Futebol Nacional

Carta que autoriza venda de Marinho gera desgaste no Santos

Alex Sabino e Carlos Petrocilo / Folhapress | 05/11/20 - 20h36
Divulgação / Santos

Uma carta assinada por José Carlos Peres, atualmente afastado da presidência do Santos, autoriza um empresário a negociar o atacante Marinho, 30, com clubes de países árabes.

A data do documento aumenta o desgaste no já tumultuado ambiente político da agremiação, 4 de outubro de 2020, seis dias após Peres ter sido retirado do cargo pelo conselho deliberativo do clube sob acusações de má gestão.

A autorização, em teoria, ainda é válida. O texto, ao qual a Folha teve acesso, diz que ela expira após o dia 16 de novembro. Segundo especialistas em direito esportivo ouvidos pela reportagem, esse tipo de documento serve para garantir exclusividade ao agente em transferências de atletas.

"Essas autorizações concedidas pelos clubes a agentes são de enorme relevância prática, pois garantem exclusividade para a negociação do jogador em determinado país. Assim, havendo proposta de um clube daquele país e sendo realizado o negócio, é garantido ao agente uma comissão sobre a transação", diz o advogado Eduardo Carlezzo.

Não há notícias de que até agora tenha chegado ao Santos qualquer oferta por Marinho, principal jogador do time no ano e vice-artilheiro do Campeonato Brasileiro, com 12 gols. O contrato entre a equipe e o atleta tem duração até o final de 2022.

Nesta quarta (4), o comitê de gestão do clube protocolou no conselho deliberativo um pedido para que o fato seja apurado, assim como a responsabilidade de Peres no caso.

Procurado pela Folha, ele afirma que assinou cartas como presidente, no máximo, até o mês de setembro.

"Algumas já venceram. Uma ou duas têm vigência até o dia 15", disse em mensagem, sem detalhar o teor dos documentos.

A carta sobre Marinho, escrita em inglês, foi enviada a uma pessoa chamada Mamdou Sayed Ibrahim, que seria empresário. O atual presidente do Santos, Orlando Rollo (eleito como vice de Peres e rachado com ele) e os demais integrantes do comitê de gestão dizem não saber quem é Ibrahim. A reportagem não conseguiu localizá-lo.

A diretoria do Santos afirma ter tomado conhecimento da existência da carta no último dia 15, quando o agente de Marinho, Jorge Machado, mandou uma mensagem para Rollo. O clube fez uma ata notarial da conversa, registrada no 8º Tabelião de Notas da cidade do litoral paulista.

"Olha que merda", disse Machado após enviar cópia do documento para o atual presidente, que respondeu jamais ter o visto.

Marinho não poderia ser vendido na data compreendida pela carta sem aprovação do conselho deliberativo. Segundo o estatuto do clube, o presidente não pode decidir sozinho pela venda ou compra de atletas a três meses ou menos da eleição.

Machado afirmou que Marinho não tem interesse em deixar o Santos e que, procurado por Ibrahim, não levou a conversa adiante. Segundo ele, o jogador acredita que, com a sequência de boas atuações no time alvinegro, poderá realizar o sonho de jogar na seleção brasileira.

"Ele [Ibrahim] me procurou com um jeito de conversar estranho, e eu logo encaminhei para a diretoria do Santos, porque o Marinho não quer sair. A minha participação como agente é blindar o Marinho. Ele não quis sair lá atrás, porque estava com esperança na seleção, e não quer agora", declarou Machado.

Na denúncia de Rollo ao conselho, o presidente diz que o documento causou desgaste na relação com o atacante e afetou, inclusive, o seu rendimento dentro de campo.

"A carta-autorização foi enviada ao clube pelo agente do jogador, o senhor Jorge Machado, e causou tremendo e desnecessário desgaste na relação com o atleta e seu agente, prejudicando inclusive o desempenho técnico desportivo do jogador, já que se viu envolvido numa negociação sem ter a devida ciência", escreveu.

Decisivo nos jogos do Santos em 2020, Marinho chamou a atenção nesta quarta-feira (4), na derrota diante do Ceará por 1 a 0, por uma atuação apagada e a confusão que causou após o apito final, quando partiu para cima do árbitro Leandro Vuaden. O placar culminou na eliminação da equipe nas oitavas de final da Copa do Brasil.

Marinho, que tinha recebido cartão amarelo por reclamação, teve de ser contido pelo companheiro Madson e o preparador físico Omar Feitosa. Vuaden aplicou cartão vermelho para o santista e relatou os xingamentos de Marinho na súmula.

O jogador pediu desculpas à torcida pelas redes sociais. "Acabei me exaltando hoje, devido ao calor do jogo. Me alterei. Vou evoluir e melhorar. Seguir lutando e sabendo o peso da camisa que visto. Hoje não foi um dia bom! Mas sempre vai ter amor à camisa que uso. Máximo respeito. E juntos vamos dar a volta por cima", escreveu Marinho.

O presidente do conselho deliberativo, Marcelo Teixeira, tem até o próximo dia 27 para realizar uma assembleia de sócios que vai confirmar o afastamento de Peres ou reconduzi-lo ao cargo. A próxima eleição no Santos está marcada para 12 de dezembro. Nem o presidente afastado nem Rollo são candidatos.