Daniela é vendedora de dinamite. Filipe Catão é um chef que anuncia pelo Instagram "comida afetiva, feita em casa com amor".
Ainda assim, não foi ela que obrigou o marido a vir ao Rock in Rio assistir ao Sepultura, Scorpions e Iron Maiden, mas sim o fofo cozinheiro que a arrastou. "Sou mineiro e nunca tinha visto o Sepultura. Foi um show de respeito", disse ele, que nesta sexta (4) aproveitou para tirar a camiseta do Iron Maiden do armário. "Vou dançar um funk no Espaço Favela", diz a garota, que trabalha em uma firma que vende explosivos para mineração. Na hora do Iron, ela foi conhecer a Nave, um espaço sensorial do festival.
Apesar da diferença de trabalhos e de gostos musicais, ninguém diria que eles não formam um casal feliz. Isso é notável porque, na entrada do festival no dia do metal, testemunhas de Jeová tentavam cooptar roqueiros para uma vida religiosa. Com saias longas e sem camisetas de banda, vade retro, exibiam um cartaz com os dizeres "Tenha uma família feliz". Daniela e Filipe não se interessaram pela conversa, pois já a tem: são pais de três filhos, um biológico e um casal de gêmeos adotado.
Até na quinta (3), o recorde de camisetas de banda era do Red Hot Chilli Peppers. Na sexta, porém, era esperado: milhares e milhares de camisetas pretas estampadas com bandas de heavy metal desfilaram pela Cidade do Rock, e não apenas as das bandas escaladas. O calor também era o maior do festival até agora, com inclementes 26°C à noite.
GARI ROQUEIRO
O dia do metal é o favorito do Gari Roqueiro. "Já cumpri meu horário aqui, mas tô aproveitando, senão eu perco o melhor da festa", diz Rodrigo França, 40, posando para selfies e fotos, enquanto tenta ouvir o Iron Maiden, em ação no palco principal.
França usa um moicano vermelho, da mesma cor dos óculos escuros, além de correntes, um cinto com réplicas de balas de fuzil, um colar de caveira e uma bota preta.
É o visual pelo qual ele é conhecido nas ruas do Rio de Janeiro, onde trabalha recolhendo lixo para a Comlurb, da prefeitura do Rio, há seis anos.
Este é o segundo ano dele no Rock in Rio. Em 2017, diz, foi uma experiência da qual jamais vai esquecer. Além de ter visto sua banda favorita, o Guns N' Roses, ele ficou famoso com o público do festival."Hoje, vivo uma vida de artista sem ser artista", comenta.
Em seis meses, França espera ter conseguido incluir o título pelo qual é conhecido, Gari Roqueiro, em seu nome oficial. "Ninguém me chama mais pelo nome, nem apelido de infância."
Evangélico na juventude, o gari viu no rock uma renovação de vida. "Eu ficava retraído, me preocupava com o que iam pensar de mim", confessa. "Não era feliz, vivia de aparência. Minha vida estava se destruindo."Hoje, França retomou os estudos e acaba de finalizar o ensino médio. Pessoas que antes o viam com desprezo, agora param para conversar e tirar fotos com ele. Conseguiu também a aprovação da família- ele é casado e tem três filhos. "Meu filho agora diz 'pai, quando você vai me levar para o rock?'".
Nesta sexta-feira (4), ele está ansioso para ver o Scorpions, mas comete uma pequena gafe ao lembrar o nome da banda. "O que mais gosto de hoje é o Nirvana. Tô aqui firme e forte esperando por esse momento."