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Laudos apontam que jovens mortos em Paraisópolis tiveram traumas condizentes com pisoteamento

Rogério Pagnan e Thiago Amâncio - Folhapress | 14/12/19 - 11h05
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Os exames periciais realizados nos corpos dos nove jovens mortos em Paraisópolis no início deste mês apontam para traumas condizentes com pisoteamento, como contusões e escoriações, ferimentos que levaram os jovens a óbito. De acordo com os laudos obtidos com exclusividade pela reportagem, a causa das mortes apontada é asfixia mecânica provocada por sufocação indireta. Para integrantes da cúpula da Segurança Pública ouvidos pela reportagem, os dados são compatíveis com mortes por "atropelo". Os documentos foram entregues à Polícia Civil nesta sexta (13) e devem ajudar os policiais na investigação. O caso é conduzido pelo DHPP (departamentos de homicídios), com participação da Corregedoria da Polícia Militar.

De acordo com integrantes da cúpula da Segurança Pública ouvidos pela reportagem, embora já esperado, o resultado dos exames ajuda a afastar um eventual homicídio doloso (intencional) cometido no tumulto.

Assim, as mortes devem ser tratadas como um crime culposo (sem intenção de matar), responsabilidade que também pode ser estendida aos organizadores do evento. Essa decisão sobre os culpados só deve ocorrer no final da apuração, para o qual não há previsão.

De acordo com os laudos, todas as vítimas tinham substâncias tóxicas na corrente sanguínea -algumas delas, mais de uma substância. Na lista de elementos detectados estão álcool, cocaína, lança-perfume (loló), anfetamina e crack.

A maioria das vítimas ingeriu álcool e lança-perfume; duas delas consumiram apenas lança-perfume, produto de consumo frequente em bailes da periferia. Uma das vítimas tinha, porém, quatro substâncias diferentes no corpo: álcool, lança-perfume, cocaína e crack.

Há uma divergência entre policiais ouvidos pela reportagem sobre quanto essas drogas contribuíram para as mortes. Parte afirma acreditar haver ligação direta, porque trata-se de depressores cardíacos que, assim, contribuiriam para a insuficiência respiratória das vítimas.

Outra parte, porém, descarta a ligação com a mortes, a não ser que tenham causado problemas de coordenação motora que os levaram ao solo, ou que os jovens já estivessem caídos na viela onde foram pisoteados.

A morte dos jovens na favela ocorreu durante ação policial em um baile funk no início deste mês. Os policiais envolvidos na operação foram afastados por determinação do governador João Doria (PSDB). As investigações abertas tentam apurar se os PMs deram causa às mortes ou se elas ocorreram por eventual tumulto provocado por tiros disparados por criminosos.

No começo da tarde desta sexta (13), o secretário da Segurança Pública, general João Camilo Pires de Campos, não quis comentar o resultado dos laudos. "Vamos aguardar os inquéritos. Tem dois em curso, é prudente que esperemos a conclusão deles."

O governador João Doria também não quis comentar o laudo, mas afirmou que, se comprovada a responsabilidade dos militares pelas mortes, o governo pode pagar uma indenização às famílias das vítimas, como fez no caso do atentado à escola Raul Brasil, em Suzano (SP). "Temos que aguardar o final do inquérito. O estado não pode precipitar juízo a esse respeito. Há um inquérito policial transparente", disse Doria. "Se na conclusão houver circunstância onde o Estado tenha culpa, nós vamos agir como agimos na escola Raul Brasil, em Suzano, pagando as indenizações e fazendo isso com a mesma prioridade que fizemos em Suzano."