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Polícia faz operação mais letal da história do RJ, com ao menos 25 mortos

Folhapress | 06/05/21 - 15h58
Reginaldo Pimenta/Agência O Dia

Uma operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro que ocorre nesta quinta-feira (6) na comunidade do Jacarezinho, na zona norte carioca, deixou até agora 25 mortos e já é considerada a mais letal da história, segundo pesquisadores, organizações e profissionais que atuam na área.

De acordo com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da UFF (Universidade Federal Fluminense), que possui uma base de dados iniciada em 1989, nunca houve uma ação única com essa quantidade de óbitos. O maior total recente ocorreu no Complexo do Alemão em 2007, com 19 vítimas.

"Esse número de mortes só se compara às chacinas de Vigário Geral [21 mortos, em 1993] e da Baixada [Fluminense em 2005, com 29 mortos], mas provocadas em operações extralegais. É preciso responsabilizar os agentes políticos responsáveis por essa ação", afirma o coordenador do grupo, Daniel Hirata.

Tanto a chacina de Vigário como a da Baixada foram provocadas por policiais. Contudo, a atuação deles foi clandestina, como parte da ação de grupos de extermínio, e não numa operação oficial como a desta quinta.

Desde o início da manhã, moradores relatam intensos tiroteios e veículos blindados e helicópteros da corporação transitando pela favela, que é plana e é tida pela polícia como um dos principais locais de atuação da facção criminosa Comando Vermelho.

Imagens de helicóptero da TV Globo que sobrevoava a região por volta das 7h da manhã mostraram policiais se protegendo atrás de postes próximos a uma linha de trem e, em outro momento, criminosos armados com fuzis fugindo por cima de casas da comunidade.

"Meu dia terminou antes de começar", diz um jovem que mora ao lado do Jacarezinho e teve que colocar o fone para conseguir conversar com a reportagem, por causa do barulho de aeronaves. Criado na favela, ele está em contato desde cedo com a mãe, familiares e amigos que moram ali, . Ele não quis ser identificado.

Ele afirma que há diversos relatos, vídeos e fotos de corpos nas vielas. Há também acusações de torturas e invasões de casas por policiais. Parte dos mortos teriam sido baleados dentro de uma casa.

Um dos 25 mortos foi o policial civil André Frias, 45, que trabalhava na Delegacia de Combate às Drogas (Dcod) e chegou a ser levado para o Hospital Municipal Salgado Filho ao ser atingido na cabeça, mas não resistiu. A unidade recebeu outra vítima que não teve a identidade divulgada.

A Secretaria Municipal de Saúde também confirmou ao menos outras três pessoas feridas. Uma, não identificada, segue internada em quadro estável. O segundo, Rafael Moreira, 33, deixou a unidade por conta própria. O terceiro, Humberto Gomes Duarte, 20, também está estável no Hospital Municipal Souza Aguiar.

Os dois últimos estavam dentro de um vagão do metrô que passava pela altura da estação de Triagem, em Benfica, bairro próximo, quando um projétil atingiu um vidro da composição. Segundo o MetrôRio, um foi atingido por estilhaços de vidro e o outro, de raspão no braço.

Vídeo publicado pelo jornal O Dia mostra passageiros no chão, em desespero, ajudando no socorro. Por causa da ocorrência, a operação da Linha 2 chegou a ser interrompida, mas voltou a funcionar. Linhas de trens da SuperVia também foram alteradas durante o tiroteio e já foram normalizadas.

A Polícia Civil não divulgou balanço da operação até o momento e marcou uma entrevista coletiva para quando a ação acabar, sem horário definido. A Polícia Militar afirmou apenas que a ocorrência não está a cargo da corporação.

Por volta das 7h30, a Polícia Civil divulgou uma nota dizendo que seus agentes realizavam a Operação Exceptis no Jacarezinho, contra traficantes que vinham aliciando crianças e adolescentes para integrar a facção criminosa Comando Vermelho, que domina a região.

Segundo a corporação, os criminosos exploram práticas como tráfico de drogas, roubo de cargas, roubos a transeuntes, homicídios, entre outros. Eles também teriam sequestrado trens da SuperVia em dezembro de 2020 e abril de 2021.

A investigação começou a partir de informações recebidas pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), que coordena a ação com apoio de outras unidades do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE), do Departamento Geral de Polícia da Capital (DGPC) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core).

Após o acesso a dados de celulares, foram identificados 21 integrantes que seriam "responsáveis por garantir o domínio territorial da região com utilização de armas de fogo". "Foi montada uma estrutura típica de guerra provida de centenas de 'soldados' munidos com fuzis, pistolas, granadas, coletes balísticos, roupas camufladas e todo tipo de acessórios militares", diz a polícia.

A corporação afirma ainda que o Jacarezinho é considerado um dos quartéis-generais do Comando Vermelho, com "uma quantidade relevante de armamentos, que seriam utilizados nas retomadas de territórios perdidos para facções rivais ou para se reforçar de possíveis investidas policiais".