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Rússia condena jogadora de basquete dos EUA a 9 anos de prisão

Folha de São Paulo | 04/08/22 - 14h53
Reprodução/Twitter

Um tribunal na Rússia considerou nesta quinta-feira (4) a jogadora de basquete dos EUA Brittney Griner culpada e a condenou a nove anos de prisão, em um caso que tem mobilizado diplomatas do governo Joe Biden, comovido a comunidade esportiva e, mais uma vez, dividido a sociedade americana. Além da pena de prisão, a jogadora também terá que pagar uma multa de 1 milhão de rublos (R$ 85 mil).

Em nota, Biden chamou a condenação de inaceitável e afirmou que seu governo "vai continuar a trabalhar incansavelmente" para repatriar a americana.

Griner foi detida em 17 de fevereiro, no Aeroporto Internacional Sheremetievo, próximo a Moscou, acusada de carregar cartuchos de óleo de haxixe, substância da cânabis ilegal na Rússia, para serem usados em um cigarro eletrônico.

Se a situação já parecia ruim, diante da possibilidade de ser condenada a até dez anos de prisão, o caso ganhou outra dimensão uma semana depois de ser detida, quando o presidente russo, Vladimir Putin, decidiu invadir a Ucrânia.

Nas semanas que se seguiram, Biden chamou Putin de criminoso de guerra, a Rússia afirmou que os EUA promovem banditismo e as relações entre os dois países chegaram à beira do colapso. Notícias ruins para quem esperava uma intervenção diplomática do governo americano para sair da prisão.

Griner estava na Rússia para jogar pela liga de basquete feminino do país no período fora da temporada do esporte nos EUA, algo que jogadoras costumam fazer para complementar a renda, dados os salários mais baixos em comparação à modalidade masculina do esporte. Na Rússia, ela ​jogava pelo UMMC de Ecaterimburgo, na região dos montes Urais, mais próximo do Cazaquistão do que do leste da Europa.

Com mais de 2 metros de altura, Griner, 31, joga nos EUA pelo Phoenix Mercury e é considerada uma das estrelas do basquete feminino americano desde quando disputava a liga universitária, pela Universidade de Baylor. Além disso, é bicampeã olímpica (Rio-2016 e Tóquio-2020). Nos protestos contra a morte de George Floyd em 2020, juntou-se ao grupo de atletas que se manifestaram contra o fato de o hino americano tocar antes dos jogos. "Sinceramente eu acho que não devíamos tocar o hino nacional durante nossa temporada. Eu acho que deveríamos nos opor a isso", disse na ocasião.

Logo após ser presa, Griner assumiu diante de um tribunal a culpa por levar o óleo de haxixe para o país, mas sempre sustentou que não o fez por querer. Na última semana, afirmou que não sabia como a substância foi parar em sua bagagem. "Se eu tivesse que dar um palpite, diria que foi porque fiz as malas correndo", afirmou. Ela tem prescrição médica para usar maconha de forma medicinal nos Estados Unidos para tratar de dores crônicas. A defesa argumentou, no processo, que isso é comum entre atletas de elite.

Após a prisão, Griner recebeu apoios públicos de seu time nos EUA, da WNBA, a liga feminina de basquete, e de uma série de atletas, que cobraram esforços do governo americano para tirá-la da prisão.

A mulher da jogadora, Cherelle Griner, chegou a dizer em meados de junho que não tinha nenhuma confiança no governo Biden para resolver a situação, mas mudou de posição após receber uma ligação do próprio presidente e de sua vice, Kamala Harris. Na ligação, o mandatário prometeu que trabalhava para "garantir a libertação o mais rápido possível" da jogadora.

Biden mobilizou seu Departamento de Estado e fez uma oferta ao Kremlin: a troca de Griner e do ex-soldado Paul Whelan, preso desde 2018 sob acusação de espionagem, por Viktor Bout, traficante de armas preso nos EUA que ficou mais famoso por inspirar o filme "O Senhor das Armas", de 2008, com Nicolas Cage.

O acordo ainda não foi selado. Segundo a rede de TV americana CNN, citando fontes no governo americano, a Rússia quer incluir no pacote de troca um ex-coronel condenado por assassinato na Alemanha, Vadim Krasikov.

Como muito do que envolve diplomacia nos Estados Unidos, o caso também provocou debate interno, que esquentou após a oferta de libertação do traficante de armas. O ex-presidente republicano Donald Trump, acusado por opositores de fazer o jogo político de Putin nos EUA, condenou os esforços feitos pelo governo americano para liberar a jogadora —com direito ao habitual exagero, ao dizer, por exemplo que Griner entrou no país "carregada de drogas".

"Ela entrou carregada de drogas em um território hostil, onde eles são muito vigilantes quanto a drogas, eles não gostam de drogas", afirmou. "Ela foi pega e agora devemos tirá-la do país? E ela ganha, você sabe, muito dinheiro, eu acho. Devemos trazê-la trocando-a por um assassino frio e um dos maiores traficantes de armas do mundo, [que] matou muitos americanos, [que] matou muita gente", disse o ex-presidente em entrevista a um podcast no último domingo (31).

"E ela vai receber uma passagem grátis, e nós vamos buscá-la", continuou. "Ele [Viktor Bout] é absolutamente um dos piores [criminosos] do mundo e ganhará a liberdade porque uma pessoa que parece ser mimada vai para a Rússia carregada de drogas."

Na audiência final do processo nesta quinta, Brittney pediu que o tribunal não a visse como um peão no tabuleiro do jogo político. "Sei que todo mundo continua falando sobre 'peão político' e sobre política, mas espero que isso esteja longe deste tribunal", disse. Faltou combinar com os russos.