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Picada de escorpião mata preso de Centro de Detenção Provisória, em São Paulo

UOL | 26/07/22 - 09h30
Divulgação

O apelo dramático feito por Alessandra Freitas Valle, 41, para uma advogada, traduzia a dimensão da gravidade do estado de saúde do filho Pedro Henrique de Freitas Valle Nascimento, 20, internado em um hospital após passar mal no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Vila Independência, na zona leste de São Paulo. A coluna apurou que ele foi picado na prisão por escorpião.

Em mensagem enviada ao WhatsApp da advogada Lais Naked Zaratin, a mãe implora por ajuda para poder ficar com o filho no hospital e cuidar dele. Alessandra alerta que o quadro de saúde de Pedro era gravíssimo, que ele estava intubado e já havia perdido os rins.

A mãe suplica à defensora para que consiga uma prisão domiciliar para o filho porque ele estava com febre alta, fortes dores e sangramento interno. Reitera que Pedro não tinha condições de voltar para o CDP e relata também que os médicos não sabem ao certo qual bicho picou o preso.

Pedro morreu sábado (23) no Hospital de Vila Alpina, zona leste paulistana, onde estava internado desde o dia 13 deste mês. Segundo Lais, o CDP foi negligente com a saúde do cliente. A defensora diz que a unidade não deu os medicamentos necessários ao preso e demorou para removê-lo ao hospital.

De acordo com a advogada, o preso ficou com os pés inchados no mês passado e os colegas de cela o ajudaram em várias ocasiões a ir ao banheiro e a tomar banho. A defensora afirmou que o cliente foi uma vez para o hospital, mas recebeu alta e, na volta ao CDP, a unidade não forneceu os antibióticos prescritos.

No boletim de ocorrência registrado no 56º Distrito Policial (Vila Alpina), consta que Pedro morreu de complicações por coagulação intravascular disseminada, síndrome respiratória aguda grave, insuficiência renal e lúpus eritematoso sistêmico.

O CDP de Vila Independência é uma das unidades superlotadas de São Paulo. Segundo consta no site da SAP, o presídio tem capacidade para 822 detentos, mas, até o último dia 22, abrigava 1.278 prisioneiros.

Em junho do ano passado, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo fez uma inspeção na unidade prisional. Os defensores constataram que a estrutura física do CDP estava em péssimo estado de conservação, a ocupação encontrava-se acima do limite de vagas, não havia médicos e faltavam materiais de higiene e limpeza.

Os defensores apuraram ainda que no raio 8, a cela 3 contava com 12 camas, mas abrigava 35 detentos. No raio 7, no xadrez 23 havia 12 camas para 29 prisioneiros. Já no setor de disciplina, a Defensoria confirmou o racionamento de água.

Condenado no semiaberto

Pedro foi condenado em 9 de março deste ano a uma pena de cinco anos e quatro meses, em regime semiaberto, por um roubo cometido em 14 de dezembro de 2021 no Parque da Juventude, em Santana, zona norte de São Paulo.

De acordo com investigações policiais, Pedro e um parceiro não identificado roubaram o telefone celular, R$ 200 e a chave do carro de uma vítima. O comparsa fugiu e ele foi preso por policiais militares.

Apesar de ser condenado em regime semiaberto, Pedro cumpria a pena no regime fechado. No CDP de Vila Independência, ele respondeu a processo disciplinar sob a acusação de ter cometido falta média, em março deste ano, por ter feito tatuagens nas mãos.

A prática é proibida na unidade. A advogada Lais Naked Zaratin disse à coluna que o cliente não fez nenhuma tatuagem enquanto permaneceu no CDP e já estava com o corpo todo tatuado quando deu entrada no presídio, em 14 de dezembro de 2021.

O que diz a secretaria

A SAP (Secretaria Estadual da Administração Penitenciária) confirmou em nota a morte do preso e os mesmos diagnósticos mencionados no boletim de ocorrência lavrado no 56º Distrito Policial.

Segundo a Pasta, desde junho Pedro vinha recebendo atendimento tanto no ambulatório do CDP como externo com queixas de falta de apetite, diarreia, diurese de cor amarela, hipertensão e hipoglicemia. Ainda de acordo com a SAP, a direção do presídio instaurou apuração preliminar para elucidação dos fatos.

A nota da SAP diz ainda que, quanto a possível infestação de insetos peçonhentos, o CDP realiza serviços periódicos de desinsetização e desratização, sendo o último feito em 1º de abril deste ano, com validade de 180 dias.

A pasta informou também que, em visita correcional realizada no começo deste mês, não foi relatado ao juiz, por parte dos presos, presença de escorpiões na unidade.