Política

Irritado e com Bolsonaro fora, Congresso acelera análise sobre abuso de autoridade

Folhapress | 23/09/19 - 23h29
Reprodução

Irritado com a operação da Polícia Federal que teve como alvo o líder do governo no Senado, o Congresso se reúne nesta terça-feira (24) para votar uma série de vetos do presidente Jair Bolsonaro (PSL), inclusive àquele feito à lei de abuso de autoridade. A sessão ocorrerá com o chefe do Executivo fora do país.

Inicialmente, a sessão que reúne deputados e senadores estava prevista para a semana que vem para não contaminar a pauta desta semana no Senado, atribulada com o primeiro turno da reforma da Previdência e a indicação de Augusto Aras à Procuradoria-Geral da República.

O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que também é o presidente do Congresso, antecipou a sessão por causa da pressão de parlamentares para a liberação de emendas prometidas pelo governo para a votação da reforma.

A eventual derrubada dos vetos representa uma derrota para o governo e, principalmente, para o ministro da Justiça, o ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro, ao qual a PF está subordinada.

Em outra decisão desta segunda-feira (23) que pode levar a um revés da Lava Jato, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, marcou para esta quarta (25) o julgamento em plenário de ação que pode anular condenações da operação.

A sessão do Congresso está programada para ocorrer na tarde desta terça, cinco dias após a operação da PF que irritou Alcolumbre e outros parlamentares, criando um ambiente favorável à derrubada dos vetos.

A ação com buscas e apreensões na última quinta-feira (19) em endereços relacionados ao senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e ao deputado Fernando Filho (DEM-PE), filho dele, foi autorizada pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso. Contrariados, parlamentares passaram a discutir uma reação contra o governo e o Judiciário.

Além disso, a manobra no calendário puxa a votação para um período em que Bolsonaro encontra-se fora do país -ele está em Nova York, onde participa da Assembleia Geral da ONU.

Vetos presidenciais passam a ter prioridade na pauta do Congresso 30 dias após a decisão do Palácio do Planalto. Os itens sobre a lei de abuso de autoridade não completaram esse prazo e, portanto, não entraram no topo da lista de votação.

Mas parlamentares articulam um acordo para que as restrições a essa lei sejam analisadas já na sessão desta terça.

"Vamos votar os vetos apesar de eles não trancarem a pauta. A previsão é derrubar. Não sei se todos, mas muitos devem cair", disse o deputado Ricardo Barros (PP-PR), relator do projeto na Câmara.

O texto sobre abuso especifica condutas inapropriadas e prevê punições a juízes, promotores e policiais, por exemplo. No início deste mês, Bolsonaro vetou trechos de 19 dos 45 artigos constantes no texto aprovado pelo Congresso -que, agora, pode tentar retomar alguns pontos.

Se os vetos forem derrubados, seria retomada a proposta do Legislativo, com regras mais duras sobre abuso de autoridade e que foram motivo de críticas de juízes e promotores, que falavam em tentativa de cercear investigações.

A articulação na Câmara para a derrubada da maioria dos vetos existe desde o início do mês. O acordo entre deputados era manter apenas um veto, ao artigo que proíbe a utilização de algemas em caso de não resistência do preso à atuação policial.

Mas a votação começa pelo Senado, onde há um grupo de ao menos 33 senadores alinhados à agenda da Lava Jato que defendia veto integral da lei de abuso de autoridade. Para rejeitar um veto é necessário maioria absoluta -41 senadores e 257 deputados.

Diante da restrição parcial feita por Bolsonaro a trechos do projeto, estes senadores tentam garantir ao menos a manutenção dos vetos propostos pelo presidente. Alguns admitem agora que, diante da ação da PF com aval de um ministro do Supremo, formou-se um ambiente desfavorável a isso, embora nem todos concordem com essa reviravolta.

"Acho que esta situação [envolvendo o líder do governo] não muda nada. [Bezerra Coelho] é uma pessoa muito adulta e vai saber separar as coisas", disse o senador Oriovisto Guimarães (PODE-PR).

Alcolumbre ouviu de advogados do Senado na semana passada a avaliação de que, para eles, houve abuso de autoridade na decisão de Barroso, que autorizou a operação a pedido da PF, mesmo com a discordância da então procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

O presidente do Senado lembrou à plateia de um evento em Brasília no dia da operação que tem feito sua parte para evitar uma crise entre os Poderes.

Ele citou o esforço que faz desde o início do ano para segurar a criação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar integrantes do Supremo, a CPI da Lava Toga. Diante disso, pediu uma reflexão dos magistrados.

Entre os senadores, há expectativa sobre como Bezerra Coelho vai atuar na sessão desta terça. Na semana passada, logo após a operação da PF, o líder do governo deixou seu cargo à disposição de Bolsonaro, que não pretende substituí-lo antes da votação da reforma da Previdência.

O primeiro turno da PEC (proposta de emenda à Constituição) estava previsto para esta terça, mas ficou para quarta-feira (25). O segundo turno está programado para a primeira quinzena de outubro.

Bezerra Coelho é o principal articulador do governo no Senado e tem trânsito com todos os colegas, auxiliando o Planalto em votações e na interlocução com parlamentares, já que o Executivo não tem uma base fixa no Congresso.

Antes de discutirem os vetos à lei de abuso de autoridade, os congressistas terão que debater polêmicas como a manutenção, por Bolsonaro, da cobrança de bagagens despachadas pelas companhias aéreas, o que contrariou decisão do Legislativo.