Brasil

Pesquisadores do CE desenvolvem aparelho que 'destrói' coronavírus em salas de aula

Universidade Federal do Ceará | 13/09/20 - 23h03
Ribamar Neto/UFC

Sem vacina disponível, um dos grandes desafios que a covid-19 gera a instituições de ensino é como garantir a segurança de alunos em ambientes fechados e com ar-condicionado, que é o caso das salas de aula. Diversas alternativas vêm sendo pensadas e uma delas parte de um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará no Campus do Pici Prof. Prisco Bezerra: eles estão montando um equipamento que, com a utilização do gás ozônio, destrói o novo coronavírus e qualquer outra bactéria e fungo dos recintos. O protótipo desse dispositivo já está em fase de testes.

O aparelho em questão é um ozonizador, que já existe em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil, bem antes do surgimento da pandemia da covid-19. O equipamento segue um princípio geral: ele libera nos ambientes o ozônio, que tem a capacidade de quebrar as moléculas orgânicas com as quais entra em contato, a exemplo de vírus, bactérias e fungos.

O ozonizador em teste na UFC fará a geração do ozônio a partir do próprio oxigênio presente no ar que circula nas salas de aula, realizando essa transformação por meio da aplicação de descargas elétricas. O protótipo estará pronto para uso até o fim deste mês de setembro. A ideia é que, em breve, sejam produzidos mais cinco exemplares desse aparelho. Os seis, então, serão disponibilizados para as três unidades acadêmicas do Campus do Pici: o Centro de Ciências, o Centro de Tecnologia e o Centro de Ciências Agrárias, conforme explica o Prof. Marcos Sasaki, de quem partiu a ideia do projeto.

Sasaki é professor do Departamento de Física e, desde o início da pandemia, vem se movimentando para dar alguma resposta ao enfrentamento da crise através de suas pesquisas. Como possui impressora 3-D, iniciou ajudando grupos da Universidade na produção de máscaras de proteção (face shields). Na busca por dar um passo além, pesquisou a ação do ozônio na quebra de moléculas de vírus e viu aí uma nova oportunidade de contribuição.

Convidou dois outros professores para a empreitada: Jarbas Silveira, da Engenharia de Teleinformática, e André Machado, pesquisador do Centro de Ensaios não Destrutivos (CENDE), do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais. Desde maio, os três, juntamente com um grupo de quatro estudantes, estão envolvidos no projeto do ozonizador.

"O diferencial desse projeto é a medição do ozônio no ambiente e a segurança no uso", explica o Prof. Sasaki. Além de criarem o aparelho que gerará o ozônio que desinfetará as salas de aula, os pesquisadores também incluem no projeto a medição do ozônio presente no ambiente e do tempo que ele demora para se dispersar, uma vez que a inalação desse gás em grande quantidade pode gerar problemas à saúde das pessoas.

"A segurança é muito importante. Temos que gerar, medir e liberar o ozônio do ambiente, e isso ainda não é feito no Brasil", informa. Quando os seis aparelhos estiverem finalizados, os estudantes envolvidos no projeto farão o protocolo de aplicação.

(Crédito: Ribamar Neto/UFC)

POTENCIAL DE COMERCIALIZAÇÃO

O investimento utilizado na produção dos seis ozonizadores veio de recursos de um projeto de extensão coordenado pelo Prof. Sasaki, através do Laboratório de Raios X e com a ajuda da Fundação de Apoio à Serviços Técnicos Ensino e Fomento de Pesquisas (FASTEF).

"Creio que com ajuda de empresa, que seja pouca, podemos produzir vários em menos de seis meses", aponta o professor, que já chegou a enviar convites a empresas distribuidoras e produtoras de gás oxigênio, mas sem sucesso. O professor também criou um material de divulgação on-line do projeto no site do Laboratório de Raios X da UFC, direcionado a possíveis investidores.

Conforme o pesquisador André Machado, o custo de produção do ozonizador é bem inferior ao de similares que podem ser encontrados no mercado. "Dependendo do volume de geração de ozônio, o preço da produção da unidade é abaixo de R$ 500,00", informou. O valor se refere ao custo de cada uma das seis unidades hoje em produção na UFC, que terão capacidade de geração de até 10 gramas de ozônio por hora, o necessário para ambientes médios, como salas de aula.

Apesar de estar sendo criado para desinfetar salas de aula, o ozonizador tem alto potencial para aplicação em diversos ambientes. André Machado explica que o ozônio já é comercialmente usado para tratamento de água, com respostas melhores que o cloro, para conservação de itens hortifrutigranjeiros e para aplicações médicas. O equipamento produzido na UFC, inclusive, foi inicialmente pensado para utilização em ambientes hospitalares, como UTIs, e consultórios. Somente depois se pensou numa utilização mais imediata na própria Universidade, garantindo maior segurança aos estudantes quando eles voltarem presencialmente às salas de aula.

O Prof. Sasaki acredita que o equipamento pode vir a ser usado em diversos outros ambientes, dentro ou fora da Universidade, e vê potencial para criação de uma empresa a partir da iniciativa. “É possível disponibilizar os aparelhos para as instituições públicas (escolas, universidades, hospitais e estabelecimentos públicos) e privadas”, destaca.

INOVAÇÃO E APRENDIZADO

A criação do ozonizador na UFC é um processo que envolve diversas áreas do conhecimento. No momento, sob a coordenação do pesquisador André Machado, está sendo estudada qual a melhor tensão para a produção do ozônio. "A ideia é produzir a maior quantidade de ozônio com a menor tensão possível. Por isso, estamos estudando todo tipo de célula", esclarece o pesquisador.

As chamadas células de produção do ozônio, que geram o gás por meio da liberação de descarga elétrica, estão sendo feitas com vidro de lâmpadas fluorescentes, em um processo que tem envolvido uma importante participação dos alunos. O corte desses materiais para a produção das células é uma atividade com a qual Caio Nobre, aluno do primeiro semestre de Engenharia Metalúrgica e bolsista do Programa Ensino-Treinamento (PET) do curso, não imaginava lidar tão cedo na Universidade.

"É muito gratificante, ao invés de estar parado em casa, estar aqui contribuindo com esse projeto. Estou aprendendo sobre a geração de ozônio, o quanto isso impacta a sociedade, e vejo que, por meio desse projeto, é possível ajudar as pessoas", avalia.

Já Jorge Luiz, concludente de Engenharia de Computação, utilizou seu conhecimento em sua área de atuação para produzir os sensores que medem o nível de ozônio. "Esses sensores controlam o nível de ozônio que as células estão produzindo", explica. "Eu não conhecia sobre o ozônio e, a partir desse projeto, comecei a estudar sobre os sensores de ozônio. É um projeto muito interessante, o objetivo dele é muito nobre e eu quis participar, como voluntário", afirma.

Além deles, há dois outros bolsistas do PET Metalúrgica no projeto: Levi Queiroz Dantas (terceiro semestre) e Luis Eduardo Vieira Alcântara Filho (primeiro semestre). A Profª Janaína Machado, tutora do PET Metalúrgica, destaca a importância de os alunos participarem das atividades não só de ensino mas também de pesquisa e extensão durante o período de sua formação acadêmica.

"Participar de projetos como esse é um processo que vai ajudar no aprendizado dos alunos. Eles, por meio disso, adquirem o conhecimento da teoria até a prática. São mais de 20 PETs na Universidade e, através das atividades que fazemos, estamos dando um retorno à sociedade", analisa.