Brasil

Após perder emprego, autônomo vende empada e fatura R$ 4,5 mil por mês

Dominik Giusti e Cintia Magno / Diário do Pará | 11/11/18 - 11h58
Fernando Araújo / Diário do Pará

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2017, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), identificou que no Pará houve um aumento de 183 mil pessoas em situação de trabalho autônomo, entre 2012 e o ano passado. É o caso do vendedor ambulante José Augusto Cabral que, após ficar desempregado, passou a fazer empadas e chopp de frutas de diversos sabores para comercializar dentro dos ônibus.

Ele era gerente de uma loja de eletrodomésticos, onde ganhava aproximadamente R$ 2 mil. Tentou montar um mercadinho, mas não certo e ficou com dívidas. Acabou indo morar com os pais novamente. Para se reerguer, aceitou o convite de uma amiga para vender as empadas. Eles começaram com uma produção pequena, de 20 produtos por dia. Mas em pouco tempo viu o negócio crescer.

“Até busquei outro emprego no ramo de gerente de loja, mas o mercado não se abriu. Aí topei vender as empadas no começo deste ano. Não sabia fazer, mas fui aprendendo. A gente começa a cozinhar por volta de 5h da manhã, fica pronto até 9h e aí saímos para vender até 16h, quando vendemos tudo. Hoje nossa produção é de 300 empadas por dia”, comenta o autônomo, que também tira um intervalopara o almoço. Ele está entusiasmado com o negócio e já fez um isopor personalizado para vender seu alimento, nos sabores frango, camarão, queijo, bacalhau, cupuaçu com castanha, chocolate, coco e calabresa.

“Queremos fazer com mais ingredientes do Pará, como a empada de jambu e camarão. As pessoas gostam”, diz José. Hoje em dia, a renda média é de R$ 4.500,00 por mês. Por conta do viés empreendedor, ele pretende especializar-se ainda mais no ramo de empadas para poder vender para lanchonetes e bares e quer buscar também a formalização. Sobre voltar para o mercado formal, com carteira assinada, para ganhar menos da metade do que como vendedor de quitutes, ele não cogita mais a possibilidade neste momento.

“Eu me sinto feliz por ter conseguido, com muita batalha. Hoje em dia pago meu aluguel, pago minhas dívidas e ainda consigo ajudar outras pessoas”, diz o vendedor, que circula nos bairros da Pratinha, Tapanã, passando também pelo Ver-o-Peso até Icoaraci.

QUALIDADE

José acredita que o sucesso está na qualidade dos produtos. A empada tem a massa fina e consistente e bastante recheio. Nos coletivos, ele recebe comentários positivos sobre o sabor do alimento. “É o que faz a gente continuar, perceber que temos esse retorno. Alguns clientes eu encontro várias vezes no ônibus e eles já até me ajudam com os isopores”, diz.

Na avenida Pedro Miranda, Célia Cardoso, 68, vende guaranás há quase 20 anos. Ela conta que no início dos anos 2000 os carrinhos com a venda do guaraná eram poucos nas redondezas, por isso decidiu investir e foi aprender com outros colegas que já faziam o mesmo. Atualmente, ela diz que as vendas diminuíram e que para complementar a renda costuma fazer faxinas.

“O preço no começo era R$2, mas vendia muito, até 50 por dia. Hoje vendo a R$5, mas não sai tanto, no máximo 20, mas a média é de 10 ou 12. É com isso que consigo garantir em torno de um salário mínimo para levar para casa. Todo mundo gosta do meu guaraná, não saio daqui”.

