Futebol Nacional

Ex-assessor de Neymar: ‘Eu não exibiria as conversas com a menina’

Veja / Placar | 06/06/19 - 14h22
Neymar e Eduardo Musa | Irandy Ribas/A Tribuna

O paulista Eduardo Musa conhece Neymar como poucos. Contratado pelo Santos em 2010, durante a gestão do presidente Luis Álvaro de Oliveira Ribeiro, o profissional era responsável por seguir todos os passos da joia santista no início da carreira. Quando o craque se transferiu para o Barcelona, em 2013, Musa deixou o time da Vila Belmiro para integrar o estafe exclusivo do atleta. Ele atuou como assessor pessoal do jogador até outubro de 2015, quando deixou a equipe por uma desavença comercial com o pai do atleta. Em entrevista a VEJA concedida nesta quarta-feira, o atual dirigente da Confederação Brasileira de Skate (CBSk) revelou que agiria diferente em relação à acusação de estupro que paira sobre Neymar.

“O pai dele entende que deve criar um clima de confronto, ao invés de buscar o esclarecimento. Eu não partiria para o confronto, nem para a exibição das conversas com a menina”, afirmou Musa, que descreve sua relação de quase seis anos com Neymar como a de um “irmão mais velho” do jogador. Ele ressaltou que acredita na versão do jogador. “Eu custo a acreditar que ele poderia estuprar alguém. Ele pode ter mudado? Pode. Mas me surpreenderia muito”.

No tempo em que vocês estiveram juntos, o Neymar passou por algum tipo de situação parecida como essa? Teve umas duas, três vezes alguém dizendo que tinha um print dele fazendo alguma coisa errada, e que se a gente não desse dinheiro essa pessoa iria publicar a foto. Coisas que rapidamente foram descartadas e ignoradas.

Descartadas e ignoradas por que se provaram falsas? Porque não eram nada. Em uma delas o cara falou que o Neymar transou com uma menor. Que tinha fotos e vídeos do momento. Aí eu falei: ‘Tá bom, só para confirmar que você está dizendo a verdade, que dia foi isso?’ Mas no dia em que o cara falou que aconteceu, o Neymar não estava lá. O cara estava querendo dar um golpezinho, achando que iríamos ficar com medo da ameaça.

Como um gestor de carreira, você acha que essa estratégia de divulgar a troca de conversas foi correta? Eu não faria dessa forma. É difícil falar de fora, mas o pai dele entende que deve criar um clima de confronto, em vez de buscar o esclarecimento. Acho que o clima de confronto deve ser deixado para a Justiça, para que eles confrontem as informações. Acho que era dizer que teve uma conversa com a menina depois, que ele se surpreendeu, e que vai deixar para a Justiça resolver. Mas que não está preocupado, porque não houve nada. Ponto. Eu não partiria para o confronto, nem para a exibição das conversas com a menina.

Nessas oportunidades anteriores que você falou, isso acabou chegando para o Neymar? Sinceramente, não me lembro. Mas provavelmente chegou no Neymar, sim. A gente sempre tentava apurar para entender o que tinha acontecido. Como ficava quase 24 horas colado ao Neymar, tinha noção do que havia acontecido, quem estava e quem não estava, quando foi e quando não foi. Muitas das vezes a gente já matava a situação logo no início.

Imagino que uma situação dessa, com o Neymar mais jovem, devia acabar causando uma ansiedade. Ele vinha se aconselhar com você com relação a esses problemas? Sim. A gente conversava sobre isso quase que diariamente.

Qual era a sua orientação naquela época? Depende do caso. Tive uma relação com ele quase de irmão mais velho. A gente conversava bastante sobre isso. Mas não tem uma regra. O que eu tenho visto na imprensa são muitos “especialistas” dando dicas.

Nós mesmos recebemos diariamente dezenas de psicólogos e especialistas em imagem se voluntariando para falar sobre o caso. É uma situação comum para quem está nessa vitrine. Acho que ele errou na prevenção do assunto. Não sei o que aconteceu. Confio demais no Neymar que eu conheço, sinceramente. Convivi com ele quase seis anos, e, como falei, tinha uma relação de irmão mais velho. Por isso, custo a acreditar que ele poderia estuprar alguém. Eu não estava lá, não tenho mais contato, mas custo em acreditar que isso aconteceu. Mas acho que ele errou muito mais na prevenção de tudo isso.

O pai do Neymar deu uma entrevista ao programa Grande Círculo, do SporTV, dizendo que o Neymar e a família tinham acompanhamento psicológico. Nunca teve. Nunca teve.

Você chegou a sugerir isso? O assunto sempre foi discutido. Ali no Grande Círculo, ele falou da família. Eu não posso dizer sobre Nadine e Rafaella. Tinha uma excelente relação com as duas, muito contato, mas elas tinham as coisas particulares delas. Tanto o Neymar pai quanto o Neymar filho, de 2010 a 2015, não fizeram terapia.

Que tipo de outra situação você presenciou e tentou coibir justamente nesse papel de irmão mais velho que você falou? Quando um atleta chega nesse tamanho, uma postagem dele nas redes sociais pode mudar a vida de uma pessoa. E mudou. Quantos músicos não fizeram carreira por conta de uma dancinha do Neymar, por conta de um post? Então, diariamente tentavam seduzí-lo com alguma coisa. Isso é muito comum. Seja no âmbito comercial ou no pessoal.

