Brasil

ONU critica ação policial no Rio e pede investigação imparcial

UOL | 07/05/21 - 07h04
OAB

O Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos criticou a violência da operação policial no Rio de Janeiro e pediu que investigações imparciais sejam abertas. "Estamos profundamente perturbados pelas mortes de 25 pessoas numa operação policial", disse Ruppert Colville, porta-voz da ONU, numa coletiva de imprensa em Genebra nesta sexta-feira.

Segundo ele, tal caso confirma a tendência de uso excessivo de força por parte dos agentes policiais. Para ele, o modelo de policiamento de favelas precisa ser repensado pelo país e um debate deve ser aberto.

Nesta quinta-feira, uma operação policial deixou ao menos 25 mortos na favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro. Apesar de o ato ter se transformado na operação mais letal da história da cidade, o governo estadual indicou que a ação foi orientada por "inteligência e investigação". Mas grupos como a Anistia Internacional, Comissão Arns e Human Rights Watch denunciaram a operação como um exemplo da violência policial no país.

A Operação Exceptis foi deflagrada a partir de denúncias de que criminosos estão expulsando moradores de suas casas. O grupo seria responsável também pelo assassinato de moradores e pelo sumiço dos corpos —21 criminosos foram identificados como os "responsáveis por garantir o domínio territorial da região com utilização de armas de fogo", informou a Polícia Civil.

Colville, porém, indicou que o número de pessoas feridas ainda é desconhecido. "Esse parece ser a operação mais letal em mais de uma década no Rio e confirma uma tendência de uso da força desnecessária e desproporcional por parte da polícia nas regiões pobres, marginalizadas e predominantemente com uma população afro-brasileira, conhecidas como favelas ", disse.

De acordo com a ONU, é "especialmente perturbador" que a operação tenha ocorrido depois que que o Supremo Tribunal Federal, em 2020, determinou limites para ações policiais nas favelas durante a pandemia da covid-19.

"Relembramos às autoridades brasileiras que o uso da violência deve ser usado apenas quando estritamente necessário e que deve sempre respeitar o princípio da legalidade, precaução e proporcionalidade", disse.

"A força letal é apenas para ser usada como último recurso e apenas quando há uma ameaça à vida ou dano sério", insistiu.

Chamando os eventos de "trágicos", a ONU ainda criticou o fato de que, depois da operação, a polícia não teria atuado para preservar evidências nos locais dos crimes, o que poderia minar as investigações.

Violência policial no Brasil é alvo de denúncias frequentes da ONU

Não é a primeira vez que a ONU denuncia a violência policial no Brasil. Já em 2019, a alta comissária das Nações Unidas para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, criticou a situação do país, o que levou o presidente Jair Bolsonaro a atacar a chilena. Diversos informes ainda de outros órgãos da ONU, OEA e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos apontaram para o mesmo fenômeno.

Em 2020, o Comitê da ONU sobre Desaparecimentos Forçados cobrou do governo de Jair Bolsonaro explicações sobre violência policial, sobre o desmonte dos mecanismo de monitoramento e prevenção da tortura. Num documento enviado ao Itamaraty no dia 19 de maio, o organismo pediu esclarecimentos ainda sobre as investigações que tenham sido realizadas no país sobre milícias.

Também no ano passado, deputados brasileiros apresentaram às Nações Unidas 69 casos de suspeita de execuções sumárias no país e pediu que a entidade abrisse investigações. A queixa foi apresentada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, liderada por Helder Salomão (PT-ES) e apoiada pela Rede Nacional de Mães e Familiares de Vítimas de Terrorismo do Estado, pela Coalizão Negra Por Direitos, Justiça Global, Rede Justiça Criminal, Movimento Independente Mães de Maio, Educafro e Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial.

A lista foi elaborada depois de um longo trabalho de coleta de dados e com o consentimento das próprias famílias das vítimas. De acordo com eles, são histórias de um Brasil invisível para uma parcela da sociedade.