seu posto", disse o comunicado.

Na semana passada, hackers invadiram o site do Ministério do Interior, responsável pela segurança no país, e estamparam mensagens de apoio aos oposicionistas.

No novo comunicado, prometeram uma resposta "dolorosa" ao governo: "Primeiro vai cair o sistema tributário, depois vai acabar a eletricidade no país, depois vai cair o sistema bancário".

Eles também exigiram que Lukachenko pedisse desculpas pessoalmente, por alto-falante, à população do país.

Em entrevista publicada pelo jornal britânico Financial Times, o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, disse que o bloco está "engolfado pelas chamas, da Líbia à Belarus". Segundo ele, as sanções a responsáveis por fraude eleitoral e repressão violenta no país vizinho devem ser decididas até o dia 21.

A inclusão de Lukashenko na lista dos punidos, no entanto, ainda não está definida, segundo ele.

Nesta segunda, o ditador bielorrusso deve se reunir em Moscou com o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Lukachenko quer que o governo russo o ajude a acabar com os protestos, o pode lhe custar maior dependência e integração aos planos de Putin.