Eberval Gadelha Figueiredo, professor de neurocirurgia na Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Serviço de Neurocirurgia do Hospital das Clínicas, explica que, ao contrário de uma craniotomia, não há remoção de parte do osso e a região afetada é acessada por um pequeno orifício no crânio, de cerca de 0,5 cm a 0,8 cm. A operação recebe esse nome justamente porque é realizada com o uso de uma broca cirúrgica ou de um aparelho chamado 'broca de trépano'.
O professor conta que a cirurgia é bastante conhecida e remonta ao Antigo Egito. 'Se acreditava antigamente que, se fizesse uma trepanação, ou seja, um orifício no cérebro, os maus espíritos sairiam do cérebro, da cabeça dos pacientes, e assim eles seriam curados de doenças mentais ou epilepsia, por exemplo.'
Em casos de hemorragia intracraniana, como ocorreu com Lula, a técnica é usada para aliviar a pressão intracraniana, drenando o sangue acumulado. 'Isso visa evitar danos cerebrais adicionais, estabilizar o quadro clínico do paciente e prevenir complicações graves, como a herniação cerebral', explica Bruna Proença, neurologista do Hospital Nove de Julho.
Além de casos de hemorragia intracraniana, como hematomas subdurais agudos ou crônicos, o procedimento é indicado em situações de pressão intracraniana elevada ou no tratamento de complicações pós-operatórias em procedimentos neurológicos.
Na prática, a trepanação ocorre da seguinte forma: o paciente é anestesiado, o cirurgião faz uma incisão no couro cabeludo e o osso do crânio é perfurado com uma broca. Assim, o cirurgião trata a área afetada do cérebro, o que pode envolver a remoção do sangue acumulado ou de um coágulo. Após o procedimento, o local é fechado.
Embora a trepanação seja considerada um procedimento seguro, algumas complicações podem surgir. Os médicos citam infecções no local da perfuração ou no espaço cerebral, volta do sangramento ou hematoma, lesões cerebrais devido à pressão ou ao próprio procedimento.
As sequelas podem incluir ainda comprometimento neurológico, como problemas de memória, dificuldades cognitivas, mudanças de humor ou fraqueza motora, dependendo da gravidade da hemorragia e da resposta ao procedimento.
'A recuperação é muito rápida', diz Figueiredo. 'Em geral, são anestesias breves. O procedimento dura muito pouco tempo e, dentre os procedimentos neurocirúrgicos que fazemos, é um dos mais simples', completa.
Depois do procedimento, o paciente é acompanhado por alguns dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Por volta do terceiro ou quarto dia de internação, ele pode receber alta hospitalar para continuar o acompanhamento de forma ambulatorial, explica Wuilker Knoner Campos, presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN).
A recuperação total, com reabilitação em casa, leva entre semanas e meses, com o paciente devendo retornar ao hospital uma vez por mês para realizar tomografia. O tempo depende do motivo da cirurgia e da saúde do paciente.
Fatores como idade, condições clínicas e uso de medicamentos podem afetar significativamente a recuperação, assim como problemas como hipertensão, diabetes e doenças que comprometem a coagulação, como hemofilia.
Pacientes que tomam anticoagulantes (como varfarina ou rivaroxabana) ou antiagregantes (como aspirina e clopidogrel) têm maior risco de retorno do sangramento e de precisar de uma nova intervenção. Pessoas com histórico de alcoolismo também apresentam maior risco de complicações e pior prognóstico.
Após o procedimento, os pacientes devem evitar atividades intensas e seguir as orientações médicas rigorosamente. Isso inclui tomar medicamentos prescritos, comparecer a consultas de acompanhamento e, com frequência, realizar sessões de fisioterapia ou terapia ocupacional."