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Para conter crise demográfica, China autorizará 3 filhos por família

Folhapress | 31/05/21 - 22h10
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A China anunciou nesta segunda (31) que vai autorizar a cada casal ter até três filhos, acabando com o limite de dois ainda em vigor. A decisão foi tomada poucas semanas após a divulgação dos resultados do último censo, que apontou expressiva queda da taxa de natalidade no país mais populoso do mundo.

"Em resposta ao envelhecimento da população (...) os casais serão autorizados a ter três filhos", informou a agência estatal Xinhua, ao relatar as conclusões de uma reunião do gabinete político do Partido Comunista comandada pelo líder Xi Jinping.

Xi disse que a mudança será acompanhada por "medidas de apoio conduzidas para melhorar a estrutura populacional do país, alcançando a estratégia de lidar ativamente com uma população em envelhecimento". Entre as medidas, citou a redução dos custos de educação, o aumento do financiamento habitacional, a garantia dos interesses legais de mulheres que trabalham e a repressão aos dotes "estratosféricos". Afirmou ainda que o país vai educar os jovens "para o casamento e o amor".

Até o ano passado, quem tinha um terceiro filho precisava pagar uma multa de 130 mil yuans (R$ 106,5 mil), de acordo com uma advertência governamental na cidade de Weihai.

No dia 11 de maio, os resultados do censo realizado em 2020 revelaram um envelhecimento mais rápido que o esperado da população chinesa e o menor crescimento populacional em décadas. A China continental tinha 1,411 bilhão de habitantes em 2020, 72 milhões a mais do que em 2010. O crescimento anual médio entre 2011 e 2020, entretanto, foi de 0,53%, o menor ao menos desde a década de 1950. Na década anterior (2001-2010), essa taxa havia sido de 0,57%.

Os dados mostraram uma taxa de fecundidade de 1,3 filho por mulher em 2020, em sintonia com sociedades em processo de envelhecimento, como Japão e Itália. No ano passado, marcado pela pandemia de Covid, o número de nascimentos no país caiu a 12 milhões, contra 14,65 milhões em 2019.

A taxa de natalidade em 2019 (10,48 por 1.000) já estava no menor nível desde a fundação da China comunista, em 1949. Assim, em 2016, depois de mais de três décadas da "política do filho único", a China flexibilizou as regras e permitiu o segundo filho.

Mas a nova política não foi suficiente para estimular a taxa de natalidade, em queda livre devido a vários motivos, incluindo a redução no número de casamentos, o aumento do custo da moradia e da educação e, também, a decisão das mulheres de adiar os planos de gravidez para privilegiar a carreira profissional.

Estudo publicado neste ano por cientistas da Universidade de Hangzhou mostrou que a política de dois filhos encorajou casais ricos e foi "menos sensível à carga financeira de criar uma criança", levando a um aumento nos custos com educação e cuidados infantis e desencorajando pais de primeira viagem.

"As pessoas estão se contendo não por causa do limite de dois filhos, mas pelos custos incrivelmente altos de criar uma criança na China de hoje. Moradia, atividades extracurriculares, comida, viagens e tudo mais", afirma Yifei Li, sociólogo da universidade de Xangai, à Reuters. "Aumentar o limite somente não deve mudar os planos de ninguém, na minha visão."

A Xinhua fez uma enquete na rede social Weibo, questionando se a população estava pronta para a política dos três filhos. Cerca de 29 mil dos 31 mil que responderam afirmaram que "nunca pensariam nisso". O restante escolheu as opções "estou pronto e querendo muito isso", "está nos meus planos" ou "estou na dúvida e há muito a considerar". A pesquisa foi posteriormente removida. "Estou pronto para ter três filhos se você me der 5 milhões de yuans [o equivalente a R$ 4 milhões]", postou um usuário.

No outro extremo da pirâmide, o censo mostrou que a China tinha mais de 264 milhões de pessoas com mais de 60 anos em 2020. O grupo de pessoas com mais de 60 anos constitui agora 18,7% do total da população, um aumento de 5,44 pontos percentuais na comparação com o levantamento de 2010.

Do outro lado, a população em idade ativa (15 a 59 anos) representa 63,35% do total, uma queda de 6,79 pontos na comparação com a década anterior. Demógrafos advertiram que o país pode registrar o mesmo fenômeno de Japão e Coreia do Sul, com excesso de idosos em comparação à população jovem e ativa no mercado de trabalho, uma preocupação que levou o Parlamento chinês, em março, a aprovar um plano para aumentar progressivamente a idade de aposentadoria durante os próximos cinco anos.

"Este é, sem dúvida, um passo na direção certa, mas ainda um pouco tímido", diz Shuang Ding, economista chefe do banco Standard Chartered em Hong Kong. "Uma política de natalidade totalmente livre deveria ter sido implementada ao menos cinco anos atrás, mas é tarde demais agora, apesar de ser melhor tarde do que nunca.

Política do filho único impediu nascimento de 400 milhões

No começo dos anos 1950, a China tinha cerca de 540 milhões de habitantes e, em menos de 30 anos, dobrou a população, atingindo 1 bilhão no começo da década de 1980.

Em seguida, com uma política rígida de controle de natalidade, que permitia apenas um filho por casal em muitos casos, o crescimento populacional foi contido. Estima-se que a medida tenha impedido o nascimento de cerca de 400 milhões de pessoas desde sua aplicação, a partir de 1979.

Casais que descumpriam as restrições estavam sujeitos a penas como pagamento de multas e perda de emprego, e havia denúncias de medidas mais duras, como esterilizações e abortos forçados.

Em 2015, o regime suspendeu a política do filho único e passou a estimular que cada família tenha dois filhos. A decisão, porém, não aumentou a taxa de natalidade, o que levou a pedidos do fim do limite de duas crianças por família. A meta estabelecida em 2016 era superar 1,42 bilhão de habitantes em 2020.

Pelos dados do último censo, a China conseguiu atenuar o desequilíbrio entre sexos induzido pela preferência tradicional por meninos e que, às vezes, leva à eliminação de fetos do sexo feminino. Assim, o país registrou o nascimento de 111,3 meninos para cada 100 meninas, uma proporção em queda de 6,8 pontos percentuais na comparação com 2010.