Mundo

Afeganistão: líderes disseram às forças de segurança para não resistirem, diz ex-embaixadora

BBC | 18/08/21 - 09h04
Reprodução

A rápida tomada do controle do Afeganistão pelo Talebã continua a levantar dúvidas. Enquanto os protagonistas diretos culpam uns aos outros, o Talebã tenta limpar a imagem de crueldade do mundo contra eles.

Na terça-feira (17/8), a ex-embaixadora do Afeganistão nos Estados Unidos, Roya Rahmani, falou ao programa Newshour da BBC sobre sua perspectiva de ver o governo que representou de 2018 até julho em Washington ser derrotado pelo Talebã.

"Dizer que as forças de segurança afegãs não estavam dispostas a lutar não é verdade nem justo", disse Rahman, em referência ao presidente dos EUA, Joe Biden, que culpou diretamente o governo afegão por não lutar contra o Talebã.

A diplomata disse que Biden tem o direito de defender sua decisão e se manifestar, mas disse que o problema recai sobre os líderes do país.

"Houve um problema com a liderança afegã: os líderes se renderam e disseram às forças de segurança para não resistirem", disse ela. "Essa foi a razão pela qual aconteceu o que aconteceu."

Rahmani disse ter recebido informações indicando que durante as "últimas semanas", os militares afegãos "receberam continuamente ligações de Cabul pedindo-lhes que se rendessem, ao mesmo tempo em que eles solicitavam apoio, munição, suporte aéreo e suprimentos".

"Não foram fornecidos", enfatizou a ex-embaixadora.

"Mas acho que mesmo que nossas forças de segurança tivessem resistido, isso (tomada pelo Talebã) também teria acontecido por causa de outros fatores, como o medo, o fracasso total da liderança afegã e também a falta de compromisso e consistência dos aliados internacionais."

"Isso teria acontecido, mas não na velocidade que vimos", disse Rahmani.

O governo do Talebã deve ser reconhecido?

Para a ex-embaixadora, o reconhecimento dos EUA e de outras nações ocidentais ao governo do Talebã deve depender sobretudo dos direitos humanos.

"Você tem que ver o que o Talebã vai fazer. Agora, a boa notícia é que, pelo menos em Cabul, eles não cometeram atrocidades, não estão matando pessoas, não estão torturando ou prendendo. Não estão fazendo o que costumavam fazer em 1996 ", disse ela, comparando com a tomada do poder por radicais islâmicos na década de 1990.

​​"Se eles permanecerem com essa postura - e não tenho tanta certeza de que farão isso - e formarem um governo inclusivo, em que respeitem os direitos das mulheres, mas não em seus termos, e sim nos termos internacionais e aceitáveis para as mulheres afegãs, aí, sim, deveria ser reconhecido", disse. "Por que não reconhecer um governo inclusivo no Afeganistão, representante de seu povo e seu bem-estar?"

'Cautelosamente otimista'

Roya Rahmani concluiu dizendo que concordaria em trabalhar para o governo formado pelo Talebã se seus serviços forem necessários.

"Eu ajudaria meu país. Gostaria de preservar nossas conquistas. Isso é absolutamente necessário."

E deixou claro que não acredita que o Talebã tenha mudado, que ainda é necessário ver o que virá a seguir.

"Os sinais iniciais são um tanto positivos. Estou muito, muito cautelosamente otimista de que eles respeitarão a vontade do povo, sua dignidade e suas esperanças e desejos."