Como você atuava nesse sentido? Dificilmente a gente conversava especificamente sobre uma pessoa. Só quando ele perguntava o que eu achava do fulano, ou do sicrano. No mais, eu usava muito dos exemplos que aconteciam com outros jogadores e outras celebridades. Na estrutura, eu era uma das pessoas críticas ao fato de o Neymar se pronunciar muito pouco. Ele aparecia muito pouco para quem tem um nível muito bom de entendimento do que está acontecendo. O Neymar, na minha opinião, tem uma imagem que não condiz com a realidade. O Neymar é muito inteligente. E vendem uma imagem de alienado. Não é essa a imagem que eu tenho dele. Mas a decisão superior era de que só o pai se pronunciava. É uma decisão dele.

O Robinho, que jogou com o Neymar (e também foi acusado de estupro), foi um desses exemplos? Vou te dar um exemplo hipotético, até porque não trabalho mais com jogadores. Se eu tivesse trabalhando com fulano hoje, ao invés de falar da vida do fulano, eu ia usar o caso do Neymar para conversar com ele sobre. Não como tratar uma mulher, mas sobre o antes, o depois, o risco. O porquê desse contato, o porquê de não fazer o contato. Se traz ou não traz a mulher. Isso eu fiz muito com o Neymar, usando outros exemplos.

E não é uma coisa exclusiva do Neymar. Muitos jogadores passam por isso. São atraídos por garotas e acabam eles organizando a viagem, trazem para a Europa, não? Sim, sim.

Em uma grande entrevista concedida ao portal UOL, o pai do Neymar disse que a imprensa não conhece o jogador, nem o jogador conhece a imprensa. Isso é uma estratégia dele, que ele acaba impondo para o filho? Sem dúvida, sem dúvida. Com o ônus e com o bônus. É uma decisão dele.

O Neymar tinha consciência de que todo passo dele era vigiado, que alguém poderia estar tentando gravá-lo? Sim, sim. Por isso que te falo que acho que ele errou. Porque ele é um cara extremamente consciente. Sempre foi. Acho que inclusive esteja doendo mais essa questão, de saber que podia acontecer, do que propriamente o ocorrido. Não quero cometer a injustiça de acusar a menina de golpe. Não estava lá, então é difícil dizer. O que me faz pensar isso, e eu não posso ser hipócrita, é o fato de conhecê-lo bem. Por isso que eu te digo: acho quase impossível a possibilidade dele estuprar alguém. Ou até tratar uma mulher mal. Não posso por a mão no fogo mais, estou há três anos afastado. Ele pode ter mudado? Pode. Mas me surpreenderia muito. O Neymar que eu mantive contato inclusive no início de 2016 não é, nem de perto, um cara com possibilidade de cometer um crime desse nível. De qualquer nível, na verdade. Acho muito difícil.

Sempre se criticou muito a questão dos “parças” e a influência desses meninos na vida dele. Você acha que talvez para ele amadurecer, ele precisaria caminhar um pouco mais sozinho? Tenho uma visão ou pouco diferente. Eu não acho que a presença dos amigos é o que faz os problemas do Neymar aparecerem. Eu acho é que a ausência de um profissional ao seu lado.

Nessa mesma entrevista para o UOL, o pai de Neymar diz que o objetivo de todos na empresa, e de todos que vivem no entorno do jogador, é fazer seu filho feliz. Você compartilha dessa tese? É assim mesmo? É assim mesmo. Mas eu concordo até uma certa parte, porque tem algumas questões profissionais. Acho que os amigos recebem culpa demais pela situação. Não vejo isso. A gente tem que entender também que, lá atrás, se Neymar quisesse ter relações com pessoas de 21, 22 anos, seus amigos estariam trabalhando. É uma situação de mercado que não é comum. Enquanto o cara trabalha de segunda à sexta, e tem que entrar às 8 horas da manhã, o Neymar só tem folga quarta-feira à noite. Como faz isso? Para o Neymar se divertir, por exemplo? Existem situações e situações. Mas, insisto, o problema não é a presença dos amigos. É a ausência do profissional.

Ele se realiza muito pessoalmente através dos amigos também, não é? Sim, sem dúvida. Ele tem uma relação forte com os amigos. Eles são amigos, que como todo ser humano tem defeitos e qualidades, mas são amigos de longa data do Neymar. Você vê um ou outro que chega e sai, mas os amigos do núcleo central lá são de longa data mesmo dele.

Mas ele é mimado? É insuportável você conhecer o Neymar e ver a imagem que ele tem no mercado, porque é um p… moleque demais, gente boa, amável, solícito no dia-a-dia. E justamente nesse momento, um dos mais polêmicos da carreira dele, vejo como tem sentido essa imagem aqui fora, mas como é injusto com ele.

Ele sabe ouvir críticas? Como ele encara receber um puxão de orelha? Tive uma relação maravilhosa com ele, com liberdade inclusive para dizer: ‘Você está errado. Você quer fazer isso? Faça, mas você está errado’. E muitas vezes ele não fez. Ou fez, depois concordou. Ou fez e deu certo. Mas  tinha realmente uma relação com ele que permitia a liberdade de dizer não. Sendo atendido ou não, mas tinha essa liberdade de dizer não.

Se você pudesse dar uma conselho para ele, qual seria a partir dessa celeuma colocada? Seria um papo longo, mas o principal seria que ele deve parar, ouvir o coração dele e, por incrível que possa parecer, se desarmar. Essa questão de todo mundo contra ele só fez mal a ele, não fez bem em nada.