Sustento retirado da venda de bolos

Na Pedreira, quase na esquina da avenida Pedro Miranda com a travessa Barão do Triunfo, um som gravado chama atenção para uma kombi onde é possível encontrar bolos caseiros de diversos sabores. O responsável é Agnaldo Saraiva dos Santos, 34, autônomo. Ele trabalhou como vendedor em uma loja de bolos, onde ganhava um salário mínimo e pediu demissão para vender os próprios bolos, por R$ 10 cada.Mas tinha um problema: nem ele nem a sua esposa sabiam fazer bolos. “Estragamos muitas caixas de trigo e ovo”. A persistência em continuar o negócio levou-os a perguntar para amigos sobre a melhor forma de bater os bolos e ver vídeos na internet para conseguir ter um produto de qualidade para colocar no mercado. Ele também vende o conhecido como bolo de pote e o chopp de frutas, para aplacar o calor dos transeuntes.

TRABALHO

“No começo foi assim, pequeno, trabalhando das 7h às 18h direto. E com os produtos de qualidade, crescemos. Comprei a kombi, que é maior e comecei a colocar mais produtos. Para mim é melhor trabalhar como autônomo do que como empregado. Não tem décimo terceiro salário e férias, mas a gente viaja pro interior a hora que quer e a aqui tenho uma renda muito maior do que como empregado”, comenta, informando que a renda mensal é de cerca de R$ 5 mil.

E ele também tem planos para o futuro: comprar um novo veículo e abrir uma filial, seja com um ponto fixo ou rodando no carro. “Ainda não decidi, mas já guardei o dinheiro para investir”, adianta o empreendedor.

Agnaldo oferta bolos nos sabores de abacaxi, formigueiro, mesclado, milho verde, macaxeira, cupuaçu, nata com goiaba e espera vender bastante no final deste ano. “Vendemos cerca de 50 por dia. Queremos aumentar para 100 ou 200”, diz.

Taxa de formalização ainda é baixa no Estado

Trabalho

Ainda que o número de trabalhadores autônomos tenha aumentado no Pará, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2017 aponta também que este profissional no Estado ainda apresenta baixa taxa de formalização, quando comparado com os demais estados brasileiros. O Pará se encontra na penúltima posição do ranking, com 9,8% do total de empreendimentos com empregadores e conta própria que possuíam Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ).

Analista técnica do escritório regional metropolitano do Sebrae/PA, Edna Cristina Santos aponta que a simplificação do registro de Microempreendedor Individual (MEI), através de edição da lei complementar nº 128/2008, teve como objetivo justamente dar segurança jurídica para o trabalhador autônomo poder atuar.

Ao sair da informalidade e passar a integrar o MEI, o trabalhador fica amparado pelo sistema previdenciário, o que pode ser fundamental para a manutenção da própria renda familiar. “Com o MEI é possível trabalhar com a segurança do instituto previdenciário, a segurança de que, se esse trabalhador ficar doente, ele terá esse auxílio da previdência para se manter até ter condições de voltar a trabalhar”, exemplifica Edna.

FATORES

Para a analista técnica, entre os fatores que podem levar a uma certa resistência dos trabalhadores informais aderirem ao MEI pode estar o receio de assumir uma responsabilidade. “Apesar da adesão não ser nenhum pouco burocrática, o autônomo não deixa de ter uma responsabilidade com pagamento da contribuição mensal”, aponta Edna. “Uma vez no MEI, a pessoa passa a ser um empresário, então é uma escolha realmente de se formalizar e seguir o negócio”.

A contribuição do MEI é muito abaixo da prevista em uma relação de trabalho tradicional. Quando o trabalhador é empregado de uma empresa, o empregador faz o recolhimento de percentual que varia de 8% a 11%, dependendo do salário do funcionário. Já para o MEI a contribuição é de 5% sobre o valor do salário mínimo.

“Uma vez formalizado, o microempreendedor já sai com o certificado MEI, o Cartão CNPJ, os documentos de arrecadação mensal e documentos para que ele próprio possa fazer o controle do seu faturamento mensal”, explica a supervisora técnica do Sebrae. “Quando ele tem um ponto fixo, ainda recebe o alvará de funcionamento provisório no prazo de 180 dias”.