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Perguntas e respostas sobre o decreto de Bolsonaro

Folhapress | 15/01/19 - 13h20
Bolsonaro | Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou nesta terça (15) decreto que facilitou o acesso às armas pela população. A medida é uma bandeira antiga de Bolsonaro e foi reforçada durante sua campanha à Presidência. 
As alterações feitas se referem ao decreto que regulamenta o Estatuto do Desarmamento, lei federal aprovada em dezembro de 2003 que restringe a posse e o porte de armas no país. Como ressaltou o presidente durante discurso, a medida assinada nesta terça não muda essa lei, visto que alterações no estatuto precisam obrigatoriamente passar pelo Congresso.
O texto, portanto, modifica outro decreto, de 2004, que regulamenta o registro, a posse e a comercialização de armas de fogo e munição. 
Abaixo, entenda o que muda a partir do decreto de Bolsonaro, que passa a valer desde já.
 
Qual a principal mudança trazida pelo decreto?
O Estatuto do Desarmamento estabelece que é preciso comprovar a efetiva necessidade da arma para que a posse seja autorizada. Antes, cabia à Polícia Federal avaliar se o requerente do registro realmente tinha necessidade de ter uma arma. Agora, o governo federal estabeleceu que é considerado que há necessidade efetiva em uma lista de situações. Vale destacar duas delas: 1) residentes de áreas urbanas de estados com índice de homicídios maior de 10 por 100 mil habitantes no Atlas da Violência de 2018 (que traz dados de 2016). A unidade da federação com menor taxa é São Paulo (10,9), mas ainda assim é superior ao limite estabelecido pelo decreto; 2) Residentes de áreas rurais.
Portanto, na prática, o decreto considera que todas as pessoas do país têm necessidade de ter uma arma.

Isso significa que qualquer um pode ter uma arma?
Não. Ainda é preciso cumprir os requisitos estabelecidos no Estatuto do Desarmamento: ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal e comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento.

Há alguma mudança em relação ao porte de armas? 
Não. O decreto dispõe apenas sobre a posse. O porte, ou seja, a autorização para a transportar e carregar a arma consigo, fora de casa ou do local de trabalho, continua proibido. As exceções são membros das Forças Armadas, polícias, guardas, agentes penitenciários, empresas de segurança privada, entre outros. Para obtê-lo é preciso demonstrar a necessidade do porte por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física. 

O tempo de revisão da autorização da posse mudou?
Sim. Antes, era preciso renovar a posse a cada cinco anos. Agora, será necessário fazer isso a cada dez anos. Isso também vale para quem já tinha arma regularizada antes do decreto. A renovação será feita junto ao Comando do Exército, e não mais com a Polícia Federal.

Há um limite de quantas armas uma pessoa pode ter?
O decreto estabelece que é possível ter até quatro armas. Contudo, a pessoa pode requerer o registro de mais armas, desde que comprove que tem necessidade. No discurso logo após a assinatura, Bolsonaro se referiu brevemente a pessoas com diversas propriedades como uma das possíveis circunstâncias em que seria permitido ter mais de quatro armas -"titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais ou industriais" são considerados pelo novo decreto como pessoas que teriam necessidade de ter armas, se desejarem. 

Há alguma medida de segurança que deve ser adotada por quem quer ter uma arma?
É preciso apresentar declaração de que a residência possui cofre ou local seguro com tranca, mas isso só é necessário para quem mora com crianças, adolescentes ou pessoa com deficiência mental. Também vale destacar que o texto fala em "declaração", e não em "prova", e não há nenhuma menção à fiscalização das residências para verificar se isso está sendo cumprido.

O novo decreto diz que "presume-se a veracidade dos fatos e das circunstâncias afirmadas na declaração de efetiva necessidade", a qual será examinada pela PF. O que isso significa, na prática? A PF continua tendo a palavra final?
Sim, a PF tem a palavra final, mas o que mudou é que antes a pessoa que requeria arma apresentava os argumentos que comprovavam que teria efetiva necessidade para tal. Pelo texto de agora, são elencados os requisitos que precisam ser atendidos. O delegado ainda pode negar, mas nega com base em pontos detalhados. 

Segundo o decreto, em que circunstâncias a autorização para posse pode ser negada ou revogada?
Se a pessoa mentir na declaração de efetiva necessidade, mantiver vínculo com organização criminosa ou se agir como uma espécie de "laranja" –a pessoa solicita o registro, mas, na verdade, a arma será usada por quem não se enquadra nos requisitos necessários para a obtenção da licença.

O que acontece com quem é pego com arma de fogo sem registro?
O decreto não altera esse item, regulado pelo Estatuto do Desarmamento. A pena para quem possui ou porta uma arma ou munição sem a devida licença é de dois a quatro de prisão, mais multa. Se a arma for de uso restrito (caso do fuzil, por exemplo), a pena é de três a seis anos, mais multa.
Também é proibido emprestar, alterar numeração ou sinal de identificação da arma.  

E para quem atira?
A pena por atirar, disparar arma de fogo ou acionar munição em "lugar habitado ou adjacências" é crime inafiançável e rende de dois a quatro anos de cadeia e pagamento de multa. Isso também vale para quem tem o registro da posse -ou seja, não é porque a arma é legal que pode ser disparada em qualquer lugar. 
As exceções são em casos de legítima defesa, estado de necessidade e em "estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito", previstos no Código Penal como fatores de exclusão de ilicitude. 

O comércio de armas é permitido? 
Sim. No estatuto do desarmamento, estava prevista a realização de um referendo, em 2005, para que a população respondesse à seguinte pergunta: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?". Com 63,94% dos votos válidos, o "não" ganhou. Com isso, o comércio permaneceu legal no